"Trump não tem condição para ser presidente de nada"
Olga Tikhomirova
8 de novembro de 2024
Ainda antes da divulgação dos resultados oficiais nos EUA, a DW entrevistou Francis Fukuyama. Para o politólogo americano, a vitória do candidato republicano já era certa, e as consequências para o mundo serão drásticas.
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O politólogo e economista nipo-americano Francis Fukuyama é famoso por traçar, em suas análises, vastas linhas históricas, com conclusões que beiram a predição profética. Sua obra mais popular, O fim da história e o último homem, publicado em 1992, portanto no ano seguinte à dissolução da União Soviética, exemplifica bem a amplitude de sua visão.
Com base na filosofia de Friedrich Hegel e Karl Marx, ele postula que naquele momento se alcançava "o fim da evolução ideológica da humanidade e a universalização da democracia liberal ocidental como forma final de governo humano". Nos anos seguintes, Fukuyama foi também associado à ascensão do movimento neoconservador, do qual se distanciaria mais tarde.
A DW entrevistou o pesquisador de 72 anos sobre as eleições presidenciais de 5 de novembro de 2024 nos Estados Unidos, quando ele ainda acompanhava com seus estudantes o anúncio dos resultados oficiais. Na ocasião, Fukuyama já dava como praticamente certa a vitória do republicano Donald Trump – que acabou se concretizando –, resultando num preocupante impulso para o populismo de direita no mundo.
"Essa vitória vai mudar tudo. Trump não gosta de aliados, não gosta de ter que apoiá-los. Acho que ele vai conseguir um acordo de paz com Putin à custa da Ucrânia. Isso vai estabelecer um péssimo precedente para o resto da Europa."
DW: A eleição presidencial americana foi um dos eventos mais esperados no mundo em 2024; na Europa e na Alemanha, decisões importantes foram adiadas até após o resultado. Parece que chegamos a um ponto de inflexão, o começo de uma nova história. O senhor concorda?
Francis Fukuyama: Quanto a uma nova história, não sei, mas é certamente uma mudança importante para os Estados Unidos, e devido à influência que têm, acho que [uma vitória de Trump] vai afetar o mundo de modo negativo.
Na sua opinião, os americanos querem algumas mudanças?
Ainda é extraordinário quanta gente está disposta a votar em Donald Trump depois de tudo o que sabe sobre ele. Para mim é bem decepcionante, porque ele realmente não parece ter condição para ser presidente de nada. E acho que isso vai ter grandes consequências para o resto do mundo, pois encoraja todos os partidos populistas da Europa e de outros lugares.
Estamos vendo um alto nível de polarização na sociedade americana, mas ao mesmo tempo isso resultou numa participação eleitoral marcante. O número dos que votaram antecipadamente é fora do comum. Isso não é bom?
Bem, é bom se você não prestar a menor atenção nos resultados concretos que vão sair dessa votação. Penso que a participação pública não é a única coisa a se considerar, a gente também quer que as pessoas façam escolhas sábias quando votam. Acho que elas estão votando por causa de questões de curto prazo, como a inflação, sem atentar para outras, de longo prazo, muito mais importantes, como a sobrevivência do Estado de direito nos EUA.
Nós vemos certas semelhanças aqui na Alemanha, em termos do crescimento do populismo e da incapacidade dos partidos convencionais de se oporem a esse processo. Então, a verdade não vale?
Acho que os EUA permanecem muito influentes, a gente vai copiar o que acontece aqui, e me parece que isso vai provavelmente ocorrer na Alemanha. Então estou seguro de que a [sigla populista de direita Alternativa para a Alemanha] AfD vai se sair melhor, devido ao que acontece nos EUA.
De volta aos americanos e sua sociedade: parece que Trump apostou numa emoção, a de que o país deveria se concentrar mais em si mesmo, nos americanos, não no mundo inteiro. Isso vai resultar em mudanças no papel que os EUA vão desempenhar na ordem global, e na própria ordem, em si?
