A bióloga Stephanie Splett estudou em Brasília por acaso, depois que seu pai, repentinamente, decidiu aceitar um cargo na embaixada alemã. Desde então, ela nutre um carinho especial pelo país.
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"Minha relação com o Brasil não começou por impulso meu – foram meus pais que decidiram mudar para Brasília em 1985. Meu pai trabalhou na embaixada alemã na capital federal como adido de agricultura e florestas. Honestamente, não me lembro porque meus pais ficaram tão interessados em mudar para um país quente como o Brasil – eles, que sempre tiraram férias com meus dois irmãos mais novos e comigo na Escandinávia.
Eu tinha 19 anos e acabado de encerrar o ensino fundamental, tinha começado meus estudos de Biologia na universidade em Bonn e não acompanhei meus pais. Mas visitava minha família em Brasília – meu irmão e minha irmã foram junto com meus pais – nas férias da faculdade. E também comecei a pensar em como poderia conciliar os estudos com o Brasil.
Assim, no início de 1990, consegui fazer o meu trabalho de conclusão de curso da universidade alemã em parceria com a Universidade de Brasília. Eu fazia parte de um instituto de sistemática e estudava, entre outras coisas, fenômenos que levam a uma maior biodiversidade. Me concentrei numa família de plantas e cartografei as ocorrências no Distrito Federal. Minhas estadias no Brasil, nessa época, não foram tão longas – por duas ou três vezes, passei um mês no país para fazer a pesquisa de campo.
Foi diferente durante o doutorado. Meus pais já tinham voltado a morar na Alemanha e eu fiz pesquisas de campo mais extensas, durante um ano e meio, entre 1994 e 1995.
Sem dúvida, essas experiências com o Brasil mudaram a minha vida. Foi uma mudança de fato emocional, tanto para mim quanto para os meus pais, que, mesmo depois de voltar para a Alemanha, mantinham muito o contato com as pessoas no país. Meu irmão acabou se casando com uma brasileira – atualmente, eles moram em Washington, nos EUA, e minha cunhada diz estar desiludida tanto com a situação da segurança quanto com a política brasileira. Eu acho que a situação atual do Brasil é bastante complexa.
Ainda domino o português e tento me manter informada sobre o Brasil. No trabalho, sou chefe do grupo América aqui do DLR (sigla em alemão para Centro Aeroespacial Alemão) há quase dez anos – mesmo tendo passado bastante tempo fora do âmbito ligado ao Brasil, já que não existiam postos que tinham relação com o país quando entrei aqui e, por isso, fui designada para trabalhar com a Europa Oriental por um longo período. Hoje em dia, quase sempre os assuntos dos quais trato tem relação com o Brasil, mas não é um contato diário.
Também quero que meus dois filhos, de 15 e 17 anos, estabeleçam uma relação com a América Latina – talvez eles se voltem mais para o Chile, porque minha irmã se mudou para lá e eles já conhecem o país.
Tenho uma ligação muito especial com o Brasil. Acho que trouxe uma postura de tranquilidade de lá: quando enfrento situações difíceis ou que não dão certo num primeiro momento, encaro com o bordão 'vai funcionar de algum jeito'. A música também é muito importante para mim. E gosto da forma mais solta, mais leve de lidar com a vida dos brasileiros. Percebi muito essa leveza quando voltei para a Alemanha.
Também acho que aprendi a valorizar o que temos aqui Europa. Eu sofri um acidente de trânsito em Brasília na época da faculdade e, por não dominar muito bem o português, fiquei bem insegura. Acabei tendo que pagar por danos no automóvel do homem que, na verdade, causou o acidente: um engavetamento no qual meu carro ficou preso no meio. Foi uma experiência negativa, já que eu não tinha certeza de que teria o apoio das autoridades quando fui à polícia.
Na série Como o Brasil mudou minha vida, a DW conta a história de alemães que viveram no país.
O que é típico brasileiro?
O Brasil tem muitas facetas. É difícil dizer que algo é tipicamente brasileiro. Mesmo assim, há características que chamam a atenção de quem é de fora. Veja o que jornalistas estrangeiros no Brasil acham dos brasileiros.
Foto: picture-alliance/dpa
O atraso faz parte do dia a dia
Ao marcar um encontro com um brasileiro, pode-se ter quase certeza de que ele vai se atrasar pelo menos alguns minutos, se não mais de uma hora. Isso é normal, e raramente alguém fica aborrecido. E, quando sabe que o outro não será pontual, você também se acostuma a chegar tarde: o atraso já é levado em conta. Resta a pergunta: Não seria mais fácil todo mundo aparecer no horário combinado?
Foto: Fotolia/olly
O famoso "jeitinho brasileiro"
O termo "jeitinho brasileiro" se refere à forma criativa de resolver problemas e superar obstáculos. Quando você pensa que já tentou de tudo, vem o brasileiro e acaba achando uma solução – por mais inconvencional que ela seja! Pena que, como tudo na vida, o jeitinho não é só usado para coisas boas.
