Presidente dos EUA anuncia sanções a cidadãos chineses e fim de vantagens comerciais ao território semiautônomo. China critica decisão, que chama de interferência em assuntos internos.
Anúncio
O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, anunciou nesta sexta-feira (29/05) que vai impor sanções a alguns cidadãos chineses e que ordenou ao governo americano que inicie o processo de eliminar as vantagens comerciais concedidas a Hong Kong, incluindo benefícios tarifários para exportações e um tratado de extradição.
As medidas fazem parte da resposta dos EUA à China, cujo parlamento aprovou nesta sexta-feira a polêmica lei de segurança nacional para Hong Kong, que, na opinião de Trump, "amplia o alcance do aparelho de segurança da China a um antigo reduto da liberdade". "Isso é uma tragédia para o povo de Hong Kong, o povo da China e o mundo", declarou Trump na Casa Branca.
Ele afirmou que assinará um decreto "para suspender a entrada de certos cidadãos estrangeiros da China" que os EUA "identificarem como riscos em potencial para a segurança". Além disso, prometeu que o governo americano desenvolverá alternativas para "sancionar os funcionários do governo da China envolvidos diretamente na erosão da autonomia de Hong Kong e na asfixia da liberdade" da região. "Nossas ações serão fortes, nossas ações serão significativas", anunciou.
Em resposta, a China considerou que a ação dos Estados Unidos interfere "grosseiramente" nos assuntos internos chineses e está "destinada ao fracasso", segundo um editorial do jornal People's Daily, porta-voz oficial do Partido Comunista Chinês.
"Este ato hegemônico de tentar interferir nos assuntos de Hong Kong e interferir grosseiramente nos assuntos internos da China não vai assustar o povo chinês e está destinado ao fracasso. Forçar a China a fazer concessões por meio de chantagem ou coação é ilusório. Só podem estar sonhando acordados", afirma o editorial do People's Daily.
Os EUA concederam vantagens comerciais a Hong Kong após a transferência do domínio britânico para a China, em 1997. A decisão de Trump implica a revogação do status especial de Hong Kong.
Críticos dizem que a votação de quinta-feira no Congresso Nacional do Povo para impor uma nova legislação de segurança em Hong Kong na prática acaba com a promessa de Pequim de manter as instituições civis, jurídicas e econômicas o território separadas, sob a estrutura de "um país, dois sistemas".
"A China substituiu sua fórmula prometida de um país, dois sistemas, por um país, um sistema", afirmou Trump. A nova lei proíbe "qualquer ato de traição, separação, rebelião, subversão contra o Governo Popular Central, roubo de segredos de Estado, a organização de atividades em Hong Kong por parte de organizações políticas estrangeiras e o estabelecimento de laços com organizações políticas estrangeiras por parte de organizações políticas de Hong Kong".
Ainda não está claro que impacto a decisão dos EUA terá sobre as empresas americanas que operam em Hong Kong ou sobre a posição da cidade como o principal centro financeiro da Ásia.
Pequim ainda não deu pormenores sobre quais medidas específicas serão adotadas em resposta, embora o editorial do People's Daily afirme que a China está preparada para fazer um "contra-ataque decidido".
Em Hong Kong, no sábado, a secretária de Justiça, Teresa Cheng, do governo pró-China, afirmou ser "completamente falso e errado dizer que o território está perdendo sua autonomia". "As autoridades centrais da China têm o direito absoluto de tomar medidas de segurança nacional em relação a Hong Kong. Qualquer Estado que tente usar coação ou qualquer outro meio com o objetivo de interferir no direito soberano de um Estado de aprovar sua própria lei de segurança nacional está, sem dúvida, infringindo o princípio de não intervenção sob o poder público e direito internacional e isso não é aceitável", disse Cheng.
Embate também com Londres
A China ameaçou também retaliar o Reino Unido depois de o governo britânico ter prometido aos cidadãos de Hong Kong maior acesso ao território britânico e até mesmo cidadania se o governo chinês levar adiante a controversa lei de segurança nacional na região semiautônoma.
Na quinta-feira, o secretário do Exterior, Dominic Raab, disse que se Pequim não voltar atrás, Londres vai mudar as condições associadas ao passaporte britânico no exterior, emitido para os residentes de Hong Kong antes de o território ter sido devolvido à China, em 1997, tornando-o mais favorável e incluindo um caminho para a cidadania.
Atualmente, esse passaporte só permite uma permanência de seis meses no Reino Unido, um limite que seria eliminado para permitir que os portadores do passaporte britânico no exterior procurassem trabalho ou estudassem no país por períodos prorrogáveis de 12 meses. Cerca de 350 mil pessoas seriam beneficiadas com a mudança.
