"Trump é desqualificado para ser presidente", diz biógrafo
18 de novembro de 2016Desde 1988, o jornalista investigativo e Prêmio Pulitzer David Cay Johnston acompanha a carreira do bilionário Donald Trump. Após diversas publicações sobre política tributária e econômica, ele lançou em agosto de 2016 a biografia The making of Donald Trump (A fabricação de Donald Trump, em tradução literal).
Tamanho aprofundamento não contribuiu para que o jornalista, republicano registrado, formasse uma opinião elogiosa do presidente eleito americano. Pelo contrário: Johnston diz considerá-lo um "ditador" e "enganador", sem a menor consideração pelos cidadãos que o elegeram.
Em entrevista à DW, o ex-repórter do New York Times é taxativo: "Trump é claramente desqualificado para ser presidente dos Estados Unidos." Segundo ele, devido a sua "psique frágil e imatura", esse "campeão do narcisismo" representa "uma grave ameaça para o mundo".
DW: O senhor é citado por ter dito que "de jeito nenhum" Donald Trump venceria a eleição presidencial. Como pôde se enganar tanto?
David Cay Johnston: Eu lamento. Todos os dados das pesquisas de opinião na época sugeriam que Hillary Clinton conquistaria o voto popular de maneira decisiva – o que, de fato, ela fez. A declaração do diretor do FBI sobre os e-mails dela, 11 dias antes das eleições, a prejudicou seriamente. E muito mais eleitores da classe operária branca compareceram às urnas do que se esperava, gente que acreditava que Trump aliviaria a situação econômica deles. Eles engoliram o embuste dele de que os culpados são os chineses, os mexicanos e "aquele idiota na Casa Branca". E que só ele, Trump, está capacitado a consertar isso.
O senhor previu uma crise constitucional, e que Trump será submetido a impeachment no prazo de um ano.
Trump não sabe nem qual é a descrição do cargo do presidente – o executivo que realiza a vontade do Congresso. Mas ele fala como um ditador. Ele disse que ordenará aos militares que matem as mulheres e crianças das famílias daqueles que ele acredita serem terroristas. Isso seria crime, e os militares de alto escalão rejeitarão tais ordens. Então eles seriam destituídos, ou aconteceria algum outro problema. Trump não tem respeito pela Constituição. Lembre: ele até disse que não aceitaria uma derrota.
Para sermos justos, o tom do discurso de vitória e da entrevista dele no 60 Minutes, da CBS, foi um pouco mais moderado. E durante a visita à Casa Branca ele parecia respeitoso, até modesto. Tendo ganhado, claro, ele pode soar razoável e ler declarações que outros escreveram para ele.
Mas ele está prestes a entrar numa incrível panela de pressão, onde vai ficar sabendo de segredos que não pode revelar, por questões de segurança nacional. Ele será criticado pelo que faz ou deixa de fazer. Donald Trump não está psicologicamente equipado para lidar com isso.
O senhor prevê que as atividades empresariais de Trump interferirão nos deveres dele como presidente?
Esse é um aspecto realmente importante. Presidentes anteriores mandaram colocar suas ações e títulos de crédito num fideicomisso cego [blind trust]. Autoridades oficiais têm permissão de vender seus papéis sem pagar impostos sobre ganho de capital.
Os negócios primários de Donald Trump envolvem relações contratuais de longo prazo com potentados do Oriente Médio, oligarcas russos e outras empresas por todo o mundo. As leis não exigem divulgação total. Isso tem implicações tremendas para a segurança nacional e a corrupção. Como saberemos se uma decisão que ele tome não é para evitar a falência de um de seus negócios no estrangeiro? Isso requer um escrutínio realmente muito rigoroso.
Como alguém que vem seguindo Trump há décadas, quais são suas maiores preocupações com a presidência dele?
Donald Trump é manifestamente desqualificado para ser presidente dos Estados Unidos. Ele é um campeão mundial de narcisismo, que está convencido da própria superioridade genética e grandeza.
Por toda a vida, ele tem fraudado trabalhadores, pequenos negociantes e investidores. Ele também tem associações de longa data com a máfia americana, gangues russas, trapaceiros, vigaristas, criminosos violentos e um traficante de cocaína confesso. Ele acha que pode aprender em 90 minutos tudo o que se precisa saber sobre mísseis.
Todas essas coisas juntas, especialmente a psique frágil e imatura dele, representam uma grave ameaça para o mundo. Não consigo ver como isso não vá acabar mal. Mas se ele se revelar um grande presidente, vou ser a primeira pessoa a dizer: "Cara, como eu pude me enganar tanto."