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Triungo e vergonha

9 de junho de 2010

Oitenta anos de história separam a primeira Copa do Mundo, realizada no Uruguai em 1930 com poucas equipes e o grande público quase excluído, do evento na África do Sul, cujos 32 times serão assistidos de todo o planeta.

Heróis alemães do 'milagre de Berna' em 1954Foto: picture-alliance/ dpa
Gol da vitória do Uruguai na final contra a Argentina em 1930Foto: PA/dpa

Durante muito tempo, os Jogos Olímpicos funcionavam como o principal torneio de futebol do mundo até a criação da Copa do Mundo em 1930. O primeiro campeão mundial de futebol foi decidido no Uruguai, num evento com dimensões bem menores que as dos espetáculos atuais.

Treze equipes apresentaram-se na capital Montevidéu, palco de todos os jogos da competição. Sete dos times eram sul-americanos e - por motivos financeiros, logísticos ou políticos - os melhores europeus ficaram em casa, inclusive a Alemanha. O primeiro título foi para o anfitrião Uruguai, que venceu a Argentina por 4 a 2. A final foi realizada sob um rígido esquema de segurança, com controle de armas brancas e de fogo antes do apito inicial.

Estreia alemã

Alemanha vence a Bélgica por 5 a 2 nas oitavas de 1934Foto: Sportbild Schirner/DHM

O segundo Mundial foi realizado na Itália em 1934. Desta vez, a Alemanha estava entre os 16 times participantes - três a mais do que na Copa do Uruguai. Como na competição anterior, o anfitrião levou o título. Na prorrogação da final, os italianos venceram por 2 a 1 a Tchecoslováquia, que havia eliminado a Alemanha por 3 a 1 na semifinal. Na disputa pelo terceiro lugar, os alemães ganharam dos austríacos por 3 a 2. Mas a estreia aparentemente promissora dos alemães não foi suficiente para garantir que o êxito continuasse.

Em 1938, Adolf Hitler ordenou a formação de uma seleção austro-alemã para competir no Mundial da França. A equipe foi eliminada logo na primeira rodada, derrotada justamente pela pequena Suíça. Mais uma vez, a Itália ficou em primeiro lugar.

Em decorrência da Segunda Guerra, a Copa do Mundo deixou de ser realizada durante 12 anos. Apenas em 1950, a competição foi organizada novamente no Brasil. A Alemanha ainda não havia sido reaceita como membro da Federação Internacional de Futebol (FIFA) e ficou de fora do Mundial. O Uruguai comemorou o título pela segunda vez.

O "milagre de Berna"

Helmut Rahn comemora o terceiro gol contra a Hungria em 1954Foto: AP

Nove anos após o fim da Guerra, a seleção da Alemanha Ocidental elevou a auto-estima nacional com a vitória na Copa de 1954, realizada na Suíça. Em 4 de julho, o time treinado por Sepp Herberger enfrentou a favorita Hungria no estádio Wankdorf, em Berna. Os húngaros saíram na liderança por 2 a 0, mas os alemães conseguiram o empate ainda antes do intervalo.

Aos 39min do segundo tempo, Helmut Rahn marcou o gol da vitória por 3 a 2 e resgatou a felicidade há muito esquecida no país. Já na época, o capitão Fritz Walter dizia que "provavelmente se passarão horas ou dias até que consigamos compreender a grandiosidade deste acontecimento". É possível que ainda mais tempo tenha sido necessário.

A Alemanha era campeã mundial pela primeira vez – resultado que, porém, não seria repetido nas duas Copas seguintes. Em 1958, o fim da linha foi a semifinal contra a anfitriã Suécia e, em 1962, no Chile, a derrota veio já nas quartas, contra a Iugoslávia. O Brasil de Pelé e Garrincha ficou com a dobradinha do título.

O mais famoso (não-) gol da história do futebol

Gol ou não? Árbitro confirma e ajuda seleção inglesaFoto: AP

Em 1966, a seleção alemã chegava pela segunda vez à final da Copa. O adversário daquele 30 de julho era a anfitriã Inglaterra, no estádio de Wembley. Depois do tempo normal de jogo, o placar era de 2 a 2. Finalmente, aos 11 minutos da prorrogação, foi marcado o lendário gol de Wembley: Geoff Lust chutou no canto inferior do travessão e a bola quicou de volta ao campo.

Depois de hesitar brevemente e trocar olhares com o auxiliar Tofiq Bahramov, o árbitro Gottfried Tor confirmou o gol. Os ingleses marcaram mais uma vez e, com a vitória por 4 a 2, receberam seu único título mundial até hoje.

Em 1970, no México, o time alemão conseguiu pelo menos uma pequena revanche. Nas quartas de final, derrotou a Inglaterra na prorrogação, por 3 a 2. A semifinal contra a Itália ficou conhecida como "jogo do século", no qual a Alemanha perdeu de 4 a 3 ao final da prorrogação. O prêmio de consolação foi o terceiro lugar, depois de ganhar do Uruguai por 1 a 0. O Brasil foi campeão.

O segundo título alemão

Jogando em casa, os alemães comemoraram em 1974 sua segunda vitória no Mundial. Na final em Munique, a seleção da Alemanha Ocidental provou sua superioridade com a vitória por 2 a 1 contra a Holanda. O time começou em desvantagem já aos 2min, mas virou o jogo ainda antes do intervalo, com gols de Paul Breitner e Gerd Müller. Para o capitão Franz Beckenbauer, o resultado foi consequência da tática holandesa após o gol inicial: "Eles recuaram e ficaram no contra-ataque. Nós tomamos o meio-campo e dominamos o jogo".