Na sexta-feira, a secretária do Interior, Priti Patel, disse que a medida seria ampliada para todas as pessoas em Hong Kong que podem requisitar um passaporte britânico, ou cerca de 2,9 milhões de pessoas.
Duas décadas depois de Hong Kong retornar ao domínio chinês, predomina entre muitos moradores a insatisfação com a ingerência de Pequim e o desejo por mais democracia.
Foto: Reuters/D. Martinez
1997 - Devolução à China
Após 156 anos de domínio britânico, Hong Kong era devolvida à China exatamente à zero hora de 1º de julho de 1997. Soldados do Exército de Libertação Popular içaram a bandeira chinesa, em sinal de supremacia sobre a antiga colônia britânica. O contrato para a devolução já havia sido assinado em 1984.
Foto: Reuters/D. Martinez
1998 - Ameaça de crise econômica
A crise financeira asiática de 1997-98 levou economias emergentes a impor controles comerciais ou à compra de ativos para tranquilizar investidores. Hong Kong surpreendeu o mercado em agosto de 1998 com uma intervenção de 15 bilhões de dólares para se defender de ataques especulativos. Os apoiadores da iniciativa dizem que isso salvou a cidade.
Foto: Reuters/L. Chan
1999 - Reagrupamento de famílias
As esperanças de um rápido reagrupamento das famílias separadas pela fronteira foram logo destruídas. Embora a Suprema Corte de Hong Kong tivesse concedido amplos direitos de residência, o governo chinês derrubou a decisão a pedido do governo de Hong Kong. Na foto, mais de cem visitantes da China continental protestaram para obter permissão de residência imediata em Hong Kong.
Foto: Reuters/B. Yip
2000 - Sucesso com a bolha
Em fevereiro de 2000, investidores entraram numa fila diante do banco HSBC para comprar ações da empresa Tom.com. Ao se lançar na bolsa de valores, a empresa – que existia apenas na internet – do bilionário Li Ka-shing conseguiu angariar quase 100 milhões de dólares pouco antes de estourar a bolha "dot-com".
Foto: Reuters/B. Yip
2001 - Conflito com grupo espiritual
Seguidores do movimento espiritual Falun Gong protestam regularmente em Hong Kong desde que o grupo foi banido pela China em 1999, sob a acusação de divulgar superstições e manipular as pessoas psicologicamente. Em 2002, 16 seguidores foram condenados por causa de protestos diante da representação da China em Hong Kong. A Suprema Corte do território reverteu metade das sentenças.
Foto: Reuters/K. Cheung
2002 - Famílias desesperadas
A questão das autorizações de residência acirrou-se em 2002, quando Hong Kong começou a deportar 4 mil chineses continentais que haviam perdido batalhas legais para residir no território. Houve protestos dos solicitantes e de seus apoiadores. Na foto, parentes de migrantes chineses depois de terem sido expulsos de um parque no centro de Hong Kong.
Foto: Reuters/K. Cheung
2003 - Nas mãos de um vírus
A Sars, uma doença viral semelhante à gripe, atingiu Hong Kong de tal forma que, em março de 2003, a Organização Mundial da Saúde a declarou uma pandemia. Até a cidade ser considerada livre da doença, em junho, 299 pessoas morreram, entre elas Tse Yuen-man. A médica de 35 anos esteve entre os primeiros voluntários a cuidar de pacientes com Sars. Em seu funeral, ela recebeu as mais altas honras.
Foto: Reuters/B. Yip
2004 - Frustração com Pequim
Centenas de milhares de pessoas participaram de protestos no sétimo aniversário da devolução à China. Pequim descartou o sufrágio universal em Hong Kong em 2007 ou 2008 e continuou freando as reformas políticas. Além disso, a China decretou que o governo de Pequim precisa aprovar qualquer alteração no direito de voto em Hong Kong, o que praticamente elimina qualquer aspiração democrática.
Foto: Reuters/B. Yip
2005 - Violência em protestos
Reuniões da Organização Mundial do Comércio regularmente são alvos de protestos dos adversários da globalização. Em Hong Kong, no final de 2005, não foi diferente. A polícia usou canhões de água e gás lacrimogêneo contra os manifestantes.
Foto: Reuters/L. Jae-Won
2006 - Conflito com o Japão
A China e o Japão disputavam um grupo de ilhas desabitadas. Acreditava-se que perto delas houvesse reservas de petróleo e de gás. Em outubro, um barco com ativistas de um comitê para defender as ilhas Diaoyi e que tem base em Hong Kong se aproximou 20km da ilha principal até ser interceptado por um barco de patrulha japonês.
