Por três votos a um, Segunda Turma do Supremo decide que ex-ministro pode deixar a prisão enquanto aguarda o julgamento de um recurso contra sua condenação. Ele foi sentenciado a mais de 30 anos de prisão na Lava Jato.
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A Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu nesta terça-feira (26/06) conceder liberdade provisória ao ex-ministro José Dirceu, condenado a mais de 30 anos de prisão no âmbito da Operação Lava Jato. O político cumpre pena na Penitenciária da Papuda, em Brasília.
A decisão foi tomada por três votos a um. O relator do caso, Dias Toffoli, votou pela soltura de Dirceu e foi seguido pelos ministros Gilmar Mendes e Ricardo Lewandowski. O único a se opor foi Edson Fachin, relator dos processos da Lava Jato no STF. Celso de Mello não estava presente.
Em sessão marcada por troca de farpas, os ministros julgavam um pedido de habeas corpus protocolado pela defesa do ex-ministro. A maioria entendeu que o cálculo da pena ainda pode ser revisto e que, Dirceu pode aguardar em liberdade o julgamento do recurso contra a condenação.
O político começou a cumprir pena no mês passado, após ter sua condenação confirmada pela segunda instância da Justiça. A prisão se alinha com o entendimento do STF, que autorizou execuções provisórias de sentenças após o fim dos recursos naquela instância.
A defesa de Dirceu recorreu então ao Superior Tribunal de Justiça (STJ), contestando a condenação pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4), de segunda instância. No julgamento desta terça-feira, Toffoli defendeu a libertação de forma liminar (provisória), afirmando haver "plausibilidade jurídica" nesse recurso.
A decisão de libertar o ex-ministro não afeta a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, mas cria uma exceção, podendo ser empregada também em outros casos semelhantes.
Em maio de 2016, Dirceu foi condenado em primeira instância pelo juiz federal Sérgio Moro a 20 anos e dez meses de prisão, pelos crimes de corrupção passiva, lavagem de dinheiro e organização criminosa. Em setembro do ano passado, o TRF-4 aumentou a pena para 30 anos e nove meses.
Após recursos, o mesmo tribunal decidiu manter a condenação em abril deste ano, além de pedir a execução provisória da pena. Após ter a prisão decretada pela Justiça Federal em Curitiba, ele se entregou às autoridades em 18 de maio.
O ex-ministro foi acusado de participar de um esquema de contratos superfaturados da construtora Engevix com a Petrobras. O Ministério Público Federal (MPF) afirma que ele chegou a receber 12 milhões de reais em propinas.
Dirceu já havia sido preso em agosto de 2015, mas ganhou o direito de responder aos processos que enfrenta na Justiça em liberdade em maio de 2017. Além da primeira sentença, ele foi condenado por Moro em março de 2017 a 11 anos e três meses de prisão pelos crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro.
Essa segunda acusação afirma que o ex-ministro recebeu propinas que somam 2,1 milhões de reais para agir em favor da empresa Apolo Tubulars em um contrato com a Petrobras para o fornecimento de tubos entre 2008 e 2012.
Ex-deputado estadual e federal pelo estado de São Paulo, Dirceu, de 72 anos, foi presidente nacional do PT entre 1995 e 2002 e ministro-chefe da Casa Civil de 2003 a 2005, durante a gestão do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
EK/abr/dw/ots
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Entenda a Operação Lava Jato
A Polícia Federal apura, desde 2014, um esquema bilionário de lavagem e desvio de dinheiro envolvendo a Petrobras, grandes empreiteiras e políticos. Entenda a maior investigação sobre corrupção já conduzida no país.
Foto: AFP/Getty Images
O início
A Operação Lava Jato foi deflagrada pela Polícia Federal em 17 de março de 2014. Começou investigando um esquema de desvio de recursos públicos e lavagem de dinheiro e descobriu a existência de uma imensa rede de corrupção envolvendo a Petrobras, grandes empreiteiras do país e políticos. O nome vem de um posto de gasolina em Brasília, um dos alvos da PF no primeiro dia de operação.
Foto: picture-alliance/dpa/M. Brandt
O esquema
Executivos da Petrobras cobravam propina de empreiteiras para, em troca, facilitar as negociações dessas empresas com a estatal. Os contratos eram superfaturados, o que permitia o desvio de verbas dos cofres públicos a lobistas e doleiros, os chamados operadores do esquema. Eles, por sua vez, eram encarregados de lavar o dinheiro e repassá-lo a uma série de políticos e funcionários públicos.
Foto: Reuters/S. Moraes
As figuras-chave
O esquema na Petrobras se concentrava em três diretorias: de abastecimento, então comandada por Paulo Roberto Costa; de serviços, sob direção de Renato Duque; e internacional, cujo diretor era Nestor Cerveró. Cada área tinha seus operadores para distribuir o dinheiro. Um deles era o doleiro Alberto Youssef (foto), que se tornou uma das figuras centrais da trama. Todos os citados foram condenados.
