Trump alerta Irã, Rússia e Síria contra ofensiva em Idlib
4 de setembro de 2018
Presidente dos EUA diz que aliados do regime sírio devem evitar uma "tragédia humana" no último bastião dos rebeldes no país árabe. Rússia diz que Casa Branca não tem "abordagem abrangente" para resolver crise.
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O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, alertou nesta terça-feira (04/09) a Síria, Rússia e Irã contra uma possível ofensiva do regime de Damasco contra o último bastião dos rebeldes sírios na província de Idlib, no noroeste do país assolado por uma guerra civil desde 2011.
"Os russos e os iranianos estariam cometendo um grave erro humanitário ao participar dessa potencial tragédia humana. Centenas de milhares de pessoas poderiam ser assassinadas. Não deixem que isso aconteça!", escreveu Trump no Twitter, alertando que o presidente sírio, Bashar al-Assad, não deve "atacar de modo imprudente" a província.
O alerta surgiu em meio a uma visita não anunciada do ministro iraniano do Exterior, Mohammad Javed Zarif, a Damasco, onde se reuniu com Assad antes da iminente ofensiva contra os insurgentes. Forças sírias se acumulam ao redor da província, numa suposta preparação para o ataque.
A ONU e organizações de ajuda humanitária afirmaram que uma operação militar em Idlib poderia gerar uma catástrofe humanitária em escala ainda não vista durante a guerra civil na Síria. Oficiais da ONU acreditam que uma ofensiva a Idlib desencadearia uma onda de deslocamento que poderia desenraizar cerca de 800 mil pessoas, além de desencorajar refugiados a voltarem para casa.
Cerca de 3 milhões de pessoas vivem em Idlib e nas áreas em volta da cidade – quase metade desses habitantes já se deslocaram mais de uma vez por causa do conflito civil.
A Rússia e o Irã, entretanto, insistem que os grupos extremistas na província devem ser eliminados. Ambos os países deverão apoiar uma provável ofensiva do regime sírio na região.
O porta-voz do Kremlin, Dmitry Peskov, reiterou a posição da Rússia nesta terça e chamou Idlib de "um ninho de vespas terrorista". Sobre o tuíte de Trump, Peskov afirmou que alertas como este não levam em consideração o "potencial perigoso e negativo" do enclave dominado pelos rebeldes e mostram que a Casa Branca não tem "uma abordagem abrangente" para resolver a crise síria.
Teerã e Moscou vêm fornecendo apoio militar, político e financeiro para o regime de Assad durante o conflito que já causou mais de 350 mil mortes e deixou milhões de refugiados.
Aviões de guerra russos bombardearam pontos na área rural da província de Idlib, segundo informações divulgadas nesta terça-feira por um porta-voz dos rebeldes e também pelo Observatório Sírio de Direitos Humanos, sediado no Reino Unido. Segundo a ONG, os jatos russos realizaram 30 ataques em 16 áreas no triângulo formado pelo oeste de Idlib, a Planície de Al-Ghab e o nordeste da cidade portuária de Latakia.
Já a Turquia enviou tanques à província de Hatay, na fronteira com a Síria, segundo informações da agência estatal turca Anadolu. O Exército turco também enviou equipamento de construção para reforçar 12 dos seus postos de observação no noroeste da Síria, segundo informou a agência após os relatos dos ataques aéreos da Rússia.
Há meses a Turquia se empenha em esforços diplomáticos para evitar um ataque do governo sírio a Idlib.
A visita de Zarif a Damasco ocorreu poucos dias antes de um encontro de alto nível entre o Irã, a Rússia e a Síria para debater a guerra civil, que está para entrar em seu oitavo ano. Segundo um comunicado do governo sírio divulgado através do serviço de mensagens Telegram, o ministro iraniano discutiu com Assad "temas sobre a agenda do encontro tripartite" marcado para ocorrer em Teerã.
