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História

Tensão entre Namíbia e Alemanha sobre devolução de ossadas

Daniel Pelz rk
8 de agosto de 2018

Cerimônia em Berlim deveria apaziguar ânimos em meio às complicadas negociações sobre como lidar com o genocídio dos hereros, executado pelo Império Alemão. Mas exclusão de ativistas gera mais desentendimento.

Crânio de uma vítima do genocídio na Namíbia exposta em Berlim durante missa
Crânio de uma vítima do genocídio na Namíbia exposta em Berlim durante missa Foto: Imago/epd

A Namíbia e a Alemanha precisam urgentemente de uma reconciliação – há fissuras na relação entre os dois países, apesar das reiteradas afirmações em contrário. As negociações entre os governos para o processamento histórico do genocídio na antiga colônia do Império Alemão, no início do século 20, estão travadas e, três anos depois de iniciadas, ainda não há qualquer perspectiva para um pedido de desculpas por parte do governo alemão.

A situação eleva a frustração na sociedade da Namíbia. Já o governo alemão diz estar sendo injustamente acusado e reitera que não lhe falta boa vontade. "As expectativas da Namíbia são nitidamente maiores do que o que a Alemanha pode fazer", queixou-se o chefe das negociações do governo alemão, Ruprecht Polenz, em março deste ano.

Em meio a essas tensões, a planejada devolução de ossadas humanas deveria ajudar a apaziguar um pouco as tensões. Já em 2011 e 2014, a Alemanha devolvera ossadas humanas à Namíbia. Ambas as partes ainda se mostram reservadas na divulgação de informações sobre o próximo retorno, previsto para o final de agosto. As ossadas em questão seriam de vítimas do genocídio dos povos herero e nama, originárias, entre outros, dos arquivos da Clínica Universitária Charité, em Berlim. A Charité não se pronunciou sobre essa informação.

Falta de recursos para o transporte

Como parte da cerimônia de devolução, haverá uma missa em memória das vítimas na igreja de Friedrichstadt, na praça Gendarmenmarkt, no centro de Berlim. O evento é organizado pela Igreja Evangélica alemã (EKD, na sigla em alemão).

No ano passado, a EKD fez um pedido público de perdão. Na época do genocídio, no início do século 19, missionários evangélicos alemães também estavam na então colônia Sudoeste Africano Alemão. Alguns deles criticaram as atrocidades cometidas pelos soldados alemães, mas vários apoiaram abertamente o massacre. Com a missa, a EKD tenta contribuir para a reconciliação.

A bispa Petra Bosse-Huber, diretora do Departamento de Ecumenismo e Trabalho no Exterior da EKD, destaca também a importância da devolução das milhares de ossadas humanas que ainda permanecem em museus e arquivos alemães. "Quem conhece um pouquinho a África sabe da importância dos antepassados e entende a profunda mágoa que isso gera", comenta.

Já o Ministério alemão do Exterior afirma querer uma devolução digna dos restos mortais para a Namíbia. Mas é exatamente isso que parece não estar acontecendo, pois também a planejada cerimônia está sendo ofuscada pela briga em torno do processamento histórico do genocídio.

Segundo o jornal namíbio Windhoek Observer, faltam recursos financeiros ao governo da Namíbia para enviar uma delegação maior a Berlim. O Ministério alemão do Exterior pretende preencher essa lacuna e divulgou que, a pedido do país africano, vai assumir as despesas de viagem de representantes das comunidades especialmente afetadas pelo massacre. Segundo o Observer são 25 pessoas.

Exclusão de críticos notáveis?

Porém, vários representantes famosos dos povos herero e nama não constam da lista. Vekuii Rukoro, por exemplo, pertence à elite dos líderes tradicionais herero, os chamados "Paramount-Chiefs".

Enquanto alguns deles apoiam as negociações entre a Namíbia e a Alemanha, Rukoro é um crítico severo das tratativas. "Meu nome foi excluído porque eu entrei na Justiça contra a Alemanha", disse Rukoro. Em 2017, ele denunciou o governo alemão a um tribunal nos Estados Unidos para impor negociações diretas com a Alemanha e indenizações.

O nome de Ida Hoffmann, deputada namibiana e conhecida ativista do povo nama, também não estaria na lista, mas não há confirmação oficial dessa informação. O Ministério alemão do Exterior também não quis se pronunciar sobre as acusações de Rukoro.

Vekuii Rukoro, líder tradicional herero e crítico das negociações entre Alemanha e NamíbiaFoto: picture-alliance/dpa/J. Bätz

Um possível motivo para as exclusões de Hoffmann e Rukoro podem ser os tumultos que ocorreram durante a devolução das ossadas em 2011. Alguns herero e nama presentes à cerimônia, em Berlim, exigiram em voz alta uma desculpa alemã pelo genocídio, interrompendo discurso da então vice-ministra do Exterior da Alemanha, Cornelia Pieper. Pelo jeito, autoridades dos dois países querem evitar a repetição desse tipo de situação.

Aliados de Rukoro e Hoffmann atacaram o comportamento dos organizadores: "Essa política de exclusão dos governos alemão e da Namíbia não contribui em nada para a reconciliação da Alemanha com os herero e nama, afetados pelo genocídio até os dias atuais", diz o grupo Genocídio Não Prescreve, formado por organizações não-governamentais.

"O então império alemão trouxe essas ossadas para cá. É obrigação da Alemanha levá-las de volta. Isso também inclui pagar as despesas para a visita da delegação namibiana", diz Israel Kanautjike, um herero que vive em Berlim e representa a associação Genocídio Não Prescreve. Ele chamou de chantagem a exclusão de Rukoro e outros ativistas da cerimônia.

Mas é possível que a delegação namibiana pague as próprias despesas de viagem – e que novos protestos ocorram.

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