Foto: imago/Fotoarena
As empreiteiras
As grandes construtoras do país formaram uma espécie de cartel: decidiam entre si quem participaria de determinadas licitações da Petrobras e combinavam os preços das obras. Os executivos da estatal, por sua vez, garantiam que apenas o cartel fosse convidado para as licitações. Entre as empresas investigadas estão Odebrecht, Andrade Gutierrez e Camargo Corrêa. Vários executivos foram condenados.
Foto: Reuters/P. Whitaker
Os políticos
O núcleo político era formado por parlamentares de diferentes partidos, responsáveis pela indicação dos diretores da Petrobras que sustentavam a rede de corrupção dentro da estatal. Os políticos envolvidos recebiam propina em porcentagens que variavam de 1% a 5% do valor dos contratos, segundo os investigadores. O dinheiro foi usado, por exemplo, para financiar campanhas eleitorais.
Foto: J. Sorges
De Cunha a Dirceu...
A investigação só entrou no mundo político em 2015, quando a Lava Jato foi autorizada a apurar mais de 50 nomes, entre deputados, senadores e governadores de vários partidos. Desde então, viraram alvo de investigação políticos como os ex-parlamentares Eduardo Cunha (foto) e Delcídio do Amaral, ambos cassados, os senadores Renan Calheiros, Fernando Collor e o ex-ministro José Dirceu.
Foto: Reuters/A. Machado
... e Lula
O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva é réu em dez processos relacionados à Lava Jato, sendo acusado pelos crimes de corrupção, lavagem de dinheiro e obstrução da Justiça. As denúncias indicam que Lula teria recebido benefícios das empreiteiras OAS e Odebrecht, envolvendo imóveis no Guarujá e São Bernardo do Campo. Em 2018, ele foi preso e teve uma nova candidatura à Presidência barrada.
Foto: picture-alliance/AP Photo/F. Dana
As prisões
A Lava Jato quebrou tabus no Brasil ao encarcerar altos executivos de empresas e importantes figuras políticas. Entre investigados e aqueles já condenados pela Justiça, estão o executivo Marcelo Odebrecht, ex-presidente da Odebrecht; Eduardo Cunha, ex-presidente da Câmara; Sérgio Cabral, ex-governador do Rio; os ex-ministros José Dirceu (foto) e Antonio Palocci, entre outros.
Foto: picture-alliance/dpa/EPA/H. Alves
As delações
Os acordos de delação premiada são considerados a força-motriz da operação. Depoimentos como o de Marcelo Odebrecht (foto) chegam com potencial para impactar fortemente a investigação. O acordo funciona assim: de um lado, os delatores se comprometem a fornecer provas e contar o que sabem sobre os crimes, além de devolver os bens adquiridos ilegalmente; de outro, a Justiça reduz suas penas.
Foto: Getty Images/AFP/H. Andrey
O juiz
Responsável pela Lava Jato na 1° instância, o ex-juiz federal Sergio Moro logo ganhou notoriedade. Em manifestações, foi ovacionado pelo povo e chegou a ser chamado de "herói nacional". Mas também foi acusado de agir com parcialidade política. Em 2018, deixou o cargo e aceitou ser ministro do presidente Jair Bolsonaro, cuja candidatura foi beneficiada pela prisão de Lula no ano anterior.
Foto: Getty Images/AFP/E. Sa
Expansão internacional
Se começou num posto de gasolina em Brasília, a Lava Jato ganhou proporções internacionais com o aprofundamento das investigações. Segundo dados do Ministério Público Federal levantados a pedido da DW Brasil, a investigação já conta com a cooperação de pelo menos outros 40 países (veja no gráfico acima). Além disso, 14 países, fora o Brasil, investigam práticas ilegais promovidas pela Odebrecht.
Um terremoto político
Ao longo de cinco anos, a Lava Jato influenciou o impeachment de Dilma Rousseff, enfraqueceu o governo Michel Temer e contribuiu para a derrocada de velhos caciques do PT, MDB e PSDB. Em 2018, Lula, então favorito para vencer as eleições presidenciais, foi preso e teve a candidatura barrada. As investigações também fortaleceram um discurso antissistema que beneficiou a campanha de Bolsonaro.
Foto: picture-alliance/dpa/ZUMAPRESS/C.Faga
Críticas e revelações
A Lava Jato também acumulou acusações de parcialidade e de abusos em seus métodos. Em 2019, os procuradores da força-tarefa foram duramente criticados por tentarem criar uma fundação para gerenciar uma multa bilionária da Petrobras. No mesmo ano, conversas reveladas pelo site "The Intercept" apontaram suspeita de conluio entre Moro e os procuradores na condução dos processos, o que é proibido.