Em mais uma restrição da liberdade de circulação das afegãs, motoristas dizem estar sendo punidos por transportar passageiras sem cobertura de corpo inteiro. Elas relatam remoção à força dos carros pela polícia da moral.
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Fereydun, um motorista de riquixá motorizado de Herat, no oeste do Afeganistão, não transporta mais mulheres em seu veículo. Se o fizesse e a passageira não estivesse usando uma cobertura de corpo inteiro, ele seria espancado pelo Talibã e teria seu riquixá confiscado, disse o afegão à DW.
Ele já testemunhou mulheres sendo humilhadas. Diversas vezes, o Talibã parou seu veículo e retirou à força passageiras que não usavam burcas, para em seguida xingá-las e gritar com elas. Fereydun disse que também chegou a ser punido.
Quase dois anos desde que os militantes islâmicos talibãs retomaram o poder no Afeganistão na esteira da retirada calamitosa da Otan, muitas mulheres afegãs ainda resistem às ordens que amordaçam seus direitos.
Várias se recusam a usar burcas e ainda andam pelas ruas com o rosto descoberto. No ano passado, o líder talibã, Hibatullah Akhundzada, ordenou que as mulheres escondessem seu rosto por completo em público, como sinal de tradição e respeito, de acordo com o decreto emitido em maio de 2022.
Quando o Talibã chegou novamente ao poder em agosto de 2021, seus líderes se comprometeram a respeitar os direitos das mulheres. Desde então, contudo, elas foram expulsas da maioria das profissões e impedidas de frequentar universidades ou instituições de ensino superior. Mais recentemente, salões de beleza femininos – fonte de sustento de dezenas de milhares de afegãs – foram proibidos em todo o país.
Polícia da moralidade nas grandes cidades
Sobre as mulheres que ainda se atrevem a mostrar o rosto, a pressão é crescente. Testemunhas oculares no Afeganistão relatam que o Ministério para a Promoção da Virtude e a Prevenção do Vício destacou agentes da polícia da moralidade em todas as grandes cidades.
Entre outras coisas, a pasta decretou que motoristas de táxi, riquixás e outros veículos de passageiros não podem mais transportar mulheres sem hijab dentro das cidades.
"Quando as mulheres viajam, elas devem estar acompanhadas por um homem", afirmou Akif Mohajer, representante do ministério, à imprensa. "Quando elas viajam dentro da cidade, nenhum homem pode sentar ao lado delas, e elas devem usar um hijab completo. Não importa se elas usam um chador [que cobre o corpo, mas não o rosto] ou não, o hijab deve ser islâmico completo."
O que exatemente constitui um "hijab islâmico completo" não parece estar claramente definido. A palavra "hijab" se refere à ação de cobrir-se, embora hoje em dia seja usada principalmente para designar o véu muçulmano ocidental, que cobre a cabeça e o colo das mulheres, mas deixa o rosto descoberto.
Já a burca, o mais conservador entre os véus muçulmanos, é uma túnica larga de uma só peça que cobre completamente o rosto e o corpo das mulheres. Na altura dos olhos, há uma espécie de rede através da qual ela pode enxergar. O chador é uma variante da burca que cobre as mulheres dos pés à cabeça, com exceção do rosto e das mãos.
O véu islâmico
Conheça os diferentes tipos de véus utilizados no mundo muçulmano.
Foto: picture-alliance/AP Photo
O hijab
Apesar de a palavra "hijab" se referir à ação de cobrir-se, hoje em dia ela é usada principalmente para designar o véu muçulmano ocidental, que cobre a cabeça e o colo das mulheres, mas deixa o rosto descoberto. A cor e o estilo do hijab variam segundo as tradições e costumes do país ou da comunidade religiosa.
Foto: (c) picture-alliance/dpa/H&M
A burca
A burca é o mais conservador entre os véus muçulmanos. Trata-se de uma túnica larga de uma só peça que cobre completamente o rosto e o corpo das mulheres. Na altura dos olhos, há uma espécie de rede através da qual ela pode enxergar. A burca é usada sobretudo no Afeganistão, onde geralmente é azul, e no Paquistão.