Foto: Colourbox
Cerveja, só geladíssima
Para um brasileiro, a cerveja tem que estar "estupidamente gelada". E, enquanto em muitos outros países, cada um compra a sua garrafinha de 330 ml ou 500 ml, no Brasil as pessoas pedem uma garrafa grande e dividem a cerveja em copos. E, para admiração do turista, a garrafa é colocada num porta-cerveja para não esquentar. Algo impensável na Alemanha!
Foto: Getty Images/AFP/M. Hippenmeyer
Sem arroz e feijão não dá!
A paixão por arroz e feijão de quase todo brasileiro é um fenômeno engraçado. Muitos comem isso todo dia e, e mesmo quando há outras opções na mesa, se servem de arroz e feijão. O estrangeiro pensa: "Deve ser um instinto de sobrevivência!" Quando o brasileiro tem que passar um tempo sem o amado arroz e feijão, parece até que foi privado de uma necessidade básica.
Foto: picture-alliance/dpa/N. Tondini
Todo brasileiro sabe sambar
Na música brasileira há uma grande variedade de estilos: forró, sertanejo, axé... Mas, no exterior, o Brasil é famoso principalmente pelo samba. Pensa-se que todo brasileiro samba em todas as ocasiões festivas. Seja isso verdade ou não, o fato é que o samba é um dos maiores símbolos brasileiros e até virou produto de exportação. Há centenas de escolas de samba no Japão e na Europa.
Foto: Reuters/S. Moraes
O país do Carnaval
Quando se pensa no Brasil, para muitos a primeira coisa que vem à cabeça é o Carnaval. Pela televisão, a cada ano, espectadores do mundo inteiro admiram as imagens do Sambódromo com os dançarinos e suas fantasias espetaculares. Sem dúvida, o Carnaval é a maior festa popular do Brasil. Porém, de acordo com vários estudos, mais da metade dos brasileiros afirma não gostar muito de cair na folia.
Foto: Reuters/R. Moraes
Paciência e otimismo
É incrível a paciência e o otimismo que o brasileiro tem em relação ao futuro ou quando algo não funciona. Em vez de criar cenários sombrios, ele confia que "vai dar tudo certo" e espera até as coisas se ajeitarem. Um estudo do Instituto Gallup World Poll realizado em 138 países apontou que os brasileiros são o povo mais otimista do mundo.
Foto: imago/Schreyer
Comunicativos e alegres
Os brasileiros realmente sabem como aproveitar a vida: gostam de bater um papo, se reunir, fazer churrasco... É o jeito sociável e extrovertido deles que faz turistas e imigrantes amar o país. Mesmo que muitos brasileiros sejam assim, é claro que há exceções: pois ser comunicativo e alegre não é só uma questão da cultura, mas também de cada personalidade.
Foto: Fotolia/Andres Rodriguez
Educados até demais
O brasileiro é educado e não muito direto. Muitas vezes, prefere ficar calado para evitar irritação e embaraço. Ele não gosta de enfrentar situações desagradáveis e, por isso, às vezes se torna um desafio obter um claro "sim" ou "não" dele. Bom, ser educado não é ruim, mas, se for demais, atrapalha!
Foto: Imago/K. M. Höfer
Viciados em redes sociais
WhatsApp, Facebook, Snapchat. Quem tiver, por exemplo, amigos brasileiros e amigos alemães nas redes sociais, provavelmente vai notar uma diferença no comportamento online. Enquanto o alemão evita mostrar muito da vida privada na internet, o brasileiro é bastante ativo. Um estudo de 2012 apontou que os brasileiros são o povo mais viciado em Facebook.
Foto: picture-alliance/dpa/S. Kahnert
Brasileiro é machista
Numa festa, uma mulher pode estar certa de que alguém vai flertar com ela se não tiver um namorado ao lado. Até certo ponto, tudo bem, mas em geral ele não se conforma com uma rejeição, ficando chato e insistente. Em situações assim, fica evidente que no Brasil há uma cultura de dominação masculina. Embora nos últimos anos já tenha mudado muito, o machismo ainda está impregnado na sociedade.
Foto: Fotolia/snaptitude
Democracia racial?
Seja descendente de italiano, alemão, japonês ou africano, no Brasil, todos vivem juntos e se sentem brasileiros em primeiro lugar. Em países europeus, onde a integração de imigrantes é difícil, isso parece um milagre. Só que, além da aparência, há sim desigualdade no Brasil. Estudos mostram que negros são discriminados. E a maioria dos pobres no Brasil são negros; e a maioria dos ricos, brancos.
Foto: Getty Images/AFP/Y. Chiba
Quem é a mais bela de todas?
Unhas perfeitas, visitas semanais ao salão de beleza, horas em frente ao espelho. A mulher brasileira adora cuidar do próprio corpo e se arrumar. Segundo um estudo internacional da empresa de cosméticos Avon, ela se importa mais com a aparência do que qualquer outra mulher no mundo.
Foto: picture-alliance/dpa
Orgulho e vergonha ao mesmo tempo
A atitude do brasileiro em relação à própria nacionalidade é um pouco paradoxal: por um lado, ele adora o país, tem orgulho da cultura, da natureza, de tudo. Por outro lado, nota-se certo "complexo de vira-lata". É uma expressão criada pelo escritor Nelson Rodrigues, que significa que o brasileiro se acha inferior em comparação com outras nacionalidades e não tem muita fé no próprio país.