Sem foro privilegiado de presidente da República, Temer verá as denúncias contra ele serem encaminhadas à primeira instância e estará diante de tempos incertos. Pode acontecer com ele o que aconteceu com Lula?
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Quando o presidente Michel Temer passar a faixa para seu sucessor, Jair Bolsonaro, em 1º de janeiro, o advogado de 78 anos vai estar diante de tempos incertos. Ele não estará mais no centro do poder. Nesta semana, a procuradora-geral da República, Raquel Dodge, o colocou no "epicentro de um sistema criminoso" no caso do inquérito dos portos, como ela afirmou na divulgação da terceira denúncia contra Temer.
No Supremo Tribunal Federal (STF) já existem duas outras denúncias contra o presidente da República, envolvendo acusações de corrupção, obstrução de Justiça e participação em organização criminosa, casos situados no âmbito da Operação Lava Jato. Levadas à Câmara dos Deputados, ambas foram suspensas.
Na quinta-feira, a Folha de S. Paulo publicou que Temer enfrentará cinco novos inquéritos na primeira instância da Justiça.
Temer não será preso ao descer a rampa do Palácio do Planalto. Mas, com a perda do foro privilegiado de presidente, ele se tornará um cidadão comum, e seus processos passarão do STF para a primeira instância da Justiça. E esta é rápida, ao contrário do STF. A primeira instância já condenou um antecessor de Temer, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. A decisão foi confirmada em segunda instância. Será que Temer corre o risco de ter o mesmo destino de Lula?
"Não dá para ter certeza sobre o que vai acontecer porque primeiramente a denúncia tem de ser aceita ou não", afirma Thomaz Pereira, professor de direito da Fundação Getúlio Vargas (FGV) no Rio. "Mas, se ela for aceita, considerando o que temos visto acontecer em processos de corrupção no Brasil, há uma probabilidade alta de que ele seja preso."
Segundo Pereira, o caso de Temer pode ser comparado ao de Eduardo Cunha, o ex-presidente da Câmara que, após a sua cassação como deputado – e subsequente perda do foro privilegiado – foi rapidamente condenado em primeira instância.
Desde então, o antes poderoso Cunha, que autorizou a abertura do processo de impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff, encontra-se preso em Curitiba. "Certamente é uma perspectiva com a qual o presidente Temer trabalha, e é algo que se espera", aponta Pereira.
Também seria possível que, no caso de sua prisão, Temer tentasse buscar um acordo de leniência. "Essa possibilidade certamente existe", afirma Pereira. "Mas também vimos alguns casos em que políticos gostariam de ter feito isso, como foi o caso do ex-ministro Antonio Palocci. Mas o Ministério Público recusou dizendo que não tinha nada de novo. Assim não se sabe se o MP teria interesse numa colaboração do ex-presidente Temer nesta altura."
Segundo o cientista político Oliver Stuenkel, da Fundação Getúlio Vargas, Temer poderia ganhar tempo por meio de um cargo no governo Bolsonaro. "Pode ser que ele se torne embaixador na Itália", diz Stuenkel. Esse boato foi alimentado pela disposição de Temer em extraditar Cesare Battisti, condenado na Itália.
A imprensa noticiou que já em novembro interlocutores do Planalto e do Itamaraty teriam discutido a possibilidade de nomear Temer embaixador para, assim, protegê-lo da Justiça. Bolsonaro comentou o boato de forma vaga. "Quem não estiver devendo à Justiça poderá vir conversar", afirmou o futuro presidente.
Porém, Bolsonaro havia prometido combater a corrupção e a impunidade. "Muitos dos eleitores de Bolsonaro querem que Temer, assim como muitos outros políticos, seja processado. Porque ele é visto como parte do antigo sistema, e espera-se que Bolsonaro se diferencie dos velhos políticos", observa Stuenkel.
Resta ainda o próprio STF, que agendou para 10 de abril a sua decisão sobre prisão após condenação em segunda instância, o que poderá afetar também Temer. O resultado deve ser apertado.
Um meio-termo pode surgir caso o STF permita a detenção após a terceira instância, ou seja, após a revisão pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) – e, assim, antes do esgotamento final de todas as instâncias, pois um novo recurso ainda é possível no próprio STF. Para Lula, a sentença, entretanto poderia chegar tarde demais.
"Pode ser que, até eles decidirem isso, o recurso de Lula no STJ já tenha sido julgado. Caso isso aconteça, pode ser que mesmo eles mudando o entendimento para autorizar a prisão só a partir da terceira instância, isso não beneficiaria mais o Lula", afirma Pereira.
Stuenkel vê a libertação de Lula como algo bem distante. "Pelo menos nos primeiros dois ou três anos, Bolsonaro impedirá o perdão ou a correção desses processos. Presumo que Lula permanecerá na prisão."
