Cada vez mais pessoas escolhem o país como destino de férias. Mas, para se divertir, é preciso lidar com vigilância constante - e com o dilema de estar dando dinheiro para uma das ditaduras mais ferrenhas do mundo.
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Viajar é uma paixão para o alemão Markos Kern, de 33 anos, que participou de uma viagem em grupo à Coreia do Norte pela primeira vez em junho de 2015. Ele sempre quisera visitar o Estado comunista, um dos mais isolados do mundo, e ver com seus próprios olhos o país sobre o qual tinha escutado e lido tantas coisas negativas.
Kern conta que não ignorava a situação dos direitos humanos na Coreia do Norte antes de embarcar na aventura, e que não teria como ignorar esse aspecto. "Mas também fazemos negócios com países onde acontecem coisas terríveis. Não conheço ninguém que diga: 'Não vou à China, porque lá se violam os direitos humanos.'"
Por outro lado, mesmo só indo visitar o país com fins turísticos, ele prometera a si mesmo que suspenderia a viagem, caso se deparasse com violações graves dos direitos humanos.
Sem contato com a população
Organizar a empreitada foi fácil para o proprietário de uma consultoria de empresas em Munique, que recebeu o visto poucos dias depois de apresentar o requerimento.
Ele conta que na república comunista os turistas são sempre acompanhados por um guia, não sendo permitido circularem livremente. O que não impede Kern de resumir assim suas impressões:
"Minha experiência com a Coreia do Norte foi muito agradável. Ela teve um encanto extremo sobre mim, porque é diferente de qualquer coisa que a gente conheça", explica.
Mesmo só tendo conhecido uma pequena parte do país e apesar de a interação com os habitantes ter sido mínima, a paisagem e a população local o fascinaram.
"Como turista normal, a pessoa conhece o seu guia, e talvez fale um pouquinho, aqui e ali, com o garçom ou com a senhora da recepção. Mas há muito poucas situações de contato próximo."
Surfe e esqui numa ditadura
Markos Kern afirma que nunca teve motivos para se sentir inseguro: "É preciso simplesmente conhecer as regras, que incluem nunca deixar o hotel sozinho nem fotografar militares, e obedecê-las." Desde a excursão no verão de 2015, ele já retornou à República Democrática duas vezes, porém não como turista comum, mas na qualidade de parceiro da Uri Tours.
A certeza de que o país asiático pode ser um local divertido é tão profunda, que sua Kern Innovations está trabalhando junto à agência de turismo americana para expandir dois novos ramos na Coreia do Norte: surfe na costa leste e esqui na estação de luxo do Monte Masik, na região norte.
A empresa tem programadas para 2016 diversas viagens às praias e montanhas locais, nas quais, espera Kern, haverá finalmente a possibilidade de interagir com os norte-coreanos. "Surfando, a gente fica sempre várias horas junto na água e, mesmo que haja uma barreira da língua, se cria, ainda assim, um tipo de contato humano", aposta.
E os direitos humanos?
A cada ano, milhares de turistas já escolhem Coreia do Norte como destino. Mas será ético oferecer viagens turísticas no reino isolado do ditador Kim Jong-un, notório por suas sistemáticas violações dos direitos humanos?
"Nós acreditamos firmemente que o turismo é capaz de trazer mais compreensão mútua e paz entre a Coreia do Norte e a comunidade internacional", é a resposta de Andrea Lee, cofundadora e diretora da Uri Tours.
A maioria de seus clientes é proveniente dos Estados Unidos, cujo governo permanece crítico quanto a viagens à nação comunista.
"O Departamento de Estado dos EUA desaconselha todos os cidadãos americanos a viajarem à Coreia do Norte", frisa o site. "Visitantes estrangeiros podem ser presos ou deportados da Coreia do Norte por coisas que não contariam como atos criminosos em outros países."
Na contramão das autoridades em Washington, Rubio Chan, fundador da empresa turística Eastern Vision, baseada em Hong Kong, insiste na necessidade de intensificar o contato direto com os cidadãos norte-coreanos, a fim de reduzir os temores e preconceitos recíprocos.
"Isolar a Coreia do Norte não vai resolver a questão", afirma o operador de turismo.
Guerra da Coreia, 70 anos depois
Combates na península coreana duraram mais de três anos. De um lado, o sul, apoiado pela ONU. Do outro, o norte, reforçado por China e URSS. Guerra acabou em 1953, com milhões de mortos e a divisão das Coreias cimentada.
Foto: AP
Fronteira da Guerra Fria
Em 27 de julho de 1950, as tropas da comunista Coreia do Norte atravessam o Paralelo 38, iniciando uma verdadeira campanha de ocupação. Em poucos dias, praticamente todo o país estava sob seu controle. É o início de uma guerra que durará 37 meses, custando 4,5 milhões de vidas humanas, segundo certas estimativas.
Foto: AFP/Getty Images
Antecedentes
Depois de ser ocupada pelo Japão de 1910 a 1945, a Coreia estava dividida desde o fim da Segunda Guerra Mundial. O território acima do 38º paralelo norte ficou sob controle soviético, o do sul, na mão dos EUA. Em agosto de 1948, Seul proclama a República da Coreia. Em reação, o general Kim Il-sung cria no norte a República Popular Democrática da Coreia, em 9 de setembro do mesmo ano.