O secretário de Estado americano, Mike Pompeo, afirmou na semana passada que Washington vê qualquer ofensiva em Idlib como um agravamento da guerra na Síria. O Departamento de Estado alertou que os EUA responderão a qualquer ataque químico perpetrado por Damasco.
Desde 2017, o Irã, a Rússia, também aliada do regime sírio, e a Turquia, que apoia os rebeldes, intermedeia negociações baseadas em Astana, capital do Cazaquistão, que visam pôr fim ao conflito sírio. No ano passado, Idlib foi denominada uma "zona de inversão da escalada da violência", onde o fim da violência poderia abrir caminho para a preparação de um cessar-fogo em todo o país.
O que se iniciou com protestos pacíficos em 2011 virou uma guerra civil brutal que já matou centenas de milhares de pessoas e fez milhões de refugiados. Reveja os principais acontecimentos.
Foto: Reuters/Stringer
2011: O início
Em 15 de março de 2011, protestos pacíficos contra a detenção de jovens acusados de fazer pichações antigoverno em sua escola, na cidade de Daraa, são reprimidos por forças de segurança, que abrem fogo contra manifestantes desarmados, matando quatro. Os protestos continuam por vários dias, fazendo 60 mortos e se espalham por todo o país. Segue-se um período de repressão violenta.
Foto: Anwar Amro/AFP/Getty Images
2011/2012: Isolamento internacional
O ex-presidente Barack Obama insta o presidente Bashar al-Assad a renunciar, e os EUA anunciam sanções a Assad em maio e congelam bens do governo sírio nos EUA em agosto de 2011. A União Europeia também anuncia sanções, em setembro. Em novembro, a Liga Árabe suspende a Síria e impõe sanções ao regime. Também a Turquia anuncia uma série de medidas, incluindo sanções, em dezembro.
Foto: AP
2012: Observadores internacionais desistem
Em dezembro de 2011, a Síria permite a entrada de observadores da Liga Árabe para monitorar a retirada de tropas e armas de áreas civis. A missão é suspensa em janeiro de 2012. Em fevereiro, os EUA fecham sua embaixada em Damasco. Em abril de 2012, chegam observadores da ONU, que partem dois meses depois por falta de segurança.
Foto: REUTERS
2013: Ataque com gás
Em março, um ataque com gás mata 26 pessoas, ao menos a metade deles soldados do governo, na cidade de Khan al-Assal. Investigação da ONU conclui que foi usado gás sarin. Em agosto, outro ataque com gás mata centenas em Ghouta Oriental, um subúrbio de Damasco controlado pelos rebeldes. A ONU afirma que mísseis com gás sarin foram lançados em áreas civis. Os EUA e outros países culpam regime sírio.
Foto: picture-alliance/AP Photo
2013: Destruição de armas químicas
Em agosto, investigadores da ONU chegam à Síria para averiguar o uso de armas químicas, em meio a denúncias de médicos e ativistas. EUA afirmam que 1.429 pessoas morreram num ataque, e Obama pede ao Congresso autorização para ação militar. Em setembro, o Conselho de Segurança da ONU ameaça usar a força e, em outubro, Damasco inicia a destruição de seu arsenal declarado de armas químicas.
Foto: AFP/Getty Images
2014: EUA atacam "Estado Islâmico"
Em setembro, os EUA iniciam ataques aéreos a alvos do "Estado Islâmico" na Síria. Em outubro, o mediador da ONU, Staffan de Mistura, começa a negociar uma trégua ao redor de Aleppo, mas o plano fracassa meses depois.
Foto: picture-alliance/AP Photo/V. Ghirda
2015: Rússia entra no conflito
Em setembro, a Rússia, que desde o início fornecera ajuda militar ao governo sírio nos bastidores, entra ativamente no conflito, bombardeando opositores do regime. A ajuda se mostra decisiva, e a guerra civil passa a pender para o lado de Assad, que nos meses seguintes recupera território perdido para os rebeldes.