Com diplomação, presidente eleito conclui primeira fase da transição e já tem o gabinete formado. Durante a campanha, ele prometeu reduzir número de ministros de 29 para 15, mas acabou com 22. Veja quem são.
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Redução modesta
Durante a campanha, Jair Bolsonaro prometeu reduzir o número de ministérios de 29 para 15. Mas, durante a transição, o presidente voltou atrás e promoveu uma redução bem menor do que a prometida. Ao todo, há 22 pastas no novo governo. Entre os ministros, há filiados do DEM, PSL e MDB, além de dez com laços militares, dois discípulos de Olavo de Carvalho e apenas duas mulheres.
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Paulo Guedes
Guru econômico e ministro anunciado ainda durante a campanha, Paulo Guedes comanda o superministério da Economia, formado pela junção das pastas da Fazenda, do Planejamento e da Indústria e Comércio Exterior. O economista é investigado pelo Ministério Público Federal (MPF), suspeito de ter cometido fraudes na captação de recursos de fundos de pensão de estatais entre 2009 e 2013.
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Onyx Lorenzoni
Deputado federal do DEM, Onyx Lorenzoni articulou a campanha de Bolsonaro desde 2017 e foi indicado para assumir a Casa Civil. Em sua carreira política, já foi deputado estadual no Rio Grande do Sul e, desde 2003, tem mandatos na Câmara. Após ser citado na delação da JBS, ele admitiu ter recebido caixa dois de campanha, e está sendo investigado pela Procuradoria-Geral da República.
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Sérgio Moro
Juiz federal que foi responsável pela Lava Jato em primeira instância, Sérgio Moro comandará o Ministério da Justiça. Seu decisão de entrar para a política causou polêmica. Foi ele quem condenou Lula pela primeira vez em 2017, o que marcou o início dos problemas do ex-presidente em registrar sua nova candidatura ao Planalto em 2018. Fato que ajudou Bolsonaro a assumir a liderança nas pesquisas.
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Marcos Pontes
Astronauta que chegou a ser cotado para vice da chapa do PSL, Marcos Pontes chefiará o Ministério da Ciência Tecnologia. Formado em engenharia aeronáutica pelo Instituto Tecnológico de Aeronáutica, Pontes se tornou o primeiro astronauta brasileiro da história e foi enviado ao espaço pela Missão Centenário, em 2006, durante o governo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Ele é filiado ao PSL.
A deputada federal Tereza Cristina (DEM) comandará o Ministério da Agricultura. Engenharia agrônoma e empresária, Tereza Cristina foi presidente da Frente Parlamentar da Agropecuária e indicada pela bancada ruralista para o cargo. Ela defende a aprovação do projeto lei que flexibiliza as regras para a fiscalização e aplicação de agrotóxicos no país.
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Ernesto Araújo
Diplomata de carreira, Ernesto Araújo assumirá o Ministério das Relações Exteriores. Discípulo de Olavo de Carvalho, ele atuou no Itamaraty em várias áreas, porém, nunca chefiou uma embaixada. Araújo mantinha um blog no qual fez campanha para Bolsonaro, chamou o PT de "Partido Terrorista" e disse querer libertar o mundo da "ideologia globalista". Admira Donald Trump e nega o aquecimento global.
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Luiz Henrique Mandetta
Deputado federal do DEM (MS), Luiz Henrique Mandetta ficou com o comando do Ministério da Saúde. Médico ortopedista e ligado a Lorenzoni, ele era crítico do Programa Mais Médicos. Entre 2005 e 2010, Mandetta foi secretário municipal de saúde de Campo Grande. A passagem pelo cargo lhe rendeu um inquérito por suspeita de fraude em licitação, tráfico de influência e caixa dois.
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Fernando Azevedo e Silva
O general da reserva Fernando Azevedo e Silva foi escolhido para o Ministério da Defesa. Natural do Rio, ele deixou o Alto Comando do Exército em 2018 e passou a assessorar o presidente do STF, Dias Toffoli. Azevedo e Silva foi chefe do Estado-Maior do Exército e comandante da Brigada Paraquedista, onde serviu ao lado de Bolsonaro. Chefiou ainda operações na Missão de Paz da ONU no Haiti.
Foto: Tomaz Silva/Agência Brasil
Ricardo Vélez Rodríguez
Escolha do colombiano antipetista Ricardo Vélez Rodríguez para assumir o Ministério da Educação foi indicação de Olavo de Carvalho. Nascido em Bogotá e naturalizado brasileiro, Vélez Rodríguez é formado em filosofia e mostrou apoiar várias das bandeiras defendidas por Bolsonaro, como a expansão de escolas militares no país e o combate a uma suposta predominância de ideias esquerdistas no ensino.