Vai mudar. Vai mudar tudo. Trump não gosta de aliados, não quer ter que apoiar aliados. Ele não gosta da Ucrânia, acho que vai conseguir um acordo de paz com [presidente da Rússia Vladimir] Putin à custa dela. Vai ser um precedente péssimo para o resto da Europa. No Extremo Oriente, não está claro que ele vá se dispor a defender os aliados dos EUA contra a China.
Entrevista: Francis Fukuyama
02:29
Então, esses riscos políticos em que estamos entrando agora são realmente de grande porte, e não só no setor de segurança. Afinal, ele quer impor uma tarifa aduaneira de 20% contra todos os outros países. E isso resultará numa depressão econômica global, pois vamos estar de volta ao tipo de situação dos anos 1930, depois que foi aprovada a lei de taxação Smoot-Hawley.
No tocante à interferência russa nas eleições americanas: a imprensa relatou diversos casos de manipulação, o jornal The New York Times noticiou sobre ingerências da Rússia, China e Irã. A influência foi tão grande assim?
Não sabemos. Não sabemos se houve interferência. Trump venceu. Não sei se algum dia vamos saber se houve aí uma relação causa e efeito forte, porque é muito difícil julgar essas coisas. Mas certamente a intenção estava lá. Acho que, para Putin, a principal esperança para uma vitória na Ucrânia era ter Trump como presidente.
Porque ele vai cortar o apoio à Ucrânia?
Isso.
Os principais tópicos da campanha presidencial foram as restrições à imigração e às importações, a economia e o acesso ao aborto. Tudo indica que os americanos estão se desviando dos valores liberais, em direção a posturas mais conservadoras, fechando o país e a sociedade. Isso é um movimento? Vai durar muito tempo?
Muito difícil dizer. O fato de Trump ter vencido duas eleições, apesar de tudo o que todo mundo sabe sobre ele, indica que há uma insatisfação real com o estado dos EUA. Não acho que as medidas políticas dele vão funcionar, acho que vão gerar inflação, recessão econômica, mais desemprego.
Então pode ser que daqui a quatro anos todo mundo vá ver que foi um grande erro reelegê-lo, e nesse caso as consequências de longo prazo serão muito diferentes. Mas no momento, eu simplesmente não considero um bom sinal que tantos americanos estejam dispostos a votar em alguém que é tão profundamente lesado.
O mês de novembro em imagens
O mês de novembro em imagens
Foto: Ricardo Stuckert/PR
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Foto: OMAR HAJ KADOUR/AFP
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Foto: Lukas Balandis via REUTERS
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Foto: Nicolas Economou/NurPhoto/picture alliance
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Foto: Press Service of the State Emergency Service of Ukraine in Dnipr/picture alliance
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Foto: Gaizka Iroz/AFP/Getty Images
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Foto: Evaristo Sa/AFP
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Foto: Manuel Balce Ceneta/AP/picture alliance
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Foto: Daniel Ramalho/AFP
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Foto: Fabio Rodrigues-Pozzebom/ Agência Brasil
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Foto: AP/dpa/picture alliance
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Bombardeada com um número recorde de 145 drones, a Ucrânia reagiu atacando Moscou com ao menos 34 drones, na mais pesada investida contra a capital russa desde o início da guerra, em 2022. O ataque ucraniano interrompeu o tráfego aéreo em três grandes aeroportos de Moscou e feriu ao menos uma pessoa em um vilarejo nos subúrbios da cidade. (10/11)
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Líderes da UE prometeram dar novo impulso à economia do bloco europeu ao término da cúpula que reuniu chefes de governo dos 27 Estados-membros na Hungria. Resultado das eleições nos EUA motivou europeus a avançarem medidas para aumentar competitividade do bloco. Cúpula termina com promessa de reforçar defesa e combater alta nos custos de energia. (08/11)
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Foto: Timothy D. Easley/AP Photo/picture alliance
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Foto: Fotoarena/IMAGO
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