Tensões entre EUA e Rússia ameaçam cessar-fogo na Síria
17 de setembro de 2016
Moscou pede que Washington pressione rebeldes pelo fim das violações à trégua. EUA, por sua vez, exigem permissão de entrega de ajuda humanitária em áreas sitiadas. Reunião do Conselho de Segurança da ONU é cancelada.
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Os Estados Unidos e a Rússia demonstraram interesse nesta sexta-feira (16/09) em estender o cessar-fogo em vigor na Síria há quatro dias, embora o futuro do acordo se mostre cada vez mais incerto, com relatos de violações à trégua e o fracasso na entrega de ajuda humanitária a áreas sitiadas.
Moscou, que apoia o regime do presidente Bashar al-Assad, declarou-se favorável à extensão do cessar-fogo por mais 72 horas e afirmou que "continua usando sua influência" junto às forças sírias para garantir a trégua. Dmitry Peskov, porta-voz do Kremlin, disse esperar o mesmo de Washington.
Os EUA, por sua vez, aliados de grupos rebeldes moderados, afirmaram que também consideram importante a prorrogação do cessar-fogo, mas estão preocupados com a impossibilidade da entrega de ajuda – o governo americano acusa a Síria de estar bloqueando a passagem dos comboios.
Membros do Conselho de Segurança da ONU tinham uma reunião marcada para esta sexta-feira, na qual enviados de Moscou e Washington apresentariam detalhes do acordo conjunto, mas o encontro foi cancelado. O motivo não ficou claro, mas diplomatas dizem que foi um pedido de ambos países.
O acordo de cessar-fogo na Síria entrou em vigor na última segunda-feira, com previsão para durar sete dias. A trégua é a segunda acordada neste ano entre Moscou e Washington e tenta pôr fim aos cinco anos de guerra civil no país do Oriente Médio.
As duas potências esperam que o cessar-fogo possa criar as bases para se reiniciar negociações de paz no país, bem como contribuir para o combate de grupos extremistas, como o "Estado Islâmico" (EI). Outro intuito do acordo era permitir a chegada de ajuda humanitária a regiões sitiadas.
Incertezas sobre cooperação militar
Estados Unidos e Rússia haviam acordado que, se a cessação das hostilidades durar os sete dias previstos, eles estabeleceriam um centro conjunto de operações para atacar posições dos grupos terroristas EI e Frente Fateh al-Sham (Frente para a Conquista do Levante), excluídos do acordo.
Nesta sexta-feira, no entanto, Washington voltou a afirmar que a cooperação militar não vai acontecer a menos que a ajuda humanitária comece a chegar a Aleppo e outras comunidades em risco.
O secretário de Estado dos EUA, John Kerry, em conversa por telefone com o ministro russo do Exterior, Serguei Lavrov, disse que Moscou tem de pressionar o regime Assad para que permita as entregas.
"Os EUA não darão os próximos passos do acordo com a Rússia a menos que vejamos sete dias contínuos de violência reduzida e acesso de ajuda humanitária", reforça uma nota da Casa Branca.
EK/rtr/ap/afp/dpa
A guerra civil na Síria antes do EI
O "Estado Islâmico" inflamou o debate sobre como pôr fim à guerra civil síria. Contudo o grupo só emergiu mais tarde no conflito. Confira alguns momentos dessa guerra que abriram espaço para o avanço dos jihadistas.
Foto: AP
Março de 2011
Enquanto regimes ruem por todo o Oriente Médio, dezenas de milhares de sírios vão às ruas para protestar contra a corrupção, o desemprego elevado e a alta dos preços dos alimentos. O governo da Síria responde com armas de fogo. Até maio, cerca de 400 vidas são ceifadas.
Foto: dapd
Maio de 2011
Sob insistência dos países ocidentais, o Conselho de Segurança da ONU condena a repressão violenta. Nos meses seguintes, os Estados Unidos e a União Europeia impõem embargo de armas, recusa de vistos e congelamento de bens. Com apoio da Liga Árabe, aumenta a pressão para a saída do presidente sírio Bashar al-Assad – embora sem o aval de todos os países-membros da ONU.
Foto: picture-alliance/dpa/J. Szenes
Agosto de 2011
Em 1970 um golpe pusera Hafez al-Assad no poder. Após sua morte, em 2000, o filho Bashar (à dir.) assume a liderança. De início tido como reformista, ele perde apoio ao manter o estado de emergência que há décadas restringe as liberdades políticas, permitindo vigilância e interrogatórios. Assad tem respaldo da Rússia, que lhe fornece armas e repetidamente veta as resoluções da ONU sobre a Síria.
Foto: picture-alliance/dpa/Stringer/Ap/Pool
Dezembro de 2011
A ONU e outras organizações têm provas de violação dos direitos humanos na Síria. Civis e militares desertores começam a se organizar lentamente para combater as forças do governo, que vêm atacando os dissidentes. Até o fim de 2011, essa luta causa mais de 5 mil mortes. Mesmo assim, ainda transcorrem seis meses até a ONU reconhecer que o país está em guerra.
Foto: Reuters/Goran Tomasevic
Setembro de 2012
O Irã finalmente confirma que tem combatentes em solo sírio, fato que Damasco negava há tempos. A presença de tropas aliadas acentua a hesitação dos Estados Unidos e de outras potências ocidentais em intervir no conflito. Os EUA, marcados pelas intervenções fracassadas no Afeganistão e no Iraque, propõem o diálogo como única solução sensata.
Foto: AP
Março de 2013
As mortes beiram 100 mil, e o total de refugiados em países vizinhos como a Turquia e a Jordânia atinge 1 milhão – número que duplicaria até setembro. Em dois anos de guerra, o Ocidente e a Liga Árabe veem fracassar todas as tentativas de um governo de transição, enquanto o conflito transborda para a Turquia e o Líbano. O pior temor é de que Assad se mantenha no poder a todo custo.
Foto: Reuters/B. Khabieh
Abril de 2013
Há muito Assad alega estar combatendo terroristas. Mas só no segundo ano de guerra se confirma que o Exército Livre Sírio inclui extremistas radicais. O grupo Frente al-Nusra declara apoio à Al Qaeda, fragmentando ainda mais a oposição.
Foto: Reuters/A. Abdullah
Junho de 2013
A Casa Branca afirma ter provas de que Assad está atacando civis com o gás tóxico sarin. Mais tarde a informação é corroborada pela ONU. A partir da revelação, o presidente dos EUA, Barack Obama, e outros líderes ocidentais passam a considerar uma intervenção militar. No entanto a proposta da Rússia para que se retirem as armas químicas da Síria acaba por se impor.
Foto: Reuters
Janeiro de 2014
Ao fim de 2013 surgem relatos sobre um novo grupo autodenominado Estado Islâmico do Iraque e do Levante – o futuro EI. Ao tomar terras no norte da Síria e também no Iraque, os jihadistas despertam lutas internas na oposição, causando 500 mortes até o início de janeiro. Esse terceiro e inesperado fator levaria os EUA, França, Arábia Saudita e outras nações à intervir na guerra em meados do ano.