Trump afirma que apoiará entrada do Brasil na OCDE
19 de março de 2019
Presidente americano diz que vai fazer lobby pelo Brasil na organização e promete privilégios militares similares aos recebidos pelos aliados na Otan. Bolsonaro concorda em abrir mão de tratamento especial na OMC.
Anúncio
Ao receber Jair Bolsonaro na Casa Branca nesta terça-feira (19/03), o presidente americano, Donald Trump, afirmou que os dois países "nunca estiveram tão próximos" e disse que apoiará a inclusão do Brasil na Organização para a Cooperação e Desenvolvimento (OCDE).
Empresários e investidores que apostam em Bolsonaro esperavam que Trump apoiasse a entrada do Brasil na organização – algo rejeitado pelos EUA até agora e que o governo brasileiro esperava garantir nesta viagem. A adesão à OCDE tem potencial de atrair investimentos para o país. Um grupo seleto de 36 países, a maioria considerados desenvolvidos, compõe a organização.
O Brasil formalizou em 2017 um pedido para aderir à OCDE, mas o processo de análise de solicitações do tipo pode levar anos, e Bolsonaro quer agilizá-lo com o apoio dos EUA.
Segundo afirmou o ministro da Economia, Paulo Guedes, ao jornal Folha de S. Paulo, como contrapartida ao apoio à inclusão do Brasil na OCDE os EUA exigem que o Brasil abra mão de receber um tratamento especial na Organização Mundial do Comércio (OMC).
Como parte dos países-membros da OMC que se declaram em desenvolvimento, o Brasil tem direito a maiores prazos para cumprir acordos e maior flexibilidade em negociações comerciais.
Guedes afirmou que a contrapartida foi exigida pelo representante de comércio dos EUA, Robert Lighthizer. "Mas não tem essa troca, ele que está fazendo essa demanda", disse Guedes à Folha.
Um comunicado em conjunto, divulgado pelo Itamaraty após o encontro, contestou, porém, a declaração de Guedes. O documento afirma que Bolsonaro está disposto a abrir mão do tratamento diferenciado na OMC.
"Bolsonaro concordou que o Brasil começará a abrir mão do tratamento especial e diferenciado nas negociações da Organização Mundial do Comércio, em linha com a proposta dos Estados Unidos", ressalta o comunicado.
Em entrevista, Bolsonaro disse que o apoio dos EUA ao ingresso do Brasil na OCDE "será entendido como um gesto de reconhecimento".
Criada em 1994 para zelar pelo livre-comércio, a OMC organiza e supervisiona o comércio internacional, por meio de regras compulsórias, e resolve conflitos entre os países-membros. Porém, a organização está em crise e vem perdendo relevância – algo que ficou evidente com a falta de ação do órgão diante do conflito comercial travado entre EUA e China.
Ao se encontrar com Bolsonaro, Trump também afirmou que avaliará "muito a sério" a ideia de dar ao Brasil privilégios militares similares aos recebidos pelos aliados dos Estados Unidos na Otan.
Trump se referia à possibilidade de que os EUA passem a considerar o Brasil como aliado militar estratégico fora da organização, um status especial que abre caminho para o repasse de materiais de defesa excedentes e para a organização de treinamentos conjuntos.
Os dois presidentes confirmaram que o tema foi um dos assuntos tratados na reunião no Salão Oval. Na entrevista coletiva subsequente, Trump chegou a mencionar a possibilidade de o Brasil ser um membro de fato da Otan, mas admitiu que teria "que falar com muitas pessoas" para que isso acontecesse.
A Argentina é o único país latino-americano que alcançou até agora o status de aliado militar estratégico de fora da Otan, concedido a 17 países.
"Sempre fui um grande admirador dos EUA, e minha admiração aumentou com a chegada do senhor [Trump] à Presidência", afirmou Bolsonaro. "Neste dia selamos uma aliança promissora entre as duas maiores democracias das Américas."
