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Tensões no Oriente Médio reaproximam Alemanha e Rússia

Emily Sherwin | Christoph Hasselbach pv
10 de janeiro de 2020

Enquanto EUA e Irã trocam farpas – e mísseis – na região, Merkel e Putin organizaram um encontro em Moscou. Mas uma mudança de equilíbrio no Oriente Médio pode forçar Berlim a confiar em russos, na busca por soluções.

Chanceler federal da Alemanha, Angela Merkel, ao lado do presidente da Rússia, Vladimir Putin
Angela Merkel e Vladimir Putin em Paris, 10/12/2019Foto: Reuters/C. Platiau

A visita oficial a Moscou da chanceler federal da Alemanha, Angela Merkel, não poderia ocorrer num momento mais dramático. Só na segunda semana de 2020, o Irã e os Estados Unidos se atacaram em solo iraquiano, o governo iraniano anunciou a saída do acordo nuclear e a Turquia enviou tropas à Líbia.

Certamente, motivos suficientes para o presidente russo, Vladimir Putin, convidar Merkel ao Kremlin para um encontro neste sábado (11/01). Os conflitos entre Irã e EUA estarão no topo da agenda da reunião, e ambos também discutirão sobre a Líbia, Síria e Líbano, segundo seus respectivos porta-vozes.

Tradicionalmente Alemanha e Rússia possuem laços econômicos profundos e, entre os líderes da Otan e da Europa, Merkel tem sido uma visita bem-vinda em Moscou. O papel da Rússia na crise da Ucrânia e a anexação da península da Crimeia pela Rússia em 2014, no entanto, causaram sérias cisões entre os dois países, que ainda não curaram.

Divididos pela Ucrânia, reunidos por Trump

Contudo o analista Alexander Baunov, observador político do Centro Carnegie de Moscou, afirma que "a Ucrânia deixou de ser tão tóxica" para as relações entre Moscou e Berlim. Ele aponta os recentes progressos na resolução da crise na Ucrânia sob o novo presidente Volodimir Zelenski como indicador de um degelo político.

Merkel e Putin podem ter se afastado devido à crise na Ucrânia, mas estão se reaproximando "pela unilateralidade e imprevisibilidade das ações dos EUA", prossegue, citando como exemplo as sanções americanas contra o gasoduto russo-alemão Nord Stream 2 em 2019 e a recente decisão do presidente dos EUA, Donald Trump, de mandar assassinar o comandante militar iraniano Qassim Soleimani.

O Ministério do Exterior da Rússia classificou as ações dos EUA contra Soleimani como "imprudentes", enquanto o porta-voz do órgão homólogo alemão, Rainer Breul, ressaltou que Berlim não teve acesso a "informações que nos permitissem crer que o ataque dos EUA foi ancorado em leis internacionais".

Em 7 de janeiro, Putin (esq.) fez uma rara visita a Damasco e conversou com o presidente sírio Bashar al-AssadFoto: Reuters/SANA

Analistas russos afirmaram que, após as ações americanas, Merkel e Putin agora compartilham o objetivo de impedir uma nova escalada de combates no Oriente Médio.

"A Rússia está interessada em garantir que o que está ocorrendo no Oriente Médio não tenha consequências mais amplas e sangrentas", explica Andrei Ontikov, especialista em Oriente Médio. A Alemanha e o resto da Europa podem desempenhar um papel positivo em medidas que diminuam as tensões na região, "portanto é claro que a Rússia precisa coordenar suas políticas, inclusive com a Europa".

Embora Putin possa usar o encontro com Merkel para apresentar uma frente unida com a Alemanha e posicionar a Rússia como força mediadora no Oriente Médio, Berlim também tem refletido em como aproveitar ao máximo a influência do chefe de Estado russo no Oriente Médio.

A influência da Rússia na região aumentou desde que ela decidiu participar da guerra na Síria, em 2015. As forças russas estão lutando ao lado do Irã para apoiar o presidente sírio Bashar al-Assad, visto em Moscou como um garante da contínua influência russa no Oriente Médio. Putin também tem se coordenado estreitamente sobre a Síria com o presidente da Turquia, Recep Tayyip Erdogan.

Em entrevista à DW, o encarregado de política externa do Partido Verde alemão, Omid Nouripour, disse duvidar da influência do Kremlin no Irã. "Putin finge que tem influência. Então, espero que a premiê alemã o force a convencer os iranianos a não tomarem medidas retaliatórias." Segundo Nouripour, uma retaliação iraniana levaria a um incremento de violência na região.

Por sua vez, retratando os EUA como parceiro não confiável, principalmente após a decisão de Trump de deixar o acordo nuclear com o Irã em 2018, o Kremlin tenta constantemente convencer a Alemanha e a Europa a estreitarem os laços com a Rússia. Desde a saída americana, a Alemanha e a Rússia têm pressionado para salvar o acordo, até mesmo após o abandono do Irã, no último domingo.

Multidão se despede de Qassim Soleimani em Teerã. Morte de general promete aumentar tensões no Oriente MédioFoto: picture-alliance/AP Photo/E. Noroozi

Negociações de paz em Berlim

Moscou e Berlim também intercederam pelo fim do conflito na Líbia. Os combates nas cidades de Trípoli e Sirte aumentaram recentemente, à medida que o Exército Nacional da Líbia, baseado no leste do país e sob o comando do ex-general Khalifa Haftar, avança contra forças leais ao Governo do Acordo Nacional, a administração provisória da Líbia. Berlim tem alertado que a situação pode se tornar "uma segunda Síria".

A Alemanha se ofereceu para sediar uma conferência de paz entre as partes conflitantes. As negociações de Berlim podem ocorrer nas próximas semanas, embora uma data ainda não tenha sido definida.

Jürgen Hardt, porta-voz para política externa do partido de Merkel, a União Democrata Cristã (CDU), comentou que, se a conferência realmente for realizada, seria um "grande sucesso diplomático". Ele disse esperar que Merkel dê ênfase à iniciativa em seu encontro em Moscou, pois "ainda temos um longo caminho a percorrer antes de progredir".

Na quarta-feira, Putin emitiu uma declaração conjunta com Erdogan em que expressa apoio à conferência de paz na Alemanha, embora os líderes tenham dito que resultados só poderiam ser alcançados "com o envolvimento e o compromisso dos líbios e dos países vizinhos".

Os dois líderes também pediram um cessar-fogo a partir de domingo. Moscou nunca deixou oficialmente claro de que lado está no conflito líbio, embora tenha havido relatos da mídia de que mercenários russos estariam lutando ao lado do ex-general Haftar. No início do ano, a Turquia envidou tropas para apoiar o governo provisório líbio apoiado pela ONU.

Para a Alemanha, o encontro em Moscou pode mostrar quanta influência diplomática Merkel realmente possui em relação à Líbia e ao Oriente Médio. De acordo com Fyodor Lukianov, do Conselho de Assuntos Internacionais da Rússia, Putin está claramente no comando das negociações na região: "A Alemanha tem sido um agente passivo, um observador à margem. A Rússia, por outro lado, é um ator importante no Oriente Médio."

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