Tomada de Palmira pelo EI gera preocupação internacional
21 de maio de 2015
Organizações alertam para riscos à segurança da população e à preservação de ruínas milenares que formam importante patrimônio histórico. Triunfo jihadista também aumenta pressão sobre governo Sírio e aliados ocidentais.
Anúncio
A tomada da cidade síria de Palmira por militantes do "Estado Islâmico" (EI) despertou preocupação internacional. Além da ameaça à segurança da população local, organizações alertaram nesta quinta-feira (21/05) para o risco que a presença dos jihadistas representa à preservação de ruínas milenares, um importante patrimônio cultural localizado a poucas centenas de metros da cidade.
A diretora-geral da Unesco, Irina Bokova, disse que os combates em Palmira colocam "um dos locais mais significativos do Oriente Médio e sua população civil em perigo". Já a chefe da diplomacia da União Europeia, Federica Mogherini, destacou que "assassinatos em massa e destruição deliberada de patrimônio arqueológico e cultural na Síria e no Iraque equivalem a crimes de guerra".
A vitória dos jihadistas sobre as tropas sírias consolida um momento triunfante para o grupo terrorista, que agora ocupa mais da metade do território sírio. A conquista de Palmira aumenta a pressão não apenas sobre o governo em Damasco, mas também sobre os Estados Unidos e aliados, cuja estratégia de combate aos terroristas aposta basicamente em ataques aéreos. Há poucos dias, o EI tomara a cidade iraquiana de Ramadi.
Nesta quinta-feira, a Casa Branca admitiu que as tomadas de Palmira e de Ramadi são um revés para as forças da coalizão que lutam contra o EI. No entanto, segundo o porta-voz Josh Earnest, o presidente Barack Obama continua contrário ao envio de militares para lutar contra os jihadistas em solo.
Palmira fica situada na região central da Síria, próxima a campos de petróleo e importantes rodovias do país, que ligam a cidade de Homs a Damasco. Palmira foi a primeira cidade síria tomada pelos jihadistas diretamente das mãos da Forças Armadas sírias e seus aliados.
População deixa a cidade
Cerca de um terço dos 200 mil habitantes de Palmira deixaram a cidade nos últimos dias, em meio a combates entre soldados leais ao presidente Bashar al-Assad e insurgentes do EI. Segundo o Observatório Sírio dos Direitos Humanos, os jihadistas já ocupam metade do território sírio – mas boa parte dele é formada por desertos e não é habitada.
Os tesouros arqueológicos de Palmira
Ruínas dessa antiga cidade são testemunhas de tempos de glória e uma importante herança cultural. Elas estão ameaçadas pela guerra civil na Síria e pela presença do "Estado Islâmico".
Foto: picture-alliance/dpa/Scholz
Ruínas de um passado glorioso
No meio do deserto da Síria ficam as ruínas da antiga cidade de Palmira, que em tempos passados floresceu graças ao comércio. Por centenas de anos, caravanas de comerciantes passaram pela cidade, seguindo a chamada Rota da Seda, que ia até a China. Quando os tempos áureos viraram história, as areias do deserto acabaram tomando conta a cidade.
Foto: Fotolia/bbbar
Templo de Bel
Esta construção foi erguida para um grande deus mesopotâmio. No primeiro século depois de Cristo, os habitantes de Palmira construíram um tempo em estilo romano para a divindade Bel. O custo da obra teria sido arcado pelos romanos, em agradecimento pela adesão da cidade ao Império Romano. As paredes do templo carregam marcas de balas, resultado da guerra civil na Síria.
Foto: picture-alliance/blickwinkel/F. Neukirchen
Caminho das preciosidades
Esta avenida marcada por colunas tem quase um quilômetro de extensão e foi construída no século 2. Na entrada está o Arco de Adriano, erguido em homenagem ao imperador romano. O estilo greco-romano estava na moda na época, com alguns arabescos orientais. Pela estrada eram transportados temperos, perfumes, pedras preciosas e outros tesouros.
Foto: Louai Beshara/AFP/Getty Images
Monumento em estilo romano
Este tetrápilo fica num cruzamento de ruas. São quatro nichos cobertos, cada um deles formado por quatro colunas de granito rosa, extraído das pedreiras da cidade egípcia de Assuã. Antigamente, os nichos abrigavam estátuas. Quase todas as colunas foram reconstituídas. Apenas uma é original.
Foto: Fotolia/waj
Deus do vento
O deus do vento se chamava Baal-Shamin. De fato, o templo dele foi menos deteriorado pelas tempestades de areia do que os templos fúnebres localizados no outro extremo da avenida das colunas. Acredita-se que o templo tenha sido construído pelos fenícios, que posteriormente ocuparam a região. Não se sabe ao certo, porém, quando exatamente ele foi construído.
Foto: picture-alliance/dpa/Scholz
Dramas orientais
Palmira tinha muitas características de uma cidade greco-romana: as colunas, as termas e também o anfiteatro. No palco dele, que era a fachada de um palácio, eram encenados dramas orientais. As peças, escritas em aramaico, se perderam. O teatro também era usado como palco de lutas de gladiadores e de animais.
Foto: picture-alliance/dpa/M. Marczok
Fórum da classe alta
Estas colunas da ágora, o espaço público central da cidade, ostentavam 200 estátuas que homenageavam as figuras mais poderosas da elite de Palmira. Na parte sudoeste da ágora estão as ruínas de uma construção que possivelmente serviu para as reuniões do conselho da cidade. Dele faziam parte as mais influentes famílias de comerciantes, aquelas que definiam os rumos de Palmira.