O encontro em Washington não trouxe novidades sobre a questão venezuelana - outro tema abordado entre os dois líderes. Trump e Bolsonaro mostraram sintonia ao descreverem as mazelas do povo venezuelano, e o americano admitiu que todas as possibilidades estão em discussão, inclusive a militar. A ala militar do governo brasileiro é contrária a uma intervenção.
“Eu sei exatamente o que quero que aconteça na Venezuela. Nós temos opções diferentes sobre a Venezuela, vamos conversar sobre elas. Todas as opções estão sobre a mesa. É uma vergonha o que está acontecendo na Venezuela", afirmou Trump.
A reunião no Salão Oval teve a presença do deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), além dos dois intérpretes. O filho do presidente brasileiro chegou a ser elogiado durante a entrevista coletiva por Trump, que pediu que ele se levantasse para ser visto pelas pessoas presentes.
O presidente americano disse se sentir "honrado" pelas comparações feitas entre ele e Bolsonaro – apelidado pela imprensa internacional de "Trump dos trópicos". O assessor de segurança nacional dos EUA, John Bolton, chegou a afirmar que, dadas as semelhanças entre os dois líderes, Trump deveria ser agora chamado de "o Bolsonaro da América do Norte".
Durante o encontro na Casa Branca, Trump e Bolsonaro trocaram camisas oficiais das seleções de futebol dos dois países.
LPF/efe/afp/rtr/abr/ots
______________
A Deutsche Welle é a emissora internacional da Alemanha e produz jornalismo independente em 30 idiomas. Siga-nos noFacebook | Twitter | YouTube
As visitas de presidentes brasileiros aos Estados Unidos
Relembre como foram as principais visitas de presidentes do Brasil aos Estados Unidos após a redemocratização do Brasil nos anos 1980.
Foto: Public Domain/Ronald Reagan Presidential Library & Museum/White House
Setembro de 1986: Sarney visita Reagan
Além de se reunir com Ronald Reagan, José Sarney proferiu um discurso ao Congresso. Os líderes discutiram a crise do endividamento internacional e a recusa do Brasil em assinar um acordo formal com o Fundo Monetário Internacional (FMI). Outro tema foi a manutenção pelo Brasil da reserva de mercado para produtos de informática, mesmo com possíveis sanções pelos EUA. Pelé também estava na comitiva.
Foto: Public Domain/Ronald Reagan Presidential Library & Museum/White House
1990-1992: visitas entre Collor e Bush
Os dois presidentes se encontraram duas vezes em 1990: em setembro, Fernando Collor esteve com George H. W. Bush durante a Assembleia Geral da ONU e, em dezembro, o americano visitou Collor e ainda discursou ao Congresso brasileiro. Em junho de 1991, o brasileiro visitou Bush nos EUA e, em junho de 1992, Bush teve um encontro com o brasileiro durante a Conferência Rio-92.
Abril de 1995: FHC visita Clinton
Fernando Henrique Cardoso e Bill Clinton abordaram um dos principais atritos entre os países: a aprovação da Lei de Patentes. Os EUA ameaçavam com sanções se o projeto não passasse. O texto chegou a ser aprovado em fevereiro de 1996, mas nos moldes como queriam os americanos. FHC repetiu ainda uma demanda brasileira existente até hoje: ser membro permanente do Conselho de Segurança da ONU.
FHC participou de uma reunião nas Nações Unidas sobre o combate ao tráfico de drogas e ficou hospedado em Camp David, a casa de campo da Presidência americana. Ele teve um encontro informal com Clinton, que cumprimentou FHC pela boa resposta brasileira à turbulência financeira asiática. Os dois líderes conversaram ainda sobre a paz no Oriente Médio e a estratégia de combate às drogas.
Foto: Imago/Zumapress/S. Farmer
Maio de 1999: FHC visita Clinton
Em Washington, FHC participou de vários encontros com governantes e empresários para convencê-los de que o pior da crise econômica já havia passado e afirmou que seu governo tentaria impedir outras no futuro. Com Clinton, FHC insistiu que era necessário buscar mecanismos financeiros que protegessem o país de ataques especulativos e de prejuízos provocados pela volatilidade de capitais.
