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Ucrânia vive batalha crítica por cidade estratégica no leste

Roman Goncharenko
29 de agosto de 2024

Enquanto tenta pressionar Moscou com ofensiva na Rússia, Kiev vê tropas inimigas se aproximarem da importante Pokrovsk, na região do Donbass. Zelenski descreve situação como "extremamente difícil".

Moradores de Pokrovsk esperam para embarcar em um trem
Moradores de Pokrovsk e das cidades vizinhas de Myrnohrad e Selydove foram instruídos a deixar suas casasFoto: Evgeniy Maloletka/AP Photo/picture alliance

Pokrovsk é atualmente o principal foco da guerra da Rússia contra a Ucrânia. A situação no entorno da cidade estratégica e em outras áreas de Donetsk, no leste do país, é "extremamente difícil", classificou o presidente ucraniano, Volodimir Zelenski, nesta quarta-feira (28/08), apontando que o Exército russo tem concentrado suas ações na região.

Zelenski fez as declarações com base em relatos do comandante-chefe da Ucrânia, Oleksandr Syrskyi, que passou vários dias no front de Pokrovsk. Syrskyi afirmou que a Rússia tem feito de tudo para romper as defesas da Ucrânia e que as tropas de Kiev vêm tendo que usar métodos não convencionais para fortalecer suas posições.

Segundo o Exército-maior ucraniano, há "combates intensos" em uma série de vilarejos próximos a Pokrovsk. "Até agora o inimigo fez 38 tentativas de avançar sobre posições ucranianas. Em 14 locais, os combates continuam", afirmou.

De acordo com relatos dos últimos dias, o Exército russo havia chegado a uma distância de até 10 quilômetros da cidade. Mais de um terço dos ataques de Moscou têm mirado essa área na região do Donbass. Na quinta-feira da semana passada, por exemplo, foram 53 de 144 bombardeios.

Se a Ucrânia perder o controle sobre Pokrovsk, perderá também um importante centro de abastecimento para suas tropas. A liderança militar do país anunciou o envio de reforços, e os moradores de Pokrovsk e das cidades vizinhas de Myrnohrad e Selydove foram instruídos a deixar suas casas.

Futura cidade-fantasma?

"É um ciclo conhecido: a artilharia russa começa a bombardear os arredores, depois entram em ação bombas guiadas e drones FPV [com câmeras integradas], as cidades rapidamente se transformam em cidades-fantasma, e as pessoas fogem", afirmou Oliver Carroll, correspondente da revista britânica The Economist, que esteve em Pokrovsk na semana passada.

Embora lojas e hospitais ainda estivessem em funcionamento, havia poucas pessoas nas ruas, descreveu Carroll. Desde 12 de agosto, uma nova proibição de circulação, entre as 17h e as 9h, foi imposta na parte do Donbass que é controlada por Kiev em povoados a menos de 10 quilômetros da linha de frente.

Idosa é retirada de casa em Pokrovsk devido ao avanço das tropas russasFoto: Thomas Peter/REUTERS

Pokrovsk fica no extremo oeste da região de Donetsk e tinha cerca de 60 mil habitantes antes da invasão russa. Agora, estima-se que menos de 40 mil ainda vivam lá. Carroll disse ter visto pessoas deixando a cidade de trem.

As autoridades locais estão transferindo moradores para a região de Rivne, no oeste da Ucrânia. No site da prefeitura, um trem gratuito é oferecido a cada oito dias. Serhij Harmash, editor-chefe do portal Ostriw, acredita que isso não seja suficiente: "As pessoas vão fugir de forma desorganizada."

"Ver as pessoas fugindo com seus pertences empacotados em algumas poucas sacolas é uma cena muito triste, mas infelizmente muito familiar no Donbass. Você vê carros com móveis amarrados no teto", diz Carroll. "Conversei com uma mulher de 84 anos que está enfrentando uma situação dessas pela segunda vez na vida. Ela se lembra da primeira, quando era pequena, nos anos 1940. Agora, está fugindo do Exército de Vladimir Putin. A mulher estava tão revoltada que não conseguia nem pronunciar o nome dele."

