Aliados criticam anúncio de saída dos EUA da Síria
20 de dezembro de 2018
Senadores americanos classificam retirada de tropas "de erro prematuro" e que encoraja "ditadura de Assad". Milícias curdas temem ser exterminadas por Ancara, e Paris e Londres apontam que EI ainda não está erradicado.
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A decisão do presidente dos EUA, Donald Trump, de retirar as tropas americanas da Síria, sob a argumentação de que a organização terrorista "Estado Islâmico" (EI) teria sido derrotada no país, foi recebida com críticas por senadores americanos, autoridades militares e aliados estrangeiros.
Senadores dos Estados Unidos, incluindo importantes nomes da ala republicana, divulgaram uma carta na qual conclamam Trump a reconsiderar sua decisão de retirar as forças americanas da Síria e afirmaram que a retirada do país devastado pela guerra neste momento seria "um erro prematuro e caro".
"Se decidir seguir com sua decisão de retirar nossas tropas da Síria, qualquer remanescente do EI na Síria certamente renovará e estimulará seus esforços na região", diz um trecho da carta. Os senadores acrescentaram que a medida também pode encorajar a "ditadura brutal de Bashar al-Assad", o presidente sírio, a fortalecer os "adversários dos EUA", Irã e Rússia.
"Seu governo não deve repetir os mesmos erros que os governos anteriores cometeram e ceder a esses maus agentes", diz a carta. Entre os signatários estão os republicanos Marco Rubio, senador da Flórida, e Lindsey Graham, senador da Carolina do Sul e chefe da Comissão do Senado dos EUA sobre o Judiciário, além de outros republicanos, democratas e independentes.
O senador Graham, considerado um aliado de Trump, classificou a retirada das tropas da Sìria de um "grande erro à la Obama". "Uma retirada americana neste momento representa uma grande vitória para o EI, para o Irã, para Bashar al-Assad e para a Rússia", disse.
Anteriormente, Graham já havia afirmado que a saída das forças americanas coloca também em risco os aliados dos EUA, especialmente os curdos. Os EUA são aliados das Unidades de Proteção Popular (YPG), uma milícia curda síria que controla grandes áreas do norte do país, na fronteira com a Turquia.
Por outro lado, o senador republicano do estado de Kentucky, Rand Paul, elogiou a decisão de Trump. "Pela primeira vez em minha vida vejo um presidente com a coragem de declarar vitória e trazer as tropas para casa. Não tivemos um presidente em 20 ou 30 anos que conseguiu descobrir como declarar vitória", disse.
Washington confiou nas forças curdas como a forma mais eficaz na batalha contra o "Estado Islâmico" na Síria, mas isso tem irritado Ancara, que afirma que as YPG estão ligadas ao Partido dos Trabalhadores do Curdistão (PKK), acusado de suscitar uma insurgência na Turquia.
A relação entre Ancara e Washington tem sido tensa devido ao conflito na Síria. Mas a notícia da retirada americana da Síria foi bem recebida na Turquia, que disse que militantes curdos a leste do rio Eufrates "serão enterrados em suas valas quando chegar a hora".
"Diz-se atualmente que algumas valas e túneis foram cavados em Manbij e ao leste do Eufrates. Eles podem cavar, se quiserem, podem ir para o subsolo se quiserem, mas quando a hora chegar, eles serão enterrados nas valas que cavaram. Ninguém deveria duvidar disso", disse o ministro da Defesa, Hulusi Akar, segundo a agência estatal turca de notícias Anadolu.
Na semana passada, por exemplo, o presidente turco, Recep Tayyp Erdogan, anunciara que a Turquia lançará uma nova ofensiva militar contra militantes curdos. Após o anúncio de Trump, os curdos sírios alertaram que uma provável incursão turca na Síria poderia resultar na fuga de milhares de militantes do "Estado Islâmico".
"Temos um certo montante de combatentes estrangeiros detidos. Qualquer caos na área ou qualquer ataque turco pode dar a esses criminosos a chance de escapar", disse Abdel Kareem Umer, chefe das relações externas das Forças Democráticas da Síria (SDF), um grupo rebelde dominado pelas forças curdas e aliado dos EUA.
O Observatório Sírio dos Direitos Humanos afirmou que as Forças Democráticas da Síria estavam considerando libertar cerca de 3.200 combatentes estrangeiros do "Estado Islâmico" e suas famílias da detenção depois que seus países de origem se recusaram a recebê-los. Embora negue o relato do Observatório, Umer pediu aos países dos detidos que aceitassem suas repatriações.
Paris e Londres: "Muito trabalho a ser feito"
A França divulgou que manterá sua participação na coalizão que luta contra os jihadistas na Síria. "Por enquanto, é claro, continuamos na Síria", disse a ministra de Assuntos Europeus da França, Nathalie Loiseau, que acrescentou que "a luta contra o terrorismo não acabou".
A França tem caças militares estacionados na Jordânia, um número não revelado de forças especiais em território sírio e artilharia ao longo da fronteira síria com o Iraque – medidas que fazem parte da coalizão militar liderada pelos EUA.
A ministra de Defesa da França, Florence Parly, disse em sua conta no Twitter que o grupo extremista "não foi erradicado do mapa, nem as suas raízes" e que "devemos derrotar definitivamente os últimos focos dessa organização terrorista".
O Ministério do Exterior do Reino Unido afirmou que o EI está longe de ser vencido. "A coalizão internacional contra o EI fez enormes progressos, mas falta muito por fazer e não devemos perder de vista a ameaça que ele representa. Mesmo sem território, continua sendo uma ameaça", afirmou a diplomacia britânica, em comunicado.
A Rússia, que tem apoiado Assad durante os quase oito anos de guerra civil, reclamou na quarta-feira (19/12) sobre a presença americana na Síria. "A presença ilegal americana na Síria está mudando de um fator na luta contra o terrorismo internacional para um obstáculo perigoso para uma resolução", disse a porta-voz do Ministério do Exterior da Rússia, Maria Zakharova.
Em setembro de 2014, o então presidente americano Barack Obama lançou uma campanha de ataques aéreos contra o EI na Síria, um mês depois de ter iniciado ataques aéreos no Iraque. No fim de 2015, as primeiras tropas americanas entraram na Síria – o número aumentou de 50 para os atuais dois mil soldados.
A coalizão liderada pelos EUA executou ataques aéreos em 17 mil localizações – somente na semana passada foram realizados 208 bombardeios. Milhares de extremistas foram mortos ou capturados, mas autoridades militares americanas afirmam que ao menos dois mil insurgentes estão ativos e espalhados pela Síria.
PV/lusa/afp/ap/rtr/dpa
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O que se iniciou com protestos pacíficos em 2011 virou uma guerra civil brutal que já matou centenas de milhares de pessoas e fez milhões de refugiados. Reveja os principais acontecimentos.
Foto: Reuters/Stringer
2011: O início
Em 15 de março de 2011, protestos pacíficos contra a detenção de jovens acusados de fazer pichações antigoverno em sua escola, na cidade de Daraa, são reprimidos por forças de segurança, que abrem fogo contra manifestantes desarmados, matando quatro. Os protestos continuam por vários dias, fazendo 60 mortos e se espalham por todo o país. Segue-se um período de repressão violenta.
Foto: Anwar Amro/AFP/Getty Images
2011/2012: Isolamento internacional
O ex-presidente Barack Obama insta o presidente Bashar al-Assad a renunciar, e os EUA anunciam sanções a Assad em maio e congelam bens do governo sírio nos EUA em agosto de 2011. A União Europeia também anuncia sanções, em setembro. Em novembro, a Liga Árabe suspende a Síria e impõe sanções ao regime. Também a Turquia anuncia uma série de medidas, incluindo sanções, em dezembro.
Foto: AP
2012: Observadores internacionais desistem
Em dezembro de 2011, a Síria permite a entrada de observadores da Liga Árabe para monitorar a retirada de tropas e armas de áreas civis. A missão é suspensa em janeiro de 2012. Em fevereiro, os EUA fecham sua embaixada em Damasco. Em abril de 2012, chegam observadores da ONU, que partem dois meses depois por falta de segurança.
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2013: Ataque com gás
Em março, um ataque com gás mata 26 pessoas, ao menos a metade deles soldados do governo, na cidade de Khan al-Assal. Investigação da ONU conclui que foi usado gás sarin. Em agosto, outro ataque com gás mata centenas em Ghouta Oriental, um subúrbio de Damasco controlado pelos rebeldes. A ONU afirma que mísseis com gás sarin foram lançados em áreas civis. Os EUA e outros países culpam regime sírio.
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2013: Destruição de armas químicas
Em agosto, investigadores da ONU chegam à Síria para averiguar o uso de armas químicas, em meio a denúncias de médicos e ativistas. EUA afirmam que 1.429 pessoas morreram num ataque, e Obama pede ao Congresso autorização para ação militar. Em setembro, o Conselho de Segurança da ONU ameaça usar a força e, em outubro, Damasco inicia a destruição de seu arsenal declarado de armas químicas.
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2014: EUA atacam "Estado Islâmico"
Em setembro, os EUA iniciam ataques aéreos a alvos do "Estado Islâmico" na Síria. Em outubro, o mediador da ONU, Staffan de Mistura, começa a negociar uma trégua ao redor de Aleppo, mas o plano fracassa meses depois.
Foto: picture-alliance/AP Photo/V. Ghirda
2015: Rússia entra no conflito
Em setembro, a Rússia, que desde o início fornecera ajuda militar ao governo sírio nos bastidores, entra ativamente no conflito, bombardeando opositores do regime. A ajuda se mostra decisiva, e a guerra civil passa a pender para o lado de Assad, que nos meses seguintes recupera território perdido para os rebeldes.
Foto: Reuters/Rurtr
2016: Governo controla Aleppo
A ONU e a Opac afirmam que tanto militares sírios quanto o "Estado Islâmico" usaram gás em ataques a opositores. O ano é marcado por várias tentativas de tréguas. Em setembro, a cidade de Aleppo é alvo de 200 ataques aéreos por forças pró-Assad num fim de semana. Em dezembro, as forças governamentais assumem controle de Aleppo, encerrando quatro anos de domínio dos rebeldes.
Foto: Getty Images/AFP/G. Ourfalian
2017: Ataque em Idlib
Em fevereiro, Rússia e China vetam resolução do Conselho de Segurança da ONU pedindo sanções ao governo sírio pelo uso de armas químicas. Em abril, ao menos 58 pessoas morrem na província de Idlib, dominada pelos rebeldes, no que aparenta ser um ataque com gás. Testemunhas afirmam que o ataque foi executado por jatos sírios e russos, mas tanto Moscou quanto Damasco negam bombardeio.
Foto: Getty Images/AFP/O. H. Kadour
2017: Resposta dos EUA
Em abril, os EUA lançam dezenas de mísseis sobre a base militar de onde se acredita ter saído o ataque em Idlib. Em maio, o presidente Donald Trump aprova planos para armar combatentes das milícias curdas YPG na luta contra o "Estado Islâmico". A medida enfurece a Turquia, que vê as YPG como um grupo terrorista. Em outubro, o "Estado Islâmico" perde o controle de Raqqa, sua autoproclamada capital.
Em janeiro, aviões turcos bombardeiam a região curda de Afrin, dando início à operação contra as YPG intitulada "Ramo de Oliveira". A Turquia anuncia a morte de centenas de "terroristas", mas entre os mortos estão dezenas de civis, dizem ativistas. Em fevereiro, as milícias YPG chegam a acordo com o regime sírio para o envio de tropas pró-governo para auxiliar no combate aos turcos em Afrin.
Foto: picture alliance/AA/E. Sansar
2018: Ofensiva em Ghouta Oriental
Em 21 de fevereiro, tropas pró-regime executam ofensiva em larga escala contra enclave rebelde localizado ao leste de Damasco. Em torno de 400 mil civis ficam sitiados, com acesso limitado a alimentos e cuidados médicos. Os ataques matam centenas de pessoas. No dia 24 de fevereiro, o Conselho de Segurança da ONU aprova trégua humanitária de 30 dias vigente em todo o território sírio. Ela fracassa.
Foto: Reuters/B. Khabieh
2018: O bombardeio ocidental
Após dias de ameaça, em 14 de abril Trump anuncia o lançamento de mais de cem mísseis, em conjunto com França e Reino Unido, na Síria. O ataque é uma retaliação ao ataque químico na cidade de Duma, que matou dezenas de civis e que o Ocidente atribui ao regime de Bashar al-Assad.
Foto: picture-alliance/AP Photo/L. Matthews
2019: Estados Unidos começam a se retirar da Síria
Em janeiro de 2019, os Estados Unidos começaram a se retirar da Síria. O presidente americano afirmou que o Estado Islâmico havia sido derrotado e, por isso, a presença dos EUA não seria mais necessária. A decisão foi contestada dentro do próprio governo e também pelas milícias curdas na Síria, aliadas dos EUA, que temiam enfraquecer-se.
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2019: fim do autoproclamado califado do EI
Em março de 2019, as Forças Democráticas Sírias (FDS), aliança liderada por curdos, anunciaram que o autoproclamado califado do Estado Islâmico foi totalmente eliminado, após combates em Baghouz, considerado o último reduto jihadista na Síria. Militantes curdos e árabes das FDS, apoiados pela coalizão internacional liderada pelos EUA, combatiam há várias semanas os jihadistas.