Foto: picture-alliance/dpa
O niqab
O niqab também cobre completamente o rosto da mulher, mas, diferentemente da burca, deixa os olhos descobertos. Esse tipo de véu muçulmano é muito popular entre os países árabes do Golfo Pérsico. O preto é sua cor mais comum. Ele é usado com um vestido longo, chamado abaya.
Foto: picture-alliance/dpa/P. Endig
O chador e o khimar
O chador é uma variante da burca que se usa principalmente no Irã. Ele cobre as mulheres dos pés à cabeça, com exceção do rosto e das mãos. Geralmente é preto e disfarça as curvas femininas. O khimar é parecido com o chador: cobre o cabelo, o colo e os ombros, mas vai só até a cintura. Este véu em forma de capa também deixa o rosto descoberto.
Foto: picture-alliance/dpa/A. Taherkenareh
A shayla
A shayla é um véu retangular que cobre a cabeça e se fixa nos ombros , deixando descoberto o rosto da mulher. É muito usado nos países do golfo Pérsico. Em geral se usam tecidos leves de cores alegres. Na foto se vê a blogueira e jornalista turco-alemã Kübra Gümüsay.
Foto: picture-alliance/dpa/K. Schindler
A al-amira
A al-amira é composta de duas peças: um véu mais apertado que cobre os cabelos, parecido com um gorro, e outro que se coloca sobre o primeiro, de forma mais folgada. Pode ser complementado com broches ou diademas. Devido à sua praticidade, muitas atletas muçulmanas preferem esse modelo.
Foto: picture-alliance/AP Photo/P. D. Josek
O burquíni
Em 2003, a australiana Aheda Zanetti desenhou o primeiro traje de banho para mulheres muçulmanas: o burquíni. Este modelo cobre todo o corpo, com exceção do rosto, mãos e pés. O burquíni causou polêmica no verão europeu e foi proibido em diversas cidades da França.
Foto: picture-alliance/abaca
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Dina, uma mulher também de Herat, contou que já foi retirada de riquixás e insultada várias vezes por usar um casaco comprido e lenço na cabeça, em vez de uma cobertura de corpo inteiro.
Mirza, um motorista de táxi de Cabul, também confirmou isso em entrevista à DW. Ele disse ter sido alertado várias vezes pelo Talibã de que mulheres sem véu ou burca não podem andar de táxi, caso contrário ele será punido, e seu veículo, confiscado.
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Banindo as mulheres do espaço público
Para Maryam Marof Arwin, fundadora de uma organização de bem-estar para mulheres e crianças no Afeganistão, o principal objetivo dessas medidas é banir as mulheres do espaço público.
"Com as recentes restrições, o Talibã mostrou que está aderindo às políticas que implementou em seu primeiro período no poder, exceto que agora está eliminando sistemática e especificamente as mulheres da sociedade", afirma.
Durante o primeiro regime talibã, entre 1996 e 2001, as mulheres eram alvo de um tratamento degradante. Naquela época, as afegãs eram forçadas a usar a burca em público, não tinham permissão para sair de casa sem um acompanhante do sexo masculino e eram proibidas também de consultar médicos homens, resultando em muitas doenças não tratadas.
Especialistas alertam que o Talibã agora está tentando voltar no tempo sem pensar nas consequências. Em fevereiro, o regime anunciou que as estudantes de medicina estavam proibidas de fazer seus exames finais. Os talibãs já haviam banido mulheres de universidades em dezembro de 2022.
Em todas as conversas, as mulheres no Afeganistão enfatizam que o mundo não deve ficar de braços cruzados: elas precisam do apoio e da solidariedade da comunidade internacional.
Mulheres não podem mais ir à universidade no Afeganistão
Desde que tomou o poder em meados de 2021, o Talibã tem continuamente restringido os direitos da população feminina do país. A mais recente medida do regime de Cabul impede que elas frequentem faculdades.
Foto: AFP
Adeus para sempre?
Uma mulher usando burca deixa uma universidade na província de Kandahar. Ela não tem permissão para voltar a estudar. Em uma declaração governamental, o Talibã instruiu todas as universidades públicas e privadas do Afeganistão a proibir a presença de mulheres. Todas as estudantes do sexo feminino estão excluídas das universidades.
Foto: AFP
Mulheres excluídas
No dia seguinte à proibição de mulheres frequentarem a universidade, o Talibã controla a entrada de uma instituição de ensino superior em Cabul: as estudantes do sexo feminino têm que ficar do lado de fora. A proibição é por um período indefinido. Mas os protestos já estão agitando as universidades: os colegas estudantes do sexo masculino interromperam um exame, professores paralisaram as aulas.
Foto: WAKIL KOHSAR/AFP/Getty Images
Ensino superior só para homens
Restrições já existiam antes: depois que o Talibã tomou o poder em agosto de 2021, as universidades tiveram que separar as entradas e as salas de aula por gênero. As mulheres só podiam ter aulas com professoras mulheres ou homens idosos. Na foto, uma área para estudantes do sexo feminino na Universidade de Kandahar separada por uma cortina.
Foto: AFP/Getty Images
Últimas formandas
Estas formandas da Universidade Benawa de Kandahar ainda conseguiram se formar em ciências da computação em março. Em nível internacional, a nova restrição dos direitos da mulher tem sido fortemente criticada: a organização de direitos humanos Human Rights Watch chamou a proibição universitária de "decisão vergonhosa", a ONU a descreveu como uma violação dos direitos humanos.
Foto: JAVED TANVEER/AFP
"Impacto devastador sobre o futuro do país"
Ainda em outubro, milhares de meninas e mulheres haviam feito testes de admissão na faculdade, como estas em frente à Universidade de Cabul. Muitas querem ser professoras ou médicas. O secretário-geral da ONU, António Guterres, disse que a proibição de cursar a universidade "não só viola a igualdade de direitos das mulheres, mas terá consequências devastadoras".
Foto: WAKIL KOHSAR/AFP/Getty Images
Sem chances de formação
A proibição de frequentar a universidade é mais uma restrição às oportunidades educacionais para mulheres e meninas afegãs. Desde algum tempo, as adolescentes na maior parte do país não podem frequentar escolas a partir da sétima série. Estas meninas, que estão a caminho da escola no leste do Afeganistão, têm sorte: algumas províncias longe dos centros de poder do Talibã ignoram a proibição.
Foto: AFP
País das mulheres invisíveis
Meninas e mulheres afegãs são em grande parte excluídas da vida pública. Há meses, elas não podem visitar academias de ginástica e parques em Cabul. Este parque de diversões na capital também é proibido para elas. O Talibã alegou que os regulamentos sobre a separação dos sexos não estavam sendo observados e que as mulheres não estavam usando o lenço na cabeça conforme prescrito.
Foto: WAKIL KOHSAR/AFP/Getty Images
Distopia vira realidade
As mulheres coletam flores de açafrão na província de Herat. Este trabalho elas têm permissão de fazer, ao contrário da maioria das outras profissões. Desde que chegou ao poder, o Talibã promulgou inúmeras regulamentações que restringem maciçamente a vida de mulheres e meninas: por exemplo, elas estão proibidas de viajar sem acompanhante masculino e fora de casa devem usar hijab ou burca.
Foto: MOHSEN KARIMI/AFP
"Vergonha para o mundo"
Muitas mulheres afegãs não querem aceitar a revogação de seus direitos. Na foto, uma manifestação em Cabul em novembro. "A terrível situação das mulheres afegãs é uma vergonha para o mundo", lê-se num cartaz. O protesto público requer muita coragem: manifestantes correm o risco de serem espancadas e presas. As militantes dos direitos das mulheres são perseguidas no Afeganistão.