Gerd Müller marcou o gol da vitória no 2 a 1 contra a Holanda em 1974Foto: picture-alliance/dpa

Em geral, o time alemão teve um excelente desempenho na competição. Sofreu apenas uma derrota, justamente contra a Alemanha Oriental, perdendo de 1 a 0 no último jogo da primeira fase, em Hamburgo. Jürgen Sparwasser foi o autor do gol histórico.

Atuações vergonhosas

Austríacos comemoram o segundo gol dos 3 a 2 em 1978Foto: pa / dpa

Em 1978, triunfou a anfitriã Argentina. A Alemanha foi eliminada na segunda rodada, perdendo por 3 a 2 contra a Áustria, no jogo conhecido como "humilhação de Córdoba".

Em 1982, na Espanha, veio a "vergonha de Gijon", em que novamente alemães e austríacos estavam envolvidos. A Argélia havia vencido, dias antes, o último jogo do grupo. Para avançar, bastava à Alemanha e à Áustria uma vitória alemã com pequena diferença de gols. Depois de os alemães marcarem logo no início da partida, os dois times pararam de atacar e a Argélia foi então eliminada.

Em consequência desse pacto de não-ataque, os últimos jogos de cada grupo passaram a ser disputados simultaneamente, e é assim até hoje.

Também vergonhosa foi a atuação do goleiro Toni Schumacher na semifinal. Ele cometeu uma falta tão violenta contra o francês Patrick Battiston, que o jogador chegou a ficar inconsciente, sofrer uma concussão cerebral e perder dois dentes. O time alemão chegou sem chance alguma à final contra a Itália, perdendo por 3 a 1.

Outra vez vice

Maradona e o técnico Bilardo após a conquista do título em 1986Foto: dpa

Na final da Copa de 1986, no México, a Alemanha foi derrotada por 3 a 2 pela Argentina. O que, mesmo assim, foi um sucesso, já que, durante a competição, o time alemão sofrera com desavenças e indisciplina. O goleiro Uli Stein, por exemplo, fora mandado para casa mais cedo, depois de insultar o técnico Franz Beckenbauer.

Já o argentino Diego Maradona entrou para a história do esporte durante as quartas-de-final contra a Inglaterra. O jogador marcou o primeiro dos dois gols da vitória com a mão, à qual se referiu depois como a "mão de Deus".

O triunfo de Roma

Alemanha comemora o tri sob o comando do técnico Beckenbauer em 1990Foto: dpa / picture-alliance.com

A Alemanha recebeu seu terceiro título mundial na Copa de 1990, sediada na Itália. Assim como na competição anterior, o adversário final foi a Argentina. Mas desta vez, a Alemanha levou a melhor, graças a Andreas Brehme. O zagueiro marcou o pênalti que garantiu a vitória por 1 a 0. Enquanto jogadores e torcedores festejavam após o apito final, Franz Beckenbauer compunha uma das cenas mais marcantes desta Copa: à parte do tumulto, o técnico dava a volta no estádio olímpico de Roma, perdido nos próprios pensamentos.

O dedo do meio de Effenberg

Os dois Mundiais após a vitória alemã em Roma foram decepções esportivas. Em 1994, nos Estados Unidos, a Alemanha fracassou nas quartas-de-final contra a Bulgária. Stefan Effenberg foi suspenso da competição depois de mostrar o dedo do meio ao público que vaiava.

Outro momento inglório: Diego Maradona foi condenado por uso de drogas e impedido de jogar. Já o Brasil se tornou campeão mundial pela quarta vez.

Hooligans alemães agrediram policial francês em 1998Foto: AP

Em 1998, na França, os anfitriões ficaram com o título. A Alemanha foi eliminada nas quartas-de-final, após a derrota contra a Croácia por 3 a 0. Na cidade de Lens, hooligans alemães agrediram brutalmente o policial francês Daniel Nivel, escrevendo assim o capítulo mais obscuro da história do futebol alemão. A agressão lhe causou uma deficiência física irreversível.

Na Copa de 2002, realizada na Coreia do Norte e no Japão, a final em Yokohama foi um clássico: Brasil e Alemanha. Os brasileiros venceram por 2 a 0 e estabeleceram um recorde ao se tornarem campeões pela quinta vez.

Conto de verão

Em 2006, a Alemanha sediou a Copa do Mundo com o lema oficial "O mundo entre amigos". Apesar de os jogos não terem sido de alto nível, o calor e o clima de festa fizeram do campeonato um evento inesquecível.

O time alemão contribui para tal feito, especialmente durante as quartas-de-final contra a Argentina, quando o goleiro Jens Lehmann se tornou um herói durante a cobrança de pênaltis. O papel em que Lehmann havia escrito a "cola" com os cantos preferidos dos argentinos nos 11 metros está hoje em um museu da cidade de Bonn.

Mas, à euforia da vitória que levou o país à semifinal, seguiu a decepção da derrota contra a Itália. A Alemanha terminou seu "conto de fadas de verão" em terceiro lugar. A Itália se tornou campeã após a final contra a França, que será lembrada sobretudo pela cabeçada de Zinédine Zidane contra Marco Materazzi.

Agora, capítulos inéditos da história das Copas do Mundo serão escritos na África do Sul.

Autor: Torsten Ahles (lpf)
Revisão: Rodrigo Rimon

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