Por que Pokrovsk é importante

Pokrovsk fica numa intersecção de importantes ferrovias e rodovias, incluindo a E50, que conduz ao oeste, até Pavlograd, na região vizinha de Dnipropetrovsk. São cerca de 20 quilômetros até a fronteira regional, e alcançá-la é um objetivo declarado do Kremlin.

De acordo com estimativas oficiais, no segundo semestre de 2023, a Ucrânia controlava cerca de 45% da região de Donetsk, onde viviam cerca de 480 mil pessoas. Desde então, a área controlada diminuiu, mas não há dados exatos disponíveis (o mapa a seguir mostra a situação de três meses atrás).

O Exército ucraniano dispõe de "dois importantes pontos logísticos que permitem o controle da parte ucraniana do Donbass", afirma Yuri Butusov, um dos mais renomados correspondentes de guerra ucranianos e chefe do Censor.net.

"Trata-se dos centros urbanos de Pokrovsk-Myrnohrad e Sloviansk-Kramatorsk. Eles são de importância estratégica. A situação é crítica para toda a região de Pokrovsk-Myrnohrad", destaca o jornalista.

O historiador militar austríaco Markus Reisner compartilha dessa preocupação. "Pokrovsk é uma importante base logística para a Ucrânia. Se for perdida, isso resultará em atrasos nas entregas em outras áreas. Além disso, é uma base na terceira linha de defesa, e para além dela, há uma área aberta", diz o coronel da Academia Militar Theresiana, em Wiener Neustadt. "É por isso que a situação é tão perigosa."

Logo a oeste de Pokrovsk, não há grandes cidades que sejam importantes do ponto de vista da defesa ucraniana. Se a Ucrânia será capaz de estabelecer novas e fortes linhas de defesa é uma questão em aberto.

Segundo Reisner, isso geralmente leva meses. Para o historiador, no pior cenário, caso haja problemas com o apoio ocidental, "o Donbass pode passar definitivamente para o lado russo, resultando em uma possível ruptura que talvez só possa ser contida em Dnipro".

Como o Exército russo se aproximou de Pokrovsk

A situação em Pokrovsk, segundo observadores, é o resultado de dois acontecimentos. Primeiro, em 17 de fevereiro deste ano, a Rússia conquistou Avdiivka, um subúrbio bem fortificado de Donetsk. De Avdiivka a Pokrovsk são cerca de 60 quilômetros, e o Exército russo percorreu a maior parte dessa distância em seis meses.

O segundo acontecimento importante foi em maio, quando o Exército russo conseguiu explorar a rotação de tropas ucranianas perto do vilarejo de Ocheretyne e "romper" o front, descreve Butusov. Segundo o jornalista, as forças russas avançam em pequenos grupos.

Carroll compartilha informações semelhantes: "Em Avdiivka, a infantaria contou com o apoio de unidades mecanizadas. A Rússia dispõe agora de menos veículos blindados, e a principal ofensiva está sendo conduzida por infantaria em motocicletas e scooters, essa é a principal tática."

Militares ucranianos em Donetsk chegam a ficar 70 dias em suas posiçõesFoto: Smoliyenko Dmytro/Ukrinform/ABACA/picture alliance

Reisner acredita que tenha sido por acaso que a área de Pokrovsk se tornou o ponto mais crítico da guerra no Donbass. "Foi lá que a Rússia conseguiu romper a segunda linha de defesa das tropas ucranianas, mas isso poderia ter ocorrido em outro lugar, como em Siversk", considera.

Por que o Exército russo avança rumo a Pokrovsk?

Observadores citam vários fatores para explicar o avanço russo rumo a Pokrovsk, incluindo as consequências da falta de munição no inverno no hemisfério norte, quando os fornecimentos dos EUA foram interrompidos. Agora, a situação melhorou, mas a Rússia ainda está em vantagem, havendo três munições de artilharia russas para cada uma do lado ucraniano, apontou recentemente o comandante-chefe Oleksandr Syrskyi.

No entanto, essa não é a principal causa, consideram observadores. "Há um problema na organização e no planejamento das batalhas", diz Butusov.

Carroll também menciona isso, mas, para ele, a principal razão é outra: "As forças ucranianas estão no limite, estão extremamente exaustas; alguns combatentes permanecem 30, 40 e, em alguns casos, até 70 dias em suas posições."

A ofensiