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Previsibilidade

13 de janeiro de 2011

Subordinação à especulação imobiliária e aos interesses da indústria da construção civil, e negligência do governo na construção de habitações sociais são causas da tragédia no Rio de Janeiro, diz professor da UFRJ.

Destruição nas ruas de TeresópolisFoto: AP

A dimensão humana da tragédia provocada pelas chuvas no estado do Rio de Janeiro é mostrada também na Europa, nas imagens de rios que se abriram em encostas e da busca e resgate das vítimas. Até a tarde desta quinta-feira (13/01), haviam sido contabilizados mais de 350 mortos e as chuvas persistiam.

O grande volume de água provocou deslizamentos de terra nas cidades serranas de Teresópolis, Nova Friburgo e Petrópolis. O governador do estado, Sérgio Cabral, declarou que recursos estão sendo providenciados para a reconstrução dos municípios – importantes centros turísticos – que sofreram "em função de uma força da natureza, combinada com ocupação irregular do solo".

"Com todo respeito ao governador, essa é uma declaração absolutamente tola. A culpa pelas tragédias desse tipo não é da natureza. (...) Não existem tragédias naturais, só existem tragédias sociais, que se resumem na forma em como a sociedade organiza a ocupação e sua relação com o ambiente", contesta Carlos Vainer, especialista em planejamento urbano e professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro.

As cidades mais afetadas têm em comum o fato de se localizarem em áreas montanhosas, na cadeia da Serra do Mar. Segundo pesquisadores, a região sofre há décadas com ocupação ilegal e irresponsável. O próprio governador teria culpado as prefeituras por não coibirem as construções em áreas de risco.

Tragédia anunciada

No início de 2010, a imprensa mundial acompanhou o resgate dramático de centenas de corpos em morros onde casas, e mesmo bairros inteiros, foram soterrados pela lama. "Esta é a crônica da tragédia anual anunciada", lamenta Vainer.

Para Rubem Cesar Fernandes, presidente da organização não governamental Viva Rio, mais do que a presença do estado, a participação civil também é fundamental. "Embora seja um fenômeno recorrente, a sociedade brasileira não tem uma cultura de prevenção arraigada. O estilo de ocupação é muito informal, ela é espontânea, sem controle, sem orientação de políticas públicas."

Mais uma vez, fica comprovada a inexistência de política de controle de ocupação. "E quando a tragédia vem, não temos uma cultura de pronta resposta. É como se o governo fosse responsável por tudo. A defesa civil não é bem equipada, em geral, para enfrentar o tamanho do problema. É preciso uma revolução cultural", reivindica Rubem Cesar.

Ao lado do poder público, escolas, igrejas, associações de moradores e organizações locais precisariam participar mais desse trabalho de prevenção e de convencimento das pessoas sobre os riscos que enfrentam ao construir ilegalmente, sugere o presidente da Viva Rio.

Imagem aérea mostra região de deslizamento em TeresopólisFoto: AP

Subordinação e negligência

Sob a ótica do especialista Carlos Vainer, trata-se de uma questão histórica. Para ele, dois fatores determinam a distribuição do espaço urbano no Rio de Janeiro: a subordinação da cidade à especulação imobiliária e aos interesses da indústria da construção civil, "e a negligência total do governo na construção de habitações de interesse social".

"Devido à falta de habitações para a população pobre, essas pessoas se dirigem a áreas de grande inclinação sujeitas a desmoronamentos", ressalta Vainer.

Nesse episódio recente, entretanto, alguns bairros ricos e condomínios fechados, como na cidade de Petrópolis, foram intensamente atingidos. "E isso mostra a negligência do poder público ao ser condescendente com a especulação imobiliária e autorizar projetos que não poderiam ter sido licenciados. Mas os interesses fundiários e da indústria da construção civil falam mais alto".

O pesquisador ressalta ainda outra questão polêmica. "As mortes, toda essa tragédia, não são provocadas pela falta de recursos. Dinheiro tem. Ele só está sendo gasto de forma errada, desproporcional."

Autora: Nádia Pontes
Revisão: Roselaine Wandscheer

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