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"Tarsila está se tornando um ícone do Brasil"

16 de dezembro de 2020

Na véspera do leilão da tela "A caipirinha", Tarsilinha do Amaral fala sobre legado da tia-avó e como internacionalização da obra da pintora modernista eleva arte brasileira a novo patamar no mundo.

Tarsila do Amaral
Obra de Tarsila do Amaral está sendo valorizada, exposta e conhecida cada vez mais no mundo todo

Ainda que seja só na escola, todo brasileiro ao menos já ouviu falar de Tarsila do Amaral (1886-1973), ícone do modernismo. Mas se nos últimos anos sua obra está sendo valorizada, exposta e conhecida cada vez mais no mundo todo, os méritos também são de outra Tarsila do Amaral.

Ela tem 56 anos e é conhecida como Tarsilinha. Trata-se da sobrinha-neta homônima da artista, responsável, há 20 anos, por gerir os direitos da obra da modernista brasileira. E cuidar do legado. De lá para cá, ela coordenou os trabalhos para a publicação do catálogo raisonné de Tarsila e esteve à frente de tratativas para promover o nome de sua tia-avó, não só no Brasil, mas também no exterior.

Os resultados chegam. Em 2017, o Instituto de Arte de Chicago, nos Estados Unidos, realizou uma grande mostra dedicada à artista. No ano seguinte foi a vez do Museu de Arte Moderna de Nova York, o MoMA. De quebra, a instituição adquiriu a obra A lua por 20 milhões de dólares, o mais alto valor já pago a uma obra de arte brasileira. "A venda, claro, inflacionou a obra dela, colocou a obra dela no patamar dos grandes artistas mundiais", diz Tarsilinha. Em 2019, o Museu de Arte de São Paulo (Masp), dedicou sua mostra principal a Tarsila, com recorde de público.

Uma nova cifra impressionante está prevista para esta quinta (17/12), quando vai a leilão a tela A caipirinha. Com lance inicial de R$ 47 milhões, o quadro pertencia ao empresário Salim Taufic Schahin, investigado na Operação Lava Jato. O leilão ocorre por determinação judicial, já que o empresário tem dívida de mais de R$ 2 bilhões com um grupo de 12 bancos.

"Acho que, se ficar no Brasil, a chance maior é ficar com algum grande colecionador. E espero que esse colecionador seja uma pessoa que empreste a obra para exposição, que a obra seja vista", comenta a sobrinha-neta.

DW Brasil: Podemos dizer que tem havido uma redescoberta da obra de Tarsila nos últimos anos, com essas exposições grandiosas? Sua tia-avó ficou pop?

Tarsilinha do Amaral: Ela está se tornando um ícone do Brasil. E um ícone pop também. Tenho um grande cuidado para não deixar banalizar a obra dela. Quero que ela seja reconhecida e, nesse sentido, mesmo fazer licenciamentos [comerciais] é também muito importante para tornar o artista mais acessível, mais perto do público. Isso também tem um resultado muito grande nas exposições e em tudo o que é feito com ela, por conta disso ela tem se tornado um ícone pop. Mas sempre com minha preocupação de não banalizar e ela continuar nesse patamar mais alto que tem na arte brasileira, academicamente. Isso é importante.

De que maneira a compra de A lua pelo MoMA inflacionou o restante da obra de Tarsila?

Essa venda foi um marco, realmente. Primeiro por ser o MoMA, um dos museus mais importantes do mundo, com capacidade muito grande de levar o artista para ser conhecido no mundo todo. A venda, claro, inflacionou a obra dela, colocou a obra dela no patamar dos grandes artistas mundiais. Amanhã [quinta-feira] tem um quadro dela que vai ser leiloado com lance mínimo de R$ 47 milhões. Acredito que, daqui para a frente, esses recordes vão acontecer constantemente. O valor monetário de uma obra reflete o valor que ela tem para a arte brasileira, para a arte mundial. É um parâmetro.

Sobre esse leilão, como ficam suas expectativas? Seria melhor que a tela fosse comprada por um brasileiro? Ou é uma oportunidade de seguir para o exterior, para algum grande museu e, assim, internacionalizar mais a obra de Tarsila?

Fico dividida. Claro que gostaria que a obra ficasse no Brasil, adoraria que fosse para um museu brasileiro. Mas infelizmente sabemos que a realidade dos museus brasileiros… Eles estão em uma situação muito difícil e não têm verba para comprar um quadro tão caro. Acho que, se ficar no Brasil, a chance maior é ficar com algum grande colecionador. E espero que esse colecionador seja uma pessoa que empreste a obra para exposição, que a obra seja vista. Outra possibilidade é que esse colecionador deixe o quadro em comodato com algum museu, o que seria maravilhoso. No caso de essa obra ir para fora, isso também seria importante. E, algum museu de fora, acho que eles vão ter essa generosidade de estar emprestando para exposições. E uma obra brasileira exposta em museus internacionais é importante não só para minha tia, mas também para a arte brasileira.

Nesse mesmo sentido, muitos reclamam do fato de que Abaporu, a tela mais famosa de Tarsila, pertence a uma coleção argentina, e não brasileira. Como você lida com essa situação?

Realmente muitas pessoas me falam que esse quadro tinha de estar no Brasil. E ainda reclamam que está justamente na Argentina! Claro, tem essa rivalidade, mas é uma rivalidade muito mais do futebol. Puxa vida, é um país muito querido, com pessoas que conheço e de quem gosto muito. Inclusive o dono do Abaporu [o empresário e colecionador Eduardo Constantini, que arrematou a obra em leilão em 1995, pagando por ela 1,35 milhão de dólares], uma pessoa por quem tenho muito carinho, está sempre me atendendo, me emprestando o quadro para diversas exposições. Ele é uma pessoa que faz publicações muito bonitas e está sempre ajudando a arte brasileira. E o fato de estar em um museu tão importante [o Museu de Arte Latino-Americana de Buenos Aires (Malba), criado por Constantini] é um fato relevante não só para a minha tia, mas para a arte brasileira. Mas, claro, adoraria que esse quadro estivesse aqui, em algum museu do Brasil. Seria maravilhoso.

Está para sair um desenho animado baseado na obra de Tarsila, certo? Como será isso?

É um projeto de muitos anos. Comecei a pensar nisso há 12 anos. [A ideia] foi fazermos um personagem fictício, falando sobre a infância dela e mostrando as obras, como cenário. Procurei a TV PinGuim [um estúdio de animação brasileiro], me apresentaram [um projeto]. Eles tiveram estrondoso sucesso com dois personagens que criaram, o Peixonauta e a Luna [de O Show da Luna!]. Trabalharam o personagem, o roteiro, mas de uma maneira bem devagar. Ficou pronto no ano passado. Iríamos lançar neste ano no cinema, mas claro que, com a pandemia, não conseguimos. Ficamos vendo as possibilidades, talvez em streaming. Acabamos lançando o clipe do desenho, com música do Zeca Baleiro. É lindo. A expectativa é que o filme saia no ano que vem e, tomara, seja um sucesso também. Foi feito com muito carinho e cuidado.

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