Foto: Reuters/Rurtr
2016: Governo controla Aleppo
A ONU e a Opac afirmam que tanto militares sírios quanto o "Estado Islâmico" usaram gás em ataques a opositores. O ano é marcado por várias tentativas de tréguas. Em setembro, a cidade de Aleppo é alvo de 200 ataques aéreos por forças pró-Assad num fim de semana. Em dezembro, as forças governamentais assumem controle de Aleppo, encerrando quatro anos de domínio dos rebeldes.
Foto: Getty Images/AFP/G. Ourfalian
2017: Ataque em Idlib
Em fevereiro, Rússia e China vetam resolução do Conselho de Segurança da ONU pedindo sanções ao governo sírio pelo uso de armas químicas. Em abril, ao menos 58 pessoas morrem na província de Idlib, dominada pelos rebeldes, no que aparenta ser um ataque com gás. Testemunhas afirmam que o ataque foi executado por jatos sírios e russos, mas tanto Moscou quanto Damasco negam bombardeio.
Foto: Getty Images/AFP/O. H. Kadour
2017: Resposta dos EUA
Em abril, os EUA lançam dezenas de mísseis sobre a base militar de onde se acredita ter saído o ataque em Idlib. Em maio, o presidente Donald Trump aprova planos para armar combatentes das milícias curdas YPG na luta contra o "Estado Islâmico". A medida enfurece a Turquia, que vê as YPG como um grupo terrorista. Em outubro, o "Estado Islâmico" perde o controle de Raqqa, sua autoproclamada capital.
Em janeiro, aviões turcos bombardeiam a região curda de Afrin, dando início à operação contra as YPG intitulada "Ramo de Oliveira". A Turquia anuncia a morte de centenas de "terroristas", mas entre os mortos estão dezenas de civis, dizem ativistas. Em fevereiro, as milícias YPG chegam a acordo com o regime sírio para o envio de tropas pró-governo para auxiliar no combate aos turcos em Afrin.
Foto: picture alliance/AA/E. Sansar
2018: Ofensiva em Ghouta Oriental
Em 21 de fevereiro, tropas pró-regime executam ofensiva em larga escala contra enclave rebelde localizado ao leste de Damasco. Em torno de 400 mil civis ficam sitiados, com acesso limitado a alimentos e cuidados médicos. Os ataques matam centenas de pessoas. No dia 24 de fevereiro, o Conselho de Segurança da ONU aprova trégua humanitária de 30 dias vigente em todo o território sírio. Ela fracassa.
Foto: Reuters/B. Khabieh
2018: O bombardeio ocidental
Após dias de ameaça, em 14 de abril Trump anuncia o lançamento de mais de cem mísseis, em conjunto com França e Reino Unido, na Síria. O ataque é uma retaliação ao ataque químico na cidade de Duma, que matou dezenas de civis e que o Ocidente atribui ao regime de Bashar al-Assad.
Foto: picture-alliance/AP Photo/L. Matthews
2019: Estados Unidos começam a se retirar da Síria
Em janeiro de 2019, os Estados Unidos começaram a se retirar da Síria. O presidente americano afirmou que o Estado Islâmico havia sido derrotado e, por isso, a presença dos EUA não seria mais necessária. A decisão foi contestada dentro do próprio governo e também pelas milícias curdas na Síria, aliadas dos EUA, que temiam enfraquecer-se.
Foto: Getty Images/AFP/D. Souleiman
2019: fim do autoproclamado califado do EI
Em março de 2019, as Forças Democráticas Sírias (FDS), aliança liderada por curdos, anunciaram que o autoproclamado califado do Estado Islâmico foi totalmente eliminado, após combates em Baghouz, considerado o último reduto jihadista na Síria. Militantes curdos e árabes das FDS, apoiados pela coalizão internacional liderada pelos EUA, combatiam há várias semanas os jihadistas.