Após degelo histórico promovido por Obama, presidente americano restabelece algumas restrições econômicas e de viagem à ilha e desafia governo Raúl Castro a negociar acordo melhor para os cubanos.
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O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, anunciou nesta sexta-feira (16/06) uma revisão do acordo com Cuba firmado por seu antecessor, Barack Obama – passo que marca um recuo na aproximação entre os dois países, apesar de terem sido mantidas as relações diplomáticas.
"Com efeito imediato, estou cancelando o acordo completamente unilateral do governo anterior com Cuba", declarou Trump durante um discurso em Little Havana, bairro em Miami onde vivem muitos imigrantes cubanos e da América Latina.
Para o presidente, "o alívio das restrições sobre viagens e comércio, promovido pela gestão passada, não ajuda o povo cubano, apenas enriquece o regime". Ele ainda classificou o acordo de Obama com o governo "brutal" da família Castro como "terrível" e "equivocado".
Segundo a imprensa internacional, no entanto, Trump exagerou nas palavras. Em nota, o Departamento do Tesouro explica que as novas medidas não têm efeito imediato e que preveem apenas uma aplicação mais rigorosa das leis, afrouxadas quando Obama buscava uma aproximação.
Trump anunciou que serão restabelecidas algumas restrições a Havana, envolvendo viagens de americanos à ilha e negociações entre empresas dos Estados Unidos e entidades militares cubanas.
Retomados em 2016 após mais de 50 anos de proibição, os voos comerciais entre EUA e Cuba serão mantidos, bem como a permissão para que americanos voltem para casa com produtos cubanos. As viagens, no entanto, devem ser dificultadas a cidadãos americanos, bem como proibidas as visitas para fazer turismo.
Com a mudança, autoridades dos EUA devem reforçar a averiguação dos motivos da viagem, checando se os viajantes realmente se enquadram em uma das 12 categorias autorizadas, em vigor desde o governo Obama. Elas incluem visitas familiares e atividades educacionais, por exemplo.
A nova política também proíbe a maioria das transações comerciais entre companhias americanas e empresas ligadas às Forças Armadas Revolucionárias, que estão presentes em todos os setores da economia cubana.
Em discurso, Trump justificou as medidas afirmando que sua gestão vai fazer de tudo para evitar que o dinheiro americano seja usado para financiar um governo que, segundo ele, é repressor.
"Os lucros vindos do investimento e do turismo fluem diretamente para os militares. O regime toma o dinheiro e é dono da indústria", acusou o presidente. "Não queremos que os dólares americanos apoiem um monopólio militar que explora e abusa dos cidadãos de Cuba."
Cronologia da relação entre Cuba e EUA
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O presidente afirmou, porém, que as relações diplomáticas serão mantidas e que não fechará as embaixadas em Washington e Havana. "Nossa embaixada permanece aberta com a esperança de que nossos países possam traçar um caminho muito melhor", declarou ele.
Sobre as sanções contra o governo em Cuba, Trump declarou que elas serão mantidas até que "todos os prisioneiros políticos sejam libertados, todos os partidos políticos sejam legalizados e que sejam marcadas eleições livres e com supervisão internacional" no país.
O líder americano também desafiou o governo de Raúl Castro a sugerir um novo acordo que seja de interesse tanto do povo cubano como do americano.
A decisão anunciada em Miami é a mais recente das tentativas de Trump de desmantelar o legado do ex-presidente Obama. Além de estar tentando substituir o chamado Obamacare, sistema de saúde americano criado pelo antecessor democrata, o mandatário anunciou no início deste mês que vai retirar os EUA do Acordo de Paris sobre o clima.
Obama iniciou o processo de reaproximação com Cuba em dezembro de 2014, após mais de cinco décadas de relações diplomáticas rompidas. A embaixada americana em Havana foi reaberta oito meses mais tarde, e o ex-presidente adotou uma série de medidas para atenuar o embargo econômico imposto à ilha em 1962.
Em março de 2016, Obama fez uma visita histórica a Cuba, a primeira de um presidente americano em 88 anos. Em agosto do mesmo ano, foram retomados os voos comerciais entre os dois países.
EK/afp/ap/dpa/efe/lusa/rtr/ots
EUA e Cuba: crônica da rivalidade
Desde a Revolução Cubana, em 1959, Cuba e os Estados Unidos estão em disputa, que já envolveu mercenários, bloqueios navais, sanções econômicas, criminosos e carros de boi.
