Teste de DNA lança luz sobre o que matou Beethoven
23 de março de 2023
Quase 200 anos depois, análise de fios de cabelo do compositor alemão revela que infecção por hepatite B e predisposição genética a cirrose podem ter causado doença grave no fígado tida como provável causa da morte.
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O compositor alemão Ludwig van Beethoven (1770-1827) aparentemente tinha uma predisposição genética para cirrose hepática. Isso é o que constatou uma equipe de pesquisadores internacionais que analisou fios de cabelo do mestre da música preservados como lembrança em coleções públicas e privadas na Europa e nos Estados Unidos.
Desde sua morte, há quase 200 anos, cientistas tentam juntar as peças do histórico médico de um dos maiores expoentes da música clássica ocidental, oferecendo uma variedade de explicações possíveis para seus muitos problemas de saúde. Agora, com os avanços na tecnologia de DNA, eles conseguiram lançar luz sobre o que estaria por trás de sua morte prematura aos 56 anos, em Viena.
"Não podemos dizer com certeza do que Beethoven morreu, mas pelo menos agora podemos comprovar a existência de um risco hereditário significativo de cirrose hepática e de uma infecção pelo vírus da hepatite B", disse Johannes Krause, do Instituto Max Planck de Antropologia Evolutiva.
Contraída nos últimos meses de vida de Beethoven, a infecção por hepatite B, aliada à predisposição genética e a um consumo crônico de álcool, pode ter levado à doença hepática grave tida como a mais provável causa do óbito, afirma o estudo publicado nesta quarta-feira (22/03) pela revista Current Biology.
Genoma decodificado com base em cinco mechas de cabelo
Em busca de pistas sobre os problemas de saúde que atormentavam Beethoven, cientistas se prontificaram a realizar um sequenciamento genético do compositor. Para isso, foram usadas madeixas correspondentes aos últimos sete anos de sua vida.
Das oito amostras disponíveis, apenas cinco foram tidas como "autênticas com uma certeza quase absoluta", vindas de um mesmo homem europeu. A autenticidade de outras três mechas não pôde ser comprovada. Testes anteriores em uma delas sugeriam um envenenamento por chumbo, mas o novo estudo concluiu que a amostra pertencia a uma mulher.
Depois de limpar o cabelo de Beethoven, mecha por mecha, os cientistas dissolveram os fios em uma solução e retiraram fragmentos de DNA, conta Tristan James Alexander Begg, antropólogo biológico da Universidade de Cambridge e um dos autores do estudo.
Teste de DNA sugere relação extraconjugal na família de Beethoven
A pesquisa também levou a uma descoberta surpreendente: ao testarem o DNA de parentes distantes de Beethoven que vivem atualmente na Bélgica, os cientistas descobriram uma discrepância nos cromossomos Y que são transmitidos pelo lado paterno. Os cromossomos Y de cinco homens testados combinavam entre si, mas não combinavam com os do compositor.
"Ao combinar dados de DNA e documentos de arquivo, fomos capazes de identificar uma discrepância entre as genealogias legais e biológicas de Ludwig van Beethoven", disse o genealogista Maarten Larmuseau, da Universidade Católica de Leuven.
Isso sugere que houve pelo menos um filho ilegítimo na linha paterna direta de Beethoven nas gerações anteriores ao nascimento dele. Ou, em outras palavras, uma criança nascida de uma relação extraconjugal na árvore genealógica do compositor.
Begg, da Universidade de Cambridge, disse não ser possível descartar que o próprio Beethoven fosse ilegítimo. "Não estou defendendo esta tese", enfatizou. "Estou simplesmente dizendo que é uma possibilidade e que devemos considerá-la."
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Incertezas sobre causas da surdez permanecem
Segundo a Universidade de Bonn, que também participou das pesquisas, ainda há muitas incertezas sobre o estado de saúde do músico. É sabido que Beethoven foi acometido por uma perda auditiva progressiva entre os 25 e 29 anos, ficando surdo de fato em 1818. Ele também sofria de problemas gastrointestinais crônicos. O novo estudo, porém, não conseguiu determinar as causas de tais problemas de saúde.
Também participaram do estudo a Beethoven-Haus, de Bonn, e outras instituições dos EUA (Beethoven Center de San Jose, American Beethoven Society e FamilyTreeDNA).
Quem foi Ludwig van Beethoven?
O que distinguiu o mestre compositor? Qual dos seus trabalhos marcou a história da música? Como ele era? Conheça melhor o grande compositor alemão que completaria 250 anos em 2020.
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O gênio musical
Ainda criança, Ludwig van Beethoven (1770-1827) era um prodígio. Dizem que seu pai, que queria fazer dele um segundo Mozart, tinha métodos de aprendizado bastante rigorosos. Ludwig tocou seu primeiro concerto aos sete anos. Suas primeiras composições, aos 12. A genialidade só seria evidenciada em obras posteriores, por extrapolarem padrões conhecidos até então, e que continuam inspirando até hoje.
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Estrela já em seu tempo
Hoje, Beethoven é um dos compositores mais ouvidos e interpretados do mundo. Ele já era famoso em vida, o que não era o caso de outros músicos excepcionais de seu tempo. Pense, por exemplo, no triste destino de Mozart, que foi enterrado num túmulo anônimo. Por outro lado, 20 mil pessoas assistiram ao funeral de Beethoven - metade da população do centro da cidade de Viena na época.
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Primeiro artista freelancer
Nos períodos barroco e pré-clássico, compositores como Bach, Haydn ou Händel normalmente eram empregados da corte de um príncipe ou rei - ou em uma igreja. Mas com Beethoven não foi assim: ele conseguiu montar um círculo de mecenas que o apoiavam financeiramente com regularidade. Além disso, ganhava dinheiro com os concertos e a publicação de composições.
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Gênio respeitado
Sua obra ainda é fonte constante de inspiração para os músicos. Seus trabalhos incluem nove sinfonias, cinco concertos para piano, o concerto para violino, 16 quartetos de cordas, 32 sonatas para piano, a ópera "Fidelio", a Missa em dó maior op. 86 e a Missa solemnis op. 123. Seus cadernos com manuscritos meticulosos foram preservados, pois Beethoven costumava desenhar e anotar suas ideias.
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A fatídica "Quinta"
Ta-ta-ta-taaaa. Quatro notas sem melodia – ultrajante para a época! Hoje, é sinônimo de Beethoven, e a "Sinfonia do Destino" é uma das obras eruditas mais tocadas. No entanto, na sua estreia, em 1808, a "Sinfonia nº 5 em dó menor, opus 67" não foi bem recebida: os sons incomuns deixaram o público perplexo. Além disso, a orquestra havia ensaiado muito pouco e o teatro não estava aquecido.
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O clássico: "Para Elisa"
Uma música que cativa há 200 anos: seja em filme, em espera de telefone, como toque, no elevador ou caminhão de gás. "Para Elisa" é uma das peças de piano mais populares do mundo. Não está claro até hoje quem era Elisa. Beethoven se apaixonou muitas vezes, geralmente sem reciprocidade. Ele nunca teve esposa ou família. A obra pode ter sido dedicada à cantora de ópera Elisabeth Röckel.
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A insuperável "Nona"
As sinfonias são feitas para a interpretação por uma orquestra. Para cantores até então não havia lugar no palco. Como Beethoven não se importava muito com convenções, ele inventou algo novo em sua nona e última sinfonia. Assim, no último movimento, não há apenas cantores, mas também um coral. Parte da "Sinfonia n° 9 em ré menor, op. 125, Coral" tornou-se o hino oficial da União Europeia em 1972.
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Além da surdez
É inimaginável: um compositor que já não ouve a própria música. Os problemas auditivos de Beethoven começaram antes mesmo de ele fazer 30 anos. Isso ameaçou não só a sua carreira, mas também a sua vida social. Durante um tratamento em 1802, ele até teve pensamentos de suicídio. Mas o amor pela música o trouxe de volta - seguiram-se 25 anos altamente produtivos.
Beethoven nasceu em Bonn, onde teve as suas primeiras atuações, incentivadores e mentores. Hoje, Bonn se considera A cidade de Beethoven, com o museu Casa de Beethoven e seu amplo arquivo, e o festival anual Beethovenfest. Aos 22 anos, Ludwig mudou-se para Viena, onde encontrou inúmeros apoiadores. Aqui ele também teve aulas de composição com Joseph Haydn. Beethoven morreu em Viena em 1827.