Foto: picture-alliance/AP Photo/S. Walsh
Abril de 2001: FHC visita Bush
Na visita, o país desistiu de selar um acordo com os EUA sobre o início da Área de Livre Comércio das Américas (Alca. O revés de última hora ocorreu após o Departamento de Estado enviar a alguns países um memorando defendendo o ano de 2003 – em contraponto ao acordo fechado entre Brasília e Washington de começar a Alca em 2005. O documento esvaziou a visita de FHC.
Foto: Getty Images/M. Wilson
Novembro de 2001: FHC visita Bush
FHC e George W. Bush tiveram na Casa Branca uma conversa amigável, porém, morna. Ambos falaram sobre terrorismo, prejuízo do protecionismo às nações em desenvolvimento, economia da Argentina e a criação de um Estado palestino. FHC reforçou ainda o desejo do Brasil de ter um assento permanente no Conselho de Segurança da ONU. Depois, o brasileiro foi para Nova York abrir a Assembleia Geral da ONU.
Foto: Getty Images/AFP/S. Thew
Junho de 2003: Lula visita Bush
O encontro terminou sem resultados concretos. O Brasil chegou a prometer que cooperaria para concluir com êxito a Alca até 2005 e a pedir o apoio de Washington para ter um assento permanente no Conselho de Segurança da ONU – dois assuntos que não avançaram. Eles também discutiram a paz no mundo e Lula disse que ela só seria alcançada se os países ricos ajudassem os mais pobres a se desenvolverem.
Foto: picture-alliance/dpa/S. Thew
Março de 2007: visitas entre Lula e Bush
No início do mês, Bush e Lula assinaram em Guarulhos/SP um memorando para a cooperação no desenvolvimento da tecnologia de biocombustíveis e prometeram diminuir a dependência do petróleo e de outros combustíveis fósseis não renováveis em seus países. No final de março, Lula foi recebido em Camp David (foto) para discutir o etanol como commodity mundial e a retomada da Rodada Doha, da OMC.
Foto: Getty Images/R. Sachs-Pool
Março de 2009: Lula visita Obama
No seu primeiro encontro, os dois presidentes anunciaram a criação de um grupo de trabalho para a reunião do G20, que aconteceu no mês seguinte em Londres, para buscar uma estratégia comum para enfrentar, na época, a crise econômica mundial, aumentar a confiança no sistema financeiro e recuperar as economias afetadas pelo maior crash vivido pelo mundo desde a década de 1930.
Foto: picture-alliance/dpa/M. Reynolds
Abril de 2012: Dilma visita Obama
Dilma Rousseff mostrou preocupação com a depreciação das moedas dos países ricos em consequência das políticas monetárias deles para conter a crise, dizendo que esse desequilíbrio afeta todas as nações, principalmente as emergentes. Barack Obama disse que a relação dos dois países "nunca esteve mais forte" e discutiu com a brasileira temas como narcotráfico, intercâmbio estudantil e combustíveis.
Foto: Carolyn Kaster/AP Photo/picture alliance
Junho de 2015: Dilma visita Obama
A reunião marcou a superação de um imbróglio diplomático depois de documentos da Agência de Segurança Nacional (NSA) vazados por Edward Snowden mostrarem que os EUA também espionavam Dilma. Por causa do escândalo, ela chegara a cancelar uma visita de Estado a Obama em outubro de 2013. No encontro de 2015, Dilma tentou atrair investimentos, prometeu reduzir a poluição e aumentar o reflorestamento.
Foto: Getty Images/C. Somodevilla
Março de 2019: Bolsonaro visita Trump
Foi a primeira visita de Estado de Jair Bolsonaro – e a viagem foi bem-sucedida para o então presidente brasileiro. O fato de ele ter se encontrado com fiéis foi bem recebido entre seus eleitores evangélicos. Para militares e para a economia, ele conseguiu a promessa de Trump de apoiar o status de aliado preferencial na Otan e a entrada do Brasil na OCDE.
Foto: Allen Eyestone/ZUMAPRESS.com/picture alliance