Foto: Agência Brasil
Tarcísio Gomes de Freitas
O ex-diretor do Dnit Tarcísio Gomes de Freitas chefiará o novo Ministério da Infraestrutura, que deve englobar a atual pasta de Transportes, Portos e Aviação Civil. No governo Temer, Freitas foi secretário de Coordenação de Projetos do Programa de Parceria em Investimentos e consultor legislativo da Câmara dos Deputados. O engenheiro civil iniciou a carreira no Exército e atuou no Haiti.
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Gustavo Canuto
Servidor efetivo do Ministério do Planejamento, Gustavo Henrique Rigodanzo Canuto comandará o novo Ministério do Desenvolvimento Regional. Servidor sem filiação partidária, Canuto é formado em engenharia da computação e direito e já atuou na Secretaria Geral da Presidência da República, na Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) e na Secretaria de Aviação Civil.
Foto: Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil
Osmar Terra
Ex-ministro do governo Temer, Osmar Terra assumiu o novo Ministério da Cidadania e Ação Social. Médico, Terra é deputado federal pelo MDB desde 2001. Já foi prefeito de Santa Rosa (RS) e secretário de Saúde do RS. Terra poderá ser um dos ministros que trará dor de cabeça a Bolsonaro. O deputado apareceu na superplanilha da Odebrecht, que indicaria propinas pagas a políticos.
Foto: Viola Jr/Camara dos Deputados
Marcelo Álvaro Antônio
Deputado do PSL Marcelo Álvaro Antônio assumirá o Ministério do Turismo. Integrante da frente parlamentar evangélica, ele foi o candidato mais votado em Minas Gerais, reeleito para o segundo mandato neste ano. Antes de ser deputado, Antônio foi vereador de Belo Horizonte. Antônio é o segundo filiado do PSL escolhido por Bolsonaro para integrar seu governo.
Foto: Agência Brasil/Valter Campanato
Bento Costa Lima Leite de Albuquerque Júnior
O almirante Bento Costa Lima Leite de Albuquerque Júnior chefiará o Ministério de Minas e Energia. Ele atuou como diretor-geral de Desenvolvimento Nuclear e Tecnológico da Marinha, foi observador do Brasil na Força de Paz das Nações Unidas em Sarajevo, na Bósnia-Herzegovina, e comandante de submarinos.
Foto: Getty Images/AFP/H. Retamal
Damares Alves
Pastora evangélica e assessora do senador Magno Malta (PR), Damares Alves foi escolhida para chefiar o Ministério da Mulher, Família e Direitos Humanos. A advogada trabalha há mais de 20 anos no Congresso. Ela já declarou que a mulher nasceu para ser mãe, se posicionou contra o feminismo e políticas voltadas a diminuir a discriminação de homossexuais. É contra a legalização do aborto e das drogas.
Foto: Agência Brasil/V. Campanato
Ricardo de Aquino Salles
Advogado e criador do Endireita Brasil, Ricardo de Aquino Salles será o ministro do Meio Ambiente. Salles foi secretário estadual do Meio Ambiente no governo de Geraldo Alckmin. É réu por improbidade administrativa, acusado de esconder alterações em mapas do zoneamento ambiental do rio Tietê, numa ação que teria favorecido mineradoras. Foi ainda diretor da Sociedade Rural Brasileira.
Foto: Imago/Fotoarena
Ministérios dentro do Planalto
Além da Casa Civil, outros três ministérios funcionam dentro do Planalto. Ex-presidente do PSL e aliado próximo de Bolsonaro, Gustavo Bebianno será o chefe da Secretaria-Geral. O general reformado que comandou a Missão ONU para a Estabilização no Haiti Augusto Heleno ficou com o Gabinete de Segurança Institucional. Já o general Carlos Alberto dos Santos Cruz ficará com a Secretaria de Governo.
Foto: Getty Images/AFP/M. Pimentel
AGU e CGU
A Advocacia-Geral da União (AGU) ficará sob o comando do advogado André Luiz de Almeida Mendonça, que, ao longo da carreira, atuou em áreas de transparência e combate à corrupção. O Ministério da Transparência e Controladoria-Geral da União (CGU) continuará a ser chefiado por Wagner Rosário (foto). O servidor de carreira ocupa o cargo desde junho de 2017, indicado pelo ex-presidente Michel Temer.
Foto: Agência Brasil/Marcelo Camargo
Roberto Campos Neto
O chefia do Banco Central ficou com o economista Roberto Campos Neto, neto do ex-ministro do Planejamento Roberto Campos, que comandou a pasta entre 1964 e 1967, durante a ditadura militar. Próximo de Paulo Guedes, já atuou no banco Santader, no banco Bonzano Simonsen e na gestora de fundos Claritas.