Foto: picture-alliance / akg-images
Reforço da ONU
Seguindo o avanço dos norte-coreanos sobre o Paralelo 38, a partir de julho de 1950 as Nações Unidas decidem dar apoio militar à Coreia do Sul, por pressão dos EUA. São enviados para a península 40 mil soldados de mais de 20 países, entre os quais 36 mil norte-americanos. A sorte parece ter virado: logo os Aliados conseguem ocupar quase todo o país.
Foto: AFP/Getty Images
Codinome Operação Chromite
Em 15 de setembro de 1950, tropas ocidentais sob o comando do general Douglas MacArthur desembarcam perto da cidade portuária de Incheon, no sudoeste, capturando uma base central de suporte do Norte. Pouco depois, Seul está novamente na mão dos Aliados, que em outubro também ocupam Pyongyang. O fim da guerra parece próximo. Mas aí a China envia tropas de apoio aos norte-coreanos.
Foto: picture alliance/AP Photo
Ajuda de Mao
Em meados de outubro iniciava-se a intervenção chinesa. De início, a ajuda parte apenas de unidades de pequeno porte. No final do mês ocorre a primeira mobilização em grande escala na Coreia do Norte do "exército de voluntários" de Mao. Em 5 de dezembro, Pyongyang – única capital comunista ocupada por tropas ocidentais durante a Guerra Fria – está novamente nas mãos de norte-coreanos e chineses.
Foto: Claude de Chabalier/AFP/Getty Images
Pró e contra a bomba atômica
Em janeiro de 1951 começa uma grande ofensiva da Coreia do Norte, com apoio chinês. Cerca de 400 mil chineses e 100 mil norte-coreanos forçam as tropas aliadas a recuar fortemente. Em abril, o general MacArthur é destituído de seu posto, depois que o presidente Harry Truman lhe ordenara usar bombas atômicas contra a China. Seu sucessor é o general Matthew B. Ridgway.
Foto: picture-alliance/dpa
Guerra de exaustão
Em meados de 1951, mais ou menos na altura da linha de demarcação que separava o Norte e o Sul antes da guerra, as forças oponentes chegam a um impasse. A partir daí, começa uma encarniçada guerra de exaustão, que durará até o fim das operações de combate, dois anos mais tarde – embora as negociações de paz já tivessem sido iniciadas em julho de 1951.
Foto: Keystone/Getty Images
Batalha de ideologias
O conflito entre as Coreias é considerado a primeira "guerra por procuração" entre o Ocidente capitalista e o Oriente comunista. A maior parte dos soldados lutando nas tropas da ONU vinha dos Estados Unidos. No lado oposto, os norte-coreanos contaram com o reforço de centenas de milhares de chineses e russos.
Foto: AFP/Getty Images
Coreia do Norte em ruínas
Desde o início, foi uma guerra de ataques aéreos e bombardeios. Durante os três anos de combates, as forças aéreas das Nações Unidas realizaram mais de 1 milhão de operações. Ao todo, os americanos lançaram cerca de 450 mil toneladas de bombas, inclusive de napalm, sobre a Coreia do Norte. A destruição foi extensa: ao fim da guerra, quase todas grandes cidades estavam arrasadas.
Foto: AFP/Getty Images
Estimativas conflitantes
Quando, em 1953, as tropas aliadas se retiram da península coreana, o saldo é de milhões de mortos. Os dados sobre o número de soldados caídos são conflitantes. Calcula-se que morreram cerca de meio milhão de militares coreanos, assim como 400 mil chineses. Os Aliados registram 40 mil vítimas, 90% delas americanos.
Foto: Keystone/Getty Images
Troca de prisioneiros
Ainda durante os combates, de meados de maio a início de abril de 1953, ocorreu a primeira troca de presos entre os dois lados. Até o fim do ano, mais detentos seriam repatriados. A ONU devolveu mais de 75 mil norte-coreanos e quase 6.700 chineses. O outro lado soltou 13.500 pessoas, entre as quais 8.300 sul-coreanos e 3.700 soldados dos EUA.
Foto: Keystone/Getty Images
Cessar-fogo
Após mais de dois anos, as negociações de cessar-fogo iniciadas em 10 de julho de 1951 culminam no Armistício de Panmunjom. A divisão da península está sedimentada: o 38º paralelo norte é definido com fronteira entre as Coreias do Norte e do Sul. Mas como um tratado de paz nunca foi assinado, do ponto de vista do direito internacional os dois países se encontram até hoje em estado de guerra.
Foto: AFP/Getty Images
Terra de ninguém
O idílio na cidade fronteiriça de Panmunjom é enganoso. Até hoje, a fronteira ao longo do Paralelo 38 é a mais rigorosamente vigiada do mundo. Ao longo da linha estipulada no acordo de armistício de 1953, o Norte e o Sul são separados por uma zona desmilitarizada de cerca de 250 quilômetros de extensão e 4 quilômetros de largura. Aqui, soldados de ambos os lados se defrontam diariamente.