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TSE nega "apuração paralela" de militares nas eleições

13 de setembro de 2022

Reportagem que ouviu Forças Armadas levantou temor de que TSE estaria cedendo. Não é a primeira vez que militares usam desconhecimento sobre regras eleitorais para exagerar poder de pressão e agitar base bolsonarista.

Militares em seção eleitoral durante as eleições de 2018
Militares em seção eleitoral durante as eleições de 2018Foto: Reuters/S. Moraes

O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) negou nesta segunda-feira (12/09) que tenha costurado “qualquer acordo com as Forças Armadas ou entidades fiscalizadoras para permitir acesso diferenciado em tempo real aos dados enviados para a totalização do pleito eleitoral”.

A negativa foi publicada em resposta a uma reportagem do jornal Folha de S.Paulo que havia apontado mais cedo que os militares estariam planejando realizar uma inédita “apuração paralela” do resultado do pleito usando como amostra 385 boletins de urna (BUs).

A primeira versão da reportagem, que indicava ter ouvido apenas fontes das Forças Armadas, apontava ainda que a “apuração paralela” ou “trabalho paralelo de contagem de votos” seria possível graças a um suposto acordo fechado no fim de agosto entre o generalato e o presidente do TSE, ministro Alexandre de Moraes. O texto levantava o temor que os militares houvessem pressionado com sucesso as autoridades eleitorais e garantido uma “medida inédita na história democrática brasileira”.

O texto original ainda classificava o suposto ato de Moraes como uma “concessão” de Moraes aos militares, que nestas eleições têm sido incentivados pelo presidente Jair Bolsonaro a pressionarem a Justiça Eleitoral por mais participação na fiscalização do pleito, como parte da estratégia do Planalto para alimentar paranoia infundada sobre a segurança das urnas eletrônicas.

Ainda segundo o jornal, militares que estarão a serviço em operações de garantia de votação e apuração devem ser escalados para tirar as fotos de uma amostra de 385 boletins de urna e enviar as imagens para técnicos das Forças Armadas.

Sem acesso diferenciado

No entanto, o TSE negou qualquer acordo e a versão das fontes ouvidas pela Folha repassaram para o jornal de que as Forças Armadas haviam garantido algum tipo de acesso especial aos dados eleitorais, e apontou que a disponibilização dos boletins de urna não tem nada de especial.

De fato, é praxe que os boletins de urna – um “extrato” da contagem de cada seção  – sejam disponibilizados para consulta de qualquer interessado – normalmente candidatos ou partidos políticos.

A novidade neste ano é que os boletins serão disponibilizados diretamente na internet, sem necessidade de deslocamento para as seções para fotografar cada extrato. Em junho, o TSE já havia informado sobre essa possibilidade, apontando que ele iria permitir “a qualquer pessoa ou instituição fazer contagem simultânea de votos”, bastando ter acesso à internet.

Na nota desta segunda-feira, o TSE reforçou como funciona o acesso aos dados: “Independentemente dessa possibilidade (consulta pela internet), como ocorre há diversas eleições, qualquer interessado poderá ir às seções eleitorais e somar livremente os BUs de uma urna específica, de dez, de trezentas ou de todas as urnas”.

Foi isso que fez, em 2020, a ONG Transparência Eleitoral Brasil. Na ocasião, a ONG  conferiu nos locais de votação dezenas de boletins de urna. Mais tarde, em relatório apontou não ter encontrando “inconsistências entre o documento e o constante nos sistemas do TSE”.

Em junho, os militares garantiram um papel de “entidade fiscalizadora” das eleições ao lado de entidades como a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB); o Congresso Nacional e Confederação Nacional da Indústria, entre outros.

No entanto, o TSE salientou nesta segunda que esse papel não garante nenhum acesso diferenciado ou privilégios aos militares em relação a outras entidades.

Notícias vagas ou distorcidas agitam base bolsonarista

Essa não é a primeira vez que notícias lançadas pelas Forças Armadas sobre planos para acessar dados do TSE acabam por alimentar temores ou uma expectativa de que os militares estão conseguindo interferir de maneira decisiva no processo eleitoral, mesmo que esse seja o desejo de Bolsonaro.

Em alguns casos, essas notícias escancaram desconhecimento dos próprios militares sobre o processo eleitoral, mas ainda assim acabam servindo para agitar a base bolsonarista e às narrativas do presidente.

Em agosto, por exemplo, o Ministério da Defesa enviou um pedido com carimbo "urgentíssimo" pedindo para o TSE agendar uma análise do código-fonte das urnas eletrônicas.

Só que o código já estava disponível publicamente para consulta há dez meses quando o ministério enviou seu ofício.

Mas o pedido redundante foi o suficiente para alimentar redes de influencers bolsonaristas, que empacotaram a solicitação como “um ultimato” para a Justiça Eleitoral ou propagandearam falsamente que os militares desejavam acessar um suposto “dado secreto”.

Desta vez, com os boletins de urna, não foi diferente. Pouco depois da divulgação da notícia sobre a contagem de amostras dos boletins de urna, algumas contas de bolsonaristas nas redes sociais celebraram os planos das Forças Armadas, também promovendo uma falsa ideia de que os militares iriam se encarregar de uma “contagem paralela” após uma suposta capitulação do TSE.

Em junho, em outro episódio que já havia envolvido os boletins de urna, Bolsonaro acusou falsamente o TSE de não aceitar uma “contagem simultânea de votos”. O desmentindo também coube ao TSE: que apontou a obviedade que a contagem simultânea, por meio dos boletins disponibilizados para interessados, sempre existiu.

“Todas as medidas voltadas para garantir ainda mais transparência e segurança nas Eleições 2022 vêm sendo amplamente divulgadas pelo Portal do TSE e pela imprensa, o que leva a crer que questionamentos sobre o assunto acontecem apenas por desconhecimento técnico ou por motivações políticas”, apontou o TSE em junho, em resposta às falsas acusações de Bolsonaro.

Parte do teor dessa nota, inclusive, foi novamente veiculado no comunicado divulgado nesta segunda-feira, indicando que setores das Forças Armadas tentaram requentar um assunto já esgotado.

Outros fatos rotineiros sobre as eleições também já foram instrumentalizados por contas bolsonaristas nas redes. Também em agosto, o presidente Jair Bolsonaro assinou um decreto que autorizava o emprego das Forças Armadas para garantir a segurança e a apuração das eleições.

A notícia foi veiculada com pouco contexto por diversos veículos, até mesmo alguns não alinhados ao bolsonarismo. Foi o suficiente para redes bolsonaristas celebrarem como uma vitória para a extrema direita. Até mesmo contas de esquerda publicarem mensagens expressando temor com a medida, retroalimentando de maneira não intencional as expectativas dos bolsonaristas.

Só que o decreto assinado por Bolsonaro é um procedimento de praxe em eleições brasileiras. O texto é inclusive idêntico ao assinado pelo então presidente Michel Temer durante o período pré-eleitoral de 2018. Naquele ano, mais de 28 mil militares foram convocados para atuar em 598 localidades nos dois turnos de votação. Em 2014, foram cerca de 30 mil.

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