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Suspeita de corrupção envolve estrela do partido de Merkel

Rina Goldenberg av
18 de junho de 2020

Deputado de 27 anos misturou política e interesse pessoal. Philipp Amthor atuou junto a governo para favorecimento de firma da qual era membro da diretoria e tinha ações. Escândalo pode custar sua carreira na política.

Philipp Amthor
Philipp Amthor admitiu que a atividade de lobista o deixou "politicamente atacável"Foto: picture-alliance/dpa/B. Wüstneck

Philipp Amthor é uma espécie de estrela da conservadora União Democrata Cristã (CDU), da chanceler federal alemã, Angela Merkel. Aos 27 anos, o bem-vestido deputado do Bundestag (câmara baixa do parlamento) só tem a metade da idade média de seus correligionários.

Convidado frequente de talk shows de TV, ele galgou rapidamente os quadros partidários. Tendo se filiado à CDU em 2007, foi recentemente indicado como potencial candidato democrata-cristão ao governo do estado de Mecklemburgo-Pomerânia Ocidental. Caso vença as eleições em 2021, se tornaria o mais jovem governador da história da Alemanha.

Agora tudo isso está em risco, desde que a revista alemã Der Spiegel noticiou sobre a atuação de Amthor junto à empresa americana Augustus Intelligence (AI), fundada em 2018 e especializada em "soluções seguras de inteligência artificial". Membro da diretoria, em 2019 ele viajou para Nova York, Costa Rica e Saint Moritz, Suíça. A administração do Bundestag investiga no momento quem pagou as viagens.

O jovem político também recebeu 2.817 opções de ações da AI, que não declarou como renda complementar. Tecnicamente, ele estava alinhado com os regulamentos do país, que apenas obrigam os deputados a revelarem ganhos adicionais superiores a 10 mil euros por ano. As ações só teriam que ser declaradas caso fossem vendidas com lucro.

Portanto a posição de Amthor na AI estava dentro dos limites da lei alemã, a qual exige somente que os parlamentares garantam que os empregos paralelos não ocupem a maior parte de seu tempo. Contudo, eles não devem usar seu mandato para ganho financeiro privado.

Segundo a reportagem da Spiegel, porém, o democrata-cristão escreveu cartas ao Ministério da Economia solicitando "apoio financeiro" para a start-up AI. E aí é que as coisas se complicam, explica Norman Loeckel, porta-voz da ONG Transparência Internacional.

"Se ele tivesse agido inteiramente em seu papel de membro da diretoria dessa companhia, seria menos problemático. Mas neste caso específico, ele estava agindo como membro do parlamento, enviando cartas pelo correio parlamentar oficial, e teve encontros com o ministério em seu papel de parlamentar, em nome daquela companhia."

"Há uma definição clara na lei alemã, no Código Penal, que, se um funcionário público ou membro do parlamento tira vantagem financeira ou outra para fazer algo em seu papel oficial, então se trata de corrupção", conclui Loeckel.

Ligações obscuras

"Não estou à venda", afirma Amthor em seu perfil do Facebook. Admitindo que a atividade de lobista o deixou "politicamente atacável", ele diz ter renunciado ao cargo na diretoria e devolvido suas ações. Porém o caso tem ainda uma outra dimensão, já que não está claro o que a Augustus Intelligence realmente faz.

Alguns nomes da lista de patrocinadores da start-up despertaram suspeitas entre o público alemão. Um dos mais notáveis é o de Hans-Georg Maassen: o ex-presidente do Departamento Federal de Proteção à Constituição (BfV), o órgão de segurança interna da Alemanha, entregou o cargo em decorrência de uma discussão sobre suas tendências de extrema direita.

Nesta terça-feira (16/06), Amthor renunciou a seu posto na comissão do Bundestag encarregada de investigar o ataque terrorista a uma feira de Natal na praça Breitscheidplatz de Berlim, em dezembro de 2016. O grupo deveria tomar o depoimento de Maassen.

Na véspera, o copresidente do Partido Verde Robert Habeck exigira que Amthor se demitisse de sua posição como deputado por Greifswald, na zona litorânea da Pomerânia Ocidental. Outros políticos alemães também criticaram sua conduta do jovem conservador.

"O caso causou grande dano à percepção pública da política em geral, confirmando toda uma série de noções falsas de que os parlamentares usem seu mandato para interesses econômicos pessoais. Ele mina a confiança pública", comentou Marco Buschmann, do Partido Liberal Democrático (FDP), simpático ao empresariado.

A ex-ministra da Justiça alemã Katarina Barley, do também governista Partido Social-Democrata (SPD), defendeu a criação de regras de transparência no Bundestag para evitar esse tipo de situação.

O comportamento de Amthor recebeu também críticas dentro de seu próprio partido. O candidato à presidência da CDU Friedrich Merz, antigo aliado de Amthor, disse que o jovem deputado "fez besteira" e "deixou se levar por seus instintos". Merz afirmou ainda que não se pode misturar negócios com política.

Alemanha falha no combate à corrupção

O escândalo de Philipp Amthor baixou os ânimos na CDU, numa época em que seus líderes vinham apresentando bom desempenho nas pesquisas de opinião. Na sexta-feira, o Bundestag tem sessão marcada para debater o lobismo. A longamente planejada discussão – visando estudar formas de desvendar as atividades dos lobistas e as tentativas de influenciar parlamentares e ministros – agora promete ser especialmente acalorada.

As exigências de um cadastro mandatório para lobistas vêm esbarrando em oposição, sobretudo do bloco conservador cristão CDU/CSU, integrante da coalizão governamental.

"Se o nosso parceiro de coalizão está falando sério, então esta semana também é o momento para um movimento político, estrutural e não esporádico", comentou Katja Mast, vice-presidente do SPD.

Segundo Loeckel, é difícil na Alemanha saber-se quando companhias ganham "tratamento preferencial", e se o seu acesso é justificado. "Por exemplo, a indústria automobilística é um setor muito importante na Alemanha, e seria compreensível que eles ganhem acesso preferencial – em vez de uma companhia de inteligência artificial dos Estados Unidos", observou o porta-voz da Transparência Internacional.

Os debates sobre o lobby tem sido frequentes no país quando, por exemplo, políticos de alto escalão assumem empregos no setor automotivo logo após abandonar o cargo público. Há exigências de que, em tais casos, os políticos se sujeitem a um período de restrição, semelhante ao sistema adotado nos EUA.

Em seu mais recente relatório sobre a prevenção de corrupção entre parlamentares, juízes e promotores, o Conselho da Europa apontou que a Alemanha falhara em implementar recomendações datando de 2015.

Essa avaliação "globalmente insatisfatória" redundou num "procedimento de não conformidade", dando prazo até 30 de junho de 2020 para a delegação alemã apresentar um relatório sobre o progresso na aplicação das recomendações que faltam. É bem possível que o caso Amthor sirva de impulso adicional a esse processo.

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