Torcidas alemãs silenciam em protesto contra novas regras de segurança
3 de dezembro de 2012Durante duas rodadas, torcedores da Alemanha conseguiram proporcionar um clima estranho nos estádios de futebol do país. Os primeiros 12 minutos e 12 segundos da maioria das partidas da Bundesliga (campeonato de futebol da primeira divisão) desta semana foram jogados frente a uma plateia quase totalmente silenciosa. Essa foi a maneira que as torcidas encontraram para protestar contra um catálogo de novas medidas de segurança, feito pelas autoridades da Liga Alemã de Futebol (DFL, na sigla em alemão), entidade promotora do torneio.
No jogo de sábado entre Bayer Leverkusen e Nürnberg, alguns dos torcedores ainda abandonaram o BayArena nos primeiros momentos de jogo, retornando às arquibancadas após 12 minutos. Durante esse período, tudo o que se podia ver na área tradicionalmente ocupada pelos torcedores mais apaixonados eram faixas de protesto, uma das quais dizia: "É isso que você quer? Nosso caminho não vai acabar aqui. A cultura dos torcedores não vai virar uma lenda."
Os protestos causaram um efeito inquietante em campo, com os jogadores de repente conseguindo ouvir os gritos dos outros e o bater das chuteiras na bola ecoando das arquibancadas. "Achei horrível e estranho", disse o treinador do Frankfurt, Armin Veh, após o confronto de seu time com o Mainz, no sábado. "Os primeiros 12 minutos não tiveram o clima de Bundesliga", acrescentou o capitão do time, Pirmin Schwegler.
"Não há dúvida de que assim não tem graça", disse o técnico Thomas Tuchel, do Mainz. "O apoio dos torcedores é parte de tudo. É realmente estranho quando você sabe que o lugar está cheio, mas todo mundo está quieto."
Sem fogos de artifício
Os jogadores terão de suportar essa "tortura" por mais alguns jogos antes de o protesto acabar, em 12 de dezembro, quando os clubes devem sancionar as novas regras. Entre as propostas que mais provocam a revolta das torcidas estão a redução de ingressos para torcidas visitantes de 10% para 5% da capacidade total dos estádios, a extinção dos lugares em pé nos estádios, além da proibição de fogos de artifício e introdução de revistas sistemáticas para todos os torcedores nas entradas dos jogos.
Após dois dias de protestos, aos quais aderiram tanto os torcedores comuns como os mais radicais, chamados "ultras", as torcidas organizadas afirmam que a DFL agora é forçada a tomar uma atitude. "Basicamente, agora a DFL deve dizer 'estamos vendo que todos estão contra, por isso vamos tentar de novo dialogar'", afirmou Philip Markhardt, porta-voz da iniciativa 12:12 e da organização de torcedores Pro Fans. "Este plano vai causar uma profunda divisão entre os torcedores e a DFL."
Alguns clubes também manifestaram suas preocupações sobre o novo plano. O presidente do Hannover, Martin Kind, sugeriu o diálogo. "Queremos continuar o diálogo e repensar sobre se o 12 de dezembro deve ser mesmo o prazo final", comentou ao jornal Frankfurter Allgemeine. Ele também pediu aos torcedores que leiam as propostas, pois, segundo ele, elas foram elaboradas levando-se em consideração os interesses e a segurança dos torcedores.
Mas os torcedores acusam o novo catálogo de regras de ser o resultado da pressão política alimentada por reportagens que demonizam os fãs de futebol como "ultras", "vândalos" e "hooligans". Em entrevista à revista especializada em futebol Kicker, Thomas Weinmann, representante dos torcedores do Borussia Mönchengladbach, afirmou ter havido uma "extrema redução da violência" nos últimos anos. "Hoje, um jogo de futebol é um evento familiar", disse ele. "As crianças vêm ao estádio, as mulheres são muitas vezes um terço do público. A atmosfera nos estádios é ótima, e, na maioria das vezes, pacífica", argumentou.
Ainda assim, essa imagem está em desacordo com as últimas manchetes, como as que apareceram após o jogo de sexta à noite, entre Fortuna Dusseldorf e Frankfurt Eintracht, onde 98 pessoas foram presas durante confrontos entre torcedores fora do estádio do Fortuna. Apesar disso, uma campanha, chamada "I Feel Safe", foi iniciada por torcedores em outubro, reunindo mais de 57 mil assinaturas, em um esforço para convencer as autoridades de que a violência no futebol não é tão grave como pensam.
Bilhetes baratos
Os torcedores argumentam que vão perder muito com as novas medidas. Para Jan-Henrik Gruszecki, porta-voz da torcida organizada do Dortmund, as novas medidas causarão danos reais, porque podem destruir um detalhe que faz com que muitos europeus tenham inveja da Bundesliga: a cultura de torcida. Ele argumenta que em um campeonato onde não há ricos e oligárquicos proprietários de clubes vindos do estrangeiro, a cultura futebolística tem uma posição privilegiada e deve ser preservada.
"Se os bilhetes para as torcidas visitantes são reduzidos, e se, eventualmente, eles até extinguem os lugares em pé nos estádios, então teremos condições como as que tivemos nos primeiros 12 minutos de hoje", disse Gruszecki à agência de notícias DPA. "Eu não acho que nenhum jogador ou cartola deseja isso."
Weinmann acrescenta que acabar com os lugares de pé "será um desastre. Pense no exemplo da Inglaterra. Sem áreas de pé, determinados grupos sociais seriam marginalizados. Se os preços de um assento são o dobro, logo muitas pessoas vão deixar de ir aos jogos de futebol."
Mas o diretor-executivo da Bundesliga, Christian Seifert, garante que esse não é o objetivo das novas medidas. "Valorizamos a cultura de torcidas que temos", disse Seifert ao jornal britânico The Observer. "Somos a última das grandes ligas com lugares em pé, e ninguém quer tocar nessas áreas. Os clubes estão empenhados em oferecer muitos bilhetes baratos, porque é considerado muito importante na Alemanha que as pessoas que não têm muito dinheiro possam vir ao estádio."
Mas Seifert, também faz uma advertência velada aos fãs, dizendo que se nenhum tipo de acordo for alcançado, os políticos podem entrar em cena. "Há uma ameaça muito real, caso não resolvamos os problemas que temos, de que os políticos nos exijam que tenhamos só assentos, sem lugares de pé, o que poderia levar a um aumento nos preços", disse. Em outras palavras, os torcedores devem aceitar este acordo, sob o risco de terem que engolir uma solução pior.
Autor: Ben Knight (md)
Revisão: Francis França