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Trump pressionou Ucrânia e tentou encobrir escândalo

26 de setembro de 2019

Agente responsável por denúncia que fundamentou pedido de impeachment diz que membros da Casa Branca tentaram esconder transcrição da conversa entre Trump e líder ucraniano quando se deram conta da gravidade do conteúdo.

Zelensky e Trump
Zelensky e Trump: informante diz que presidente americano "usou telefonema para defender seus interesses pessoais"Foto: Reuters/J. Ernst

Uma carta elaborada por um agente dos serviços de inteligência americanos divulgada nesta quinta-feira (26/09) adicionou mais elementos explosivos para o escândalo que envolve uma ligação de Donald Trump ao presidente da Ucrânia, Volodymyr Zelensky.

No documento, o informante não apenas aponta que Trump usou seu poder para pressionar Zelensky a investigar um rival democrata, como também acusa altos funcionários da Casa Branca de agirem para esconder o conteúdo da ligação.

Segundo a denúncia, os funcionários da Casa Branca se deram conta do potencial comprometedor da transcrição da ligação e ordenaram que o conteúdo não fosse armazenado no servidor padrão para esse tipo de material. Em vez disso, a transcrição acabou sendo salva em um sistema separado, reservado para informações de acesso restrito.

A carta, com data de 12 de agosto, foi divulgada pouco antes de uma audiência com o diretor de Inteligência Nacional, Joseph Maguire, no Congresso americano.

No documento, o agente, que não é identificado, afirma que não testemunhou a maioria desses atos, mas que ouviu relatos de várias fontes da comunidade de inteligência, que tem como procedimento padrão monitorar as ligações dos presidentes americanos para líderes estrangeiros e elaborar transcrições. Segundo a carta, pelo menos 12 agentes ouviram a ligação.

O informante afirma ainda temer que as ações de Trump "configurem riscos para a segurança nacional dos EUA e para os esforços para barrar a interferência estrangeira nas eleições do país".

O caso já motivou a abertura de um processo de impeachmentcontra Trump. O escândalo estourou na semana passada, após a imprensa americana revelar a existência da denúncia de um agente – a carta cujo conteúdo foi revelado nesta quinta-feira – envolvendo uma conversa entre Trump e Zelensky.

No final de julho, Trump pediu repetidamente para que o ucraniano tomasse providências para investigar o ex-vice-presidente americano Joe Biden e seu filho, Hunter, que é membro do conselho de uma empresa ucraniana. Uma transcrição da conversa foi finalmente divulgada pela Casa Branca na quarta-feira, confirmando que Trump abordou o caso de Biden com Zelensky.

O americano também pediu que Zelensky entrasse em contato com o procurador-geral dos EUA, William P. Barr, e com seu advogado pessoal, Rudy Giuliani, para discutir medidas em uma potencial investigação contra Biden.

Na carta, que foi endereçada às comissões de inteligência da Câmara e do Senado, o informante afirma "que recebeu informações de que o presidente está usando o poder do seu gabinete para solicitar que um país estrangeiro interfira nas eleições americanas de 2020". Joe Biden é pré-candidato democrata à Presidência e pode ser rival de Trump nas eleições do ano que vem.

O agente ainda lista o que considerou como tentativas de interferência: a pressão sobre Zelensky e o papel de Barr e de Giuliani. "O presidente usou o telefonema para defender seus interesses pessoais. [...] O advogado pessoal do presidente, o senhor Rudoph Giuliani, é uma figura central nesse esforço. O procurador-geral [William] Barr parece estar envolvido também", diz o agente.

O informante ainda aponta que "durante os últimos quatro meses, mais de meia dúzia de funcionários dos EUA me informaram de vários fatos relacionados a este esforço" e que vários integrantes do governo relataram que as autoridades da Ucrânia foram levadas a acreditar que Trump só aceitaria falar e se encontrar com Zelensky se o presidente ucraniano "entrasse no jogo".

De acordo com o agente, Giuliani já havia se encontrado com membros do governo ucraniano, com destaque para o procurador-geral do país, e adiantado os desejos de Trump no caso Biden.