Foto: Reuters/P. Yeung
2007 - Preservar a história
Um píer da era colonial tornou-se pivô de nova polêmica. O governo queria removê-lo para recuperar terras e construir estradas. Ativistas furiosos que consideravam o píer um local histórico lutaram pela sua preservação. O embate atingiu seu ponto alto em agosto, quando a polícia removeu um acampamento de ativistas e pessoas em greve de fome que já durava três meses. Em 2008, o píer foi demolido.
Foto: Reuters/P. Yeung
2008 - Morar em gaiolas
Terrenos cada vez mais caros tornaram os aluguéis impagáveis para muitas pessoas em Hong Kong. Milhares de moradores passaram a viver em gaiolas, onde dispunham de cerca de 1,4 m2. Em geral, um cômodo tem oito dessas caixas de arame. Em 2017, estima-se que 200 mil pessoas vivam assim ou disponham de apenas uma cama em apartamentos divididos.
Foto: Reuters/V. Fraile
2009 - Contra o esquecimento
Moradores de Hong Kong vestidos de preto e branco fizeram uma vigília no 20º aniversário da violenta repressão aos manifestantes pró-democracia na Praça da Paz Celestial em Pequim em 1989. O Victoria Park, no centro de Hong Kong, transformou-se num mar de velas.
Foto: Reuters/A. Tam
2010 - Projetos indesejados
Crescia em Hong Kong a insatisfação devido à falta de democracia e o fato de o governo não ter de prestar contas. As raiva coletiva é descarregada em forma de protestos contra os planos do governo de construir um trajeto para trens de alta velocidade ligando Hong Kong ao continente. O projeto ferroviário, não implementado até hoje, previa a destruição de um vilarejo.
Foto: Reuters/B. Yip
2011 - Protestos com papel
Um controverso projeto de lei que eliminou o mecanismo de eleições suplementares para o Conselho Legislativo gerou vários dias de protestos em frente ao prédio do conselho. Centenas de manifestantes jogaram aviões de papel com mensagens políticas contra o prédio.
Foto: Reuters/B. Yip
2012 - Desafios da administração
Leung Chun-ying (à esquerda) presta juramento como chefe de governo da região administrativa especial, diante do então presidente chinês, Hu Jintao. Ele prometeu mais democracia e moradias mais acessíveis. Apesar de medidas de contenção, os preços continuaram subindo, e as reformas políticas ainda estão emperradas. Leung Chun-ying não concorreu a um novo mandato.
Foto: REUTERS/File Photo/B. Yip
2013 - Hong Kong no foco da imprensa
Quando começaram a ser publicadas notícias sobre Edward Snowden e segredos dos EUA, o especialista em TI estava em Hong Kong. Apesar de os Estados Unidos terem pedido sua extradição, Hong Kong deixou Snowden voar para Moscou, onde ele recebeu asilo político. Enquanto alguns veem em Snowden um denunciante corajoso, outros o consideram um traidor da pátria.
Foto: Reuters/B. Yip
2014 - Protestos de guarda-chuva
Durante dois meses, Hong Kong teve grandes manifestações pró-democracia. A exigência era a escolha completamente democrática do chefe de governo. A marca registrada dos protestos foram os guarda-chuvas usados pelos manifestantes para se proteger do spray de pimenta da polícia. As manifestações são vistas como o maior desafio à autoridade da China desde o movimento por mais democracia, em 1989.
Foto: Reuters/T. Siu
2015 - Liberdade de expressão no estádio
A partida de futebol entre China e Hong Kong pelas eliminatórias da Copa de 2018 foi palco de protestos. Torcedores de Hong Kong empunharam cartazes com os dizeres "Hong Kong não é China" enquanto era tocado o hino nacional chinês. Há muita tensão entre os dois lados desde os "protestos dos guarda-chuvas". O jogo acabou em 0 a 0.
Foto: Reuters/B. Yip
2016 - Até correr sangue
Novos protestos foram realizados em Hong Kong. Mais uma vez, a polícia usou spray de pimenta e cassetetes. A razão: as autoridades tentaram remover vendedores de rua ilegais num bairro operário. Foram as mais violentas batalhas de rua desde os protestos de 2014.
Foto: Reuters/B. Yip
2017 - O tempo passa
No parque memorial rei George 5º, um dos poucos parques onde ainda há uma ligação com o passado colonial, as raízes de uma figueira cobrem uma placa, 20 anos após a devolução de Hong Kong à China pelos britânicos.