Foto: picture-alliance/dpa
Bordel dos EUA
Antes da revolução, Cuba era, para muitos americanos, sinônimo de jogos de azar, casas noturnas e outros tipos de entretenimento – como um jantar no Havana Yacht Club (foto). "Cuba era o bordel dos EUA", definiu mais tarde o cientista político americano Karl E. Meyer. Para a população, a ditadura de Fulgencio Batista, no entanto, significava principalmente estagnação, desemprego e pobreza.
Para derrubar o regime já falido, Fidel Castro precisa de apenas um exército de guerrilha de algumas centenas de homens. Em 1° de janeiro de 1959, Batista foge de Cuba, e os rebeldes tomam Havana. Os EUA impõem sanções imediatamente, que vão sendo intensificadas nos anos seguintes. A liderança cubana, então, recorre à União Soviética.
Foto: picture-alliance/dpa
Fiasco na Baía dos Porcos
Uma tropa mercenária de cubanos exilados tentou derrubar o regime em 1961, com ajuda da CIA. A operação foi um fiasco. O Exército Revolucionário Cubano acaba com a invasão na Baía dos Porcos dentro de três dias, afirmando ter feito mais de mil prisioneiros.
Foto: AFP/Getty Images/M. Vinas
À beira de uma guerra nuclear
Devido ao relacionamento abalado entre EUA e Cuba, a União Soviética, passa, de repente, a dispor de uma base localizada a apenas cerca de 150 quilômetros dos Estados Unidos. O Kremlin quer estacionar mísseis na ilha. E, em 1962, a crise cubana deixa o mundo à beira de uma guerra nuclear. Com um bloqueio naval, os Estados Unidos impedem o transporte dos mísseis.
Foto: picture-alliance/dpa
Saúde e educação exemplares
A União Soviética não poupa esforços. Por décadas, Cuba é fortemente subsidiada, recebendo, entre outras coisas, petróleo bruto, que é reexportado pela ilha para obtenção de divisas. Cuba consegue, assim, construir sistemas de saúde e de educação exemplares.
Foto: picture-alliance/dpa
O êxodo dos marielitos
Em 1980, Fidel Castro permite que emigrantes deixem o país a partir do Porto de Mariel, com destino aos Estados Unidos. Cerca de 125 mil cubanos chegam à Flórida. Entre eles, estão alguns que haviam sido libertados pela administração cubana de prisões e hospitais psiquiátricos. A taxa de criminalidade em Miami aumenta drasticamente.
Foto: picture-alliance/Zuma Press/T. Chapman
Dependência açucarada
Por décadas, o embargo dos EUA limita a economia cubana de forma maciça. Além disso, não ocorre diversificação alguma. A cana-de-açúcar permanece sendo, mesmo após a revolução, o principal produto de exportação da ilha. Cuba continua totalmente dependente da assistência da União Soviética, algo que fica bastante claro a partir de 1990.
Foto: AFP/Getty Images/N. Barroso
"Período especial em tempo de paz"
Com o colapso da União Soviética, vem a quebra da economia cubana. Tudo passa a faltar. Fidel Castro declara a época de choque da economia cubana, a partir de 1990, como o "Período Especial em Tempos de Paz". Na ausência de combustível e peças de reposição, bois passam a ser usados como meio de transporte. Desde o final da década de 1990, a Venezuela fornece petróleo a preço baixo ao país.
Foto: AFP/Getty Images/A. Roque
O vai e vem das sanções
Desde 1993, a Assembleia Geral das Nações Unidas apela todos os anos para que os EUA acabem com sua política de embargo. Os EUA apertam e desapertam os parafusos das retaliações de tempos em tempos. Assim, as regulamentações do bloqueio ficam mais rigorosas em 1996 e mais relaxadas em 1999. Em 2004, o presidente George W. Bush endurece as sanções.
Foto: Getty Images/J. Raedle
Um novo capítulo se inicia
Após a libertação do prisioneiro americano Alan Gross e de três agentes cubanos presos nos EUA desde 1998, Raúl Castro e Barack Obama surpreendem o mundo ao anunciar, no dia 17 de dezembro de 2014, que normalizarão as relações diplomáticas entre os dois países e reabrirão suas embaixadas. Obama amplia as exceções ao embargo econômico e comercial sobre a ilha.
Pouco mais de seis meses após o anúncio da retomada das relações diplomáticas, Obama anuncia em 1º de julho de 2015 a reabertura das embaixadas dos EUA e de Cuba em Havana e Washington dentro de alguns dias. Desde dezembro de 2014, passos tomados para a reaproximação incluem a retirada de Cuba da lista de países que financiam o terrorismo e a libertação de presos políticos pelo governo cubano.