No dia seguinte à ligação, segundo o informante, um negociador dos EUA encontrou Zelensky em Kiev para uma reunião na qual ele passou sugestões de como o ucraniano poderia atender às demandas que Trump fez durante o telefonema. No início de agosto, foi a vez de Giuliani se reunir na Espanha com um assessor de Zelensky para tratar dos pedidos de Trump.

Acobertamento

De acordo com a carta, "funcionários de alto escalão da Casa Branca tentaram intervir para manter bloqueados todos os registros da ligação, especialmente a transcrição oficial que foi produzida pela Casa Branca".

O agente conta que funcionários da Casa Branca foram orientados por advogados ligados a Trump a remover as transcrições da ligação de um computador que normalmente é usado para armazenar esse tipo de material, e salvá-las em outro, mais restrito, que guarda informações confidenciais.

Segundo o agente, "essas ações realçam que os funcionários da Casa Branca entenderam a gravidade do que foi evidenciado pelo telefonema".

O informante disse ainda não saber se havia alguém ao lado de Trump durante a conversa. O monitoramento usado para elaborar as transcrições é feito a partir de uma sala vizinha, a Situation Room.

Pressão

De acordo com a transcrição liberada pela Casa Branca, Trump não fez nenhuma promessa específica para o ucraniano em troca da cooperação contra seu rival, mas disse em diversos momentos que os EUA "fazem muito pela Ucrânia".

"Muito mais do que os países europeus estão fazendo. A Alemanha não faz quase nada por vocês. [...] Muitos países são do mesmo jeito. Acho que é algo que você deveria analisar, mas os EUA têm sido muito bons para a Ucrânia." Zelensky respondeu: "Você está absolutamente correto. Não apenas 100%, mas na verdade 1.000% correto."

Embora Trump não tenha mencionado nenhuma ajuda em troca, a imprensa americana e a oposição democrata especulam que o republicano montou um cenário de pressão econômica para conseguir a colaboração de Zelensky.

Uma semana antes do telefonema, Trump havia suspendido uma ajuda militar de cerca de 250 milhões de dólares para a Ucrânia, que trava uma guerra em seu território contra forças apoiadas pela Rússia. E, em 11 de setembro, mais de um mês após a conversa, a verba foi descongelada.

O republicano nega qualquer irregularidade ou que tenha feito alguma pressão econômica sobre Zelensky. Na terça-feira, ele chamou a repercussão do caso de "caça às bruxas" e, nesta quarta-feira, voltou a negar ter feito algo errado. 

"Eu não fiz nada. Não houve quid pro quo", disse Trump, citando a expressão latina para troca de favores.

Nesta quinta-feira, o jornal Los Angeles Times divulgou um áudio em que Trump fala sobre o caso e chama “espião” quem quer que tenha divulgado as informações e parece insinuar que “nos velhos tempos” essa pessoa seria executada.

“Quero saber que é essa pessoa, quem é essa pessoa que deu a informação ao denunciante? Isso está mais para um espião. E sabe o que costumávamos fazer nos velhos tempos quando éramos mais espertos? Certo? Espiões e traição… Nós lidávamos de uma forma uma pouco diferente da que fazemos agora”, disse ao presidente, a um grupo de funcionários americanos na ONU.  

Após a divulgação da transcrição, a presidente da Câmara, Nancy Pelosi, que determinou a abertura do processo de impeachment, disse que o texto "confirma que o presidente empregou um comportamento que enfraquece a integridade das nossas eleições" e "a necessidade de um inquérito de impeachment".

No entanto, as chances de que esse inquérito resulte na queda de Trump são pequenas por enquanto. Os democratas têm maioria na Câmara, mas são superados pelos republicanos no Senado, que tem a palavra final sobre o caso. Seria necessário que 20 senadores do partido de Trump votassem contra o presidente para que o impeachment fosse bem-sucedido.

Ainda assim, o caso tem alto potencial de desgaste para Trump a cerca de 13 meses das eleições de 2020.

JPS/ots

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