Turistas voltam a Kiev, apesar das sirenes de ataque aéreo
Natalia Vlasenko
16 de setembro de 2022
Enquanto batalhas se concentram no leste e sul da Ucrânia, vida cultural e noturna da capital retoma ar de normalidade, atraindo viajantes de outras regiões do país.
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As ruas de Kiev estão movimentadas como na maioria dos dias, com engarrafamentos ocasionais freando o fluxo de veículos. Se não fossem os alertas de ataque aéreo, sacos de areia e barricadas diante de prédios administrativos, seria possível esquecer que a Ucrânia está em guerra. A vida cotidiana continua quase imperturbável na capital, onde os moradores frequentam parques, passeiam pelas avenidas e relaxam nos cafés.
"Saí de Kiev para a Polônia em 4 de abril de 2022. Naquela época, havia muitos postos de controle pela cidade, tínhamos que mostrar nossos documentos em todas as paradas, poucas lojas estavam abertas e encontrar um café aberto era quase impossível", comenta Ksenia Fedorova.
Ela trabalhou dez anos para um grande canal de televisão, mas agora ganha a vida como dubladora. De volta a sua cidade natal, Kiev, ela diz que as coisas quase parecem como nos tempos pré-guerra: shopping centers, restaurantes e cinemas estão abertos, e as ruas estão cheias.
Quando uma sirene de ataque aéreo toca na rua Khreshchatyk – a principal avenida de Kiev, repleta de bares, restaurantes e lojas –, a maioria dos transeuntes reage calmamente. Alguns continuam caminhando, enquanto outros se dirigem à estação de metrô para se abrigar até que o sinal de liberação seja dado.
Turistas domésticos estão de volta
Embora os turistas estrangeiros tenham evitado Kiev desde o início da guerra, os visitantes domésticos voltaram em massa. Muitos ucranianos querem voltar a viver uma vida normal, na medida do possível, e para muitos isso também significa fazer viagens curtas e visitar outras cidades.
As excursões organizadas a Kiev são muito procuradas, embora, com a guerra ainda em curso, muitos clientes dessas ofertas prefiram rotas com abrigos antiaéreos nas proximidades a que recorrer em caso de emergência.
"Os passeios pela cidade quase voltaram ao normal", diz Olena Oros, que trabalha como guia. "Costumo ter grupos de até 20 pessoas, e passeios temáticos especiais atraem multidões ainda maiores." Ela diz que muitos turistas domésticos agora se sentem seguros o suficiente para visitar a cidade e fazer passeios.
"Refugiados também participam de minhas excursões; moradores de Kharkiv se juntaram a pelo menos três delas." Ela até recebeu um pedido para fazer uma excursão em inglê,s vinda de um voluntário holandês baseado na Ucrânia.
O turismo na Ucrânia desenvolveu um lado francamente altruísta: muitas agências de viagens e guias que continuam trabalhando doam parte de sua renda para instituições de caridade. Outros concedem descontos especiais a membros das Forças Armadas, a famílias e crianças.
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Vida cultural renasce
Durante as primeiras semanas da guerra, a vida em Kiev foi turbulenta, mas agora está quase de volta ao normal. Muitas instituições culturais reabriram. Pode-se passar novamente uma agradável noite no Teatro Nacional Lesya Ukrainka, na ópera, ou visitar um dos muitos museus da cidade, como o Museu Nacional da História da Ucrânia.
"Quando a guerra começou, durante os primeiros dias nossas exposições mais valiosas foram empacotadas e levadas para um local seguro", conta Nataliya Lihitskaya, pesquisadora do museu, que reabriu no início de abril. "Criamos uma exposição temporária dedicada à batalha de Kiev e seus heróis, mas só podemos permitir o acesso a grupos de até 20 visitantes. Em caso de alerta de ataque, temos um abrigo antiaéreo."
À noite e nos fins de semana, concertos ao ar livre são realizados nos parques de Kiev, artistas de rua tocam jazz, pop e música ucraniana nos espaços públicos. Concertos subterrâneos também são realizados na estação de metrô Maidan Nezalezhnosti.
Maioria dos turistas estrangeiros ainda evita Kiev
"É claro que as condições são inseguras, os voos são restritos e o perigo, constante, o que torna impossível garantir a segurança dos turistas estrangeiros”, admite a especialista em viagens Maria Yuhnovets, da Sputnik Kiev DMC.
A maioria dos estrangeiros encontrados hoje em Kiev são jornalistas, políticos e membros de agências de ajuda humanitária. Quem trabalha no setor de turismo da Ucrânia não espera que os turistas estrangeiros voltem tão cedo. Isso exigiria não apenas o fim dos bombardeios e ataques russos, mas também o fim da lei marcial, sem mencionar a reabertura do espaço aéreo.
Instantâneos de uma Ucrânia em guerra
Mostra "O novo anormal", no Museu Deichtorhallen de Hamburgo, registra horrores da guerra, mas também a resistência dos ucranianos, em trabalhos de 12 fotógrafos do país sob invasão russa.
Foto: Oksana Parafeniuk
Civis treinam com armas de madeira
Nesta imagem feita perto de Kiev em 6 de fevereiro de 2022, menos de duas semanas antes da invasão russa, a fotógrafa Oksana Parafeniuk capturou a determinação de seus compatriotas de resistir. Embora os países ocidentais não esperassem que a Rússia atacasse a capital a Ucrânia, os civis de lá já estavam treinando com armas de madeira, para caso de emergência.
Foto: Oksana Parafeniuk
Resistindo com o país
Em 24 de fevereiro, o fotógrafo Mykhaylo Palinchak acordou em Kiev com o som de sirenes, pouco depois ouviu uma explosão. "Desde então, estamos vivendo num novo mundo", afirma. Suas fotografias mostram granadas, casas destruídas e como seus compatriotas defendem a nação, mais do que nunca. A mulher da foto exibe o pulso esquerdo tatuado com o mapa da Ucrânia.
Foto: Mykhaylo Palinchak
Começou às 5 da manhã
"A guerra é a pior das opções da humanidade. Nenhum filme, nenhum livro, nenhuma foto pode transmitir este horror", diz a fotógrafa Lisa Bukreieva. "Com a invasão dos russos, meu sentido de tempo mudou. É apenas um horror de longa
duração." Esta fotografia capta o momento em que a guerra começou para ela.
Foto: Lisa Bukreieva
Cidadãos de Kiev - parte 1
Depois da invasão da Ucrânia pelo exército russo, Kiev se transformou em outra cidade, relata Alexander Chekmenev, de 52 anos. Muitos fugiram, ele próprio enviou a família para a segurança no exterior, mas ficou no país para documentar com sua Pentax a vida dos cidadãos de Kiev em tempos de guerra. Como esta ucraniana em uniforme de combate.
Foto: Alexander Chekmenev
Cidadãos de Kiev - parte 2
Abrigos antiaéreos e centros de primeiros-socorros espalharam-se pela capital ucraniana. Lá, Chekmenev fotografou gente comum, que nunca esteve sob os holofotes: "Eu queria mostrar a dignidade deles. Este país pertence ao seu povo, e eu quero mostrar o meu respeito por cada um deles", diz o fotógrafo de renome internacional.
Foto: Alexander Chekmenev
Traços do presente
Em sua série de fotografias, Pavlo Dorohoi capturou a vida em tempos de guerra em sua cidade natal, Kharkiv. Muitos cidadãos se esconderam em estações do metrô para escapar das bombas, transformando os locais em lares temporários, com "tapetes, cobertores e outros objetos pessoais", relata Dorohoi.
Foto: Pavlo Dorohoi
Bucha: o local do horror
O arquiteto e fotógrafo de Kiev Nazar Furyk fotografou lugares devastados pelas tropas russas, entres os quais a cidade de Bucha, que se tornou símbolo de muitas atrocidades. O fotógrafo se pergunta: como é possível continuar vivendo num lugar assim? Como se lida com essa experiência, gravada profundamente na memória coletiva da população ucraniana?
Foto: Nazar Furyk
Diário de Kiev - parte 1
A fotógrafa e videoartista Mila Teshaieva mantém um diário online desde o início da guerra, onde registrou tudo: desde os primeiros dias, antes dos mísseis, até os crimes contra a humanidade revelados desde então. Seus registros também incluem fotos, como esta.
Foto: Mila Teshaieva
Diário de Kiev - parte 2
Mila Teshaieva relata o desespero que a guerra provoca, mas também registra a união dos ucranianos e sua enorme vontade de resistir. Em sua cidade natal, Kiev, os moradores estão tentando proteger não só a si, mas também seus monumentos, símbolos da identidade nacional.
Foto: Mila Teshaieva
Documentação da guerra
Vladyslav Krasnoshchok é dentista, mas há anos se dedica à arte. Agora viaja por sua pátria devastada e fotografa carros queimados, pontes e tanques destruídos. "Eu tiro fotos, ouço tiros e corro de volta para o carro. Adrenalina pura!", escreve. Ele sempre revela os filmes imediatamente. Afinal, não se sabe se haverá oportunidade de tirar mais fotos.
Foto: Vladyslav Krasnoshchok
Mutilado
"Vivendo com o medo de ser ferido" é o nome da série de fotos do designer Sasha Kurmaz. A violência tem feito parte da história humana desde o início, afirma, e não está otimista se isso vá mudar em breve. Ainda assim, não desiste de sua luta pessoal por um mundo melhor.
Foto: Sasha Kurmaz
Porto seguro?
Uma cadeira, copos com bebidas: para Elena Subach esta foto tirada na cidade de Uzhgorod, no oeste da Ucrânia, simboliza a segurança de quem foge rumo a outros países. "Quase todo homem tirou uma foto da esposa e dos filhos antes de lhes dizer adeus. Eu nunca vi tanto amor e tanta dor ao mesmo tempo."