Foto: picture-alliance/Robert Harding World Imagery/C. Rennie
Túmulos luxuosos
Do lado de fora da cidade há vários mausoléus. Famílias importantes construíam torres altas, com espaço para os mortos de várias gerações. As últimas moradas de alguns representantes dessas famílias são sarcófagos ricamente ornamentados. Há ainda diversos sepulcros subterrâneos, adornados com afrescos. As sepulturas são um testemunho do cotidiano e das riquezas dos tempos áureos.
Foto: Imago/A. Schmidhuber
Ameaçada pela guerra
No século 3, Palmira se tornou uma base militar. A queda da rainha Zenóbia deu origem a uma reviravolta no poder. Os tempos áureos ficaram para trás, o brilho da cidade começou a ser apagado pela areia. Desde 2001, as ruínas sofrem as consequências da guerra civil na Síria. A nova ameaça são os jihadistas do "Estado Islâmico".
Foto: picture-alliance/dpa/Scholz
9 fotos1 | 9
Segundo essa ONG baseada em Londres, estima-se que 462 pessoas morreram nos conflitos que antecederam à retirada das tropas sírias da região. Destas, 241 eram militares sírios e 150, combatentes do EI. Os demais eram civis.
Em Palmira, os jihadistas assumiram o controle de modernas instalações militares e de um presídio, onde já libertaram vários presos. Um vídeo amador divulgado na internet mostra militantes do EI, supostamente no presídio de Palmira, queimando uma foto gigante do presidente sírio, Bashar al-Assad.
A porta-voz da agência de Direitos Humanos da ONU, Ravina Shamdasani, disse que, segundo informações do governo sírio, o EI estaria batendo "de porta em porta" em Palmira em busca de pessoas ligadas ao governo. Ao menos 17 civis teriam sido executados nesta semana pelos jihadistas. Muitos foram decapitados.
"Queda de uma civilização"
Segundo o criador do Observatório Sírio dos Direitos Humanos, Rami Abdulrahman, os combatentes do "Estado Islâmico" teriam chegado ao sítio arqueológico da antiga cidade de Palmira nesta quinta-feira, cedo da manhã, mas não há informações sobre atos de destruição no local.
Organizações internacionais temem que o local, famoso por suas colunas romanas erguidas há 2 mil anos, tenha o mesmo destino de cidades históricas destruídas pelos terroristas no Iraque.
As ruínas foram declaradas Patrimônio da Humanidade pela Unesco. A agência das Nações Unidas descreve o local como um cruzamento entre o Império Romano, a Índia, a China e a Pérsia antiga e um testemunho da diversidade da herança cultural da humanidade.
O responsável pelo patrimônio histórico da Síria, Mamoun Abdulkarim, disse ter perdido as esperanças após a conquista dos terroristas. "Essa é a queda de uma civilização. A sociedade civilizada perdeu a batalha contra a barbárie", declarou.
MSB/rtr/dpa/ap
"Estado Islâmico" tenta apagar história
Militantes do EI estão destruindo artefatos culturais de milhares de anos no Iraque. O estrago foi condenado mundo afora e fez o Iraque pedir ajuda internacional.
Foto: Mohammad Kazemian
Acabando com o patrimônio
Militantes do "Estado Islâmico" (EI) saquearam e destruíram estátuas em museus de Mossul, no norte do Iraque. Acredita-se que as relíquias pertenciam à antiga civilização mesopotâmica. Os jihadistas, que tomaram grande parte do Iraque e da Síria, afirmam que sua interpretação do islã exige que as estátuas e artefatos culturais sejam destruídos. Muitos estudiosos do islã condenam a ação do grupo.
Estas são as ruínas de Hatra, construída há 2 mil anos pelo Império Selêucida, que controlava grande parte do mundo antigo. Segundo relatos, militantes do EI trouxeram escavadeiras para destruir a cidade. "A luta deles é por identidade, querem destruir a região, principalmente o Iraque, e seus patrimônios da humanidade", disse o ministro do Turismo do Iraque, Adel Shirshab.
Os membros do grupo militante também destruíram parte de Nínive, antiga cidade no norte do Iraque, considerada o berço da civilização por muitos arqueólogos ocidentais. "Já era esperado que o EI a destruísse", disse o ministro do Turismo iraquiano aos jornalistas. A ONU classificou a destruição de "crime de guerra".
"O céu não está nas mãos dos iraquianos. Por isso, a comunidade internacional tem que tomar uma atitude", disse o ministro do Turismo do Iraque ao pedir ataques aéreos contra os extremistas do EI. Bagdá afirmou que os militantes do EI estão desafiando "a vontade do mundo e os sentimentos de humanidade".
Os militantes do EI afirmam que as esculturas antigas entram em contradição com sua interpretação radical dos princípios do islã, que proíbem a adoração de estátuas. E quando os jihadistas não as estão destruindo, estão lucrando com elas. Especialistas afirmam que o grupo está faturando no mercado internacional com a venda de estátuas menores, enquanto as maiores são destruídas.
Estudiosos costumam comparar a destruição do patrimônio cultural por parte do EI à demolição dos Budas Gigantes de Bamiyan, pelos talibãs afegãos, em 2001. Hoje, há somente um espaço vazio onde as grandes estátuas ficavam. Entretanto, alguns temem que o estrago causado pelo EI às ruínas da antiga civilização mesopotâmica, pioneira da agricultura e da escrita, possa ser ainda mais devastador.