Turquia nega cessar-fogo com curdos no norte da Síria
1 de setembro de 2016
Ancara afirma que trégua nos combates com as milícias curdas está "fora de cogitação". Resposta vem após confirmação dos EUA sobre acordo de cessar-fogo.
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Autoridades da Turquia declararam nesta quarta-feira (31/08) que uma trégua nos combates com as milícias curdas no norte da Síria está "fora de cogitação", desmentindo afirmações de Washington no dia anterior de que as partes teriam fechado um acordo de cessar-fogo.
"Não aceitamos sob nenhuma circunstância, [diferente do que] alguns porta-vozes de países estrangeiros dizem, um compromisso ou cessar-fogo entre a Turquia e elementos curdos", destacou o ministro turco de Assuntos Europeus, Ömer Çelik, sobre o anúncio feito pelos EUA.
Segundo Çelik, Ancara não pode se colocar no mesmo nível de uma "organização terrorista". "A Turquia é um país independente, um Estado de Direito. Não se pode avaliar como se [as duas partes no combate] fossem iguais", disse o ministro em entrevista à agência estatal de notícias Anadolu.
Um comunicado oficial também foi emitido para negar o acordo formal de cessar-fogo."Reiteramos que essas declarações não são aceitáveis sob nenhum ponto de vista e não condizem com uma relação de aliança", explica o porta-voz do Ministério do Exterior turco, Tanju Bilgiç, na nota.
O porta-voz ressaltou que a Turquia seguirá no norte da Síria até que todos os "grupos terroristas" tenham se afastado da fronteira turca, "deixando de ser uma ameaça para os cidadãos turcos".
Segundo afirmou o jornal turco Hürriyet, sem dar maiores informações, a pasta convocou o embaixador americano na Turquia, John Bass, para prestar esclarecimento sobre as informações.
O primeiro-ministro turco, Binali Yildirim, também se pronunciou sobre o caso. Para ele, o Partido da União Democrática (PYD) e as Unidades de Defesa Popular (YPG), ambos curdos, são nada menos que "uma extensão da organização terrorista Partido dos Trabalhadores do Curdistão (PKK)".
"Nossa determinação continuará. Esses elementos devem recuar para a margem leste do Eufrates, de onde vieram. Os EUA fizeram uma promessa sobre isso. Não esperamos que nada mude", disse ele.
Turquia amplia ofensiva
A Turquia invadiu o norte da Síria há uma semana, inicialmente com o objetivo de libertar a cidade de Jarabulus do controle do grupo terrorista "Estado Islâmico" (EI). Os militares turcos, porém, também atacaram as YPG, que vêm lutando contra os jihadistas com apoio dos Estados Unidos.
Na última segunda-feira, Washington já havia rechaçado os recentes combates entre o Exército turco, os rebeldes sírios pró-Turquia e unidades da aliança curda na Síria. De acordo com o Departamento de Defesa americano, essas operações são "inaceitáveis" e devem chegar ao fim.
No mesmo dia, Çelik rebateu as declarações do Pentágono. "Ninguém tem o direito de nos dizer contra qual organização terrorista devemos lutar e qual delas devemos ignorar", afirmou.
EK/afp/dpa/efe
A guerra civil na Síria antes do EI
O "Estado Islâmico" inflamou o debate sobre como pôr fim à guerra civil síria. Contudo o grupo só emergiu mais tarde no conflito. Confira alguns momentos dessa guerra que abriram espaço para o avanço dos jihadistas.
Foto: AP
Março de 2011
Enquanto regimes ruem por todo o Oriente Médio, dezenas de milhares de sírios vão às ruas para protestar contra a corrupção, o desemprego elevado e a alta dos preços dos alimentos. O governo da Síria responde com armas de fogo. Até maio, cerca de 400 vidas são ceifadas.
Foto: dapd
Maio de 2011
Sob insistência dos países ocidentais, o Conselho de Segurança da ONU condena a repressão violenta. Nos meses seguintes, os Estados Unidos e a União Europeia impõem embargo de armas, recusa de vistos e congelamento de bens. Com apoio da Liga Árabe, aumenta a pressão para a saída do presidente sírio Bashar al-Assad – embora sem o aval de todos os países-membros da ONU.
Foto: picture-alliance/dpa/J. Szenes
Agosto de 2011
Em 1970 um golpe pusera Hafez al-Assad no poder. Após sua morte, em 2000, o filho Bashar (à dir.) assume a liderança. De início tido como reformista, ele perde apoio ao manter o estado de emergência que há décadas restringe as liberdades políticas, permitindo vigilância e interrogatórios. Assad tem respaldo da Rússia, que lhe fornece armas e repetidamente veta as resoluções da ONU sobre a Síria.
Foto: picture-alliance/dpa/Stringer/Ap/Pool
Dezembro de 2011
A ONU e outras organizações têm provas de violação dos direitos humanos na Síria. Civis e militares desertores começam a se organizar lentamente para combater as forças do governo, que vêm atacando os dissidentes. Até o fim de 2011, essa luta causa mais de 5 mil mortes. Mesmo assim, ainda transcorrem seis meses até a ONU reconhecer que o país está em guerra.
Foto: Reuters/Goran Tomasevic
Setembro de 2012
O Irã finalmente confirma que tem combatentes em solo sírio, fato que Damasco negava há tempos. A presença de tropas aliadas acentua a hesitação dos Estados Unidos e de outras potências ocidentais em intervir no conflito. Os EUA, marcados pelas intervenções fracassadas no Afeganistão e no Iraque, propõem o diálogo como única solução sensata.
Foto: AP
Março de 2013
As mortes beiram 100 mil, e o total de refugiados em países vizinhos como a Turquia e a Jordânia atinge 1 milhão – número que duplicaria até setembro. Em dois anos de guerra, o Ocidente e a Liga Árabe veem fracassar todas as tentativas de um governo de transição, enquanto o conflito transborda para a Turquia e o Líbano. O pior temor é de que Assad se mantenha no poder a todo custo.
Foto: Reuters/B. Khabieh
Abril de 2013
Há muito Assad alega estar combatendo terroristas. Mas só no segundo ano de guerra se confirma que o Exército Livre Sírio inclui extremistas radicais. O grupo Frente al-Nusra declara apoio à Al Qaeda, fragmentando ainda mais a oposição.
Foto: Reuters/A. Abdullah
Junho de 2013
A Casa Branca afirma ter provas de que Assad está atacando civis com o gás tóxico sarin. Mais tarde a informação é corroborada pela ONU. A partir da revelação, o presidente dos EUA, Barack Obama, e outros líderes ocidentais passam a considerar uma intervenção militar. No entanto a proposta da Rússia para que se retirem as armas químicas da Síria acaba por se impor.
Foto: Reuters
Janeiro de 2014
Ao fim de 2013 surgem relatos sobre um novo grupo autodenominado Estado Islâmico do Iraque e do Levante – o futuro EI. Ao tomar terras no norte da Síria e também no Iraque, os jihadistas despertam lutas internas na oposição, causando 500 mortes até o início de janeiro. Esse terceiro e inesperado fator levaria os EUA, França, Arábia Saudita e outras nações à intervir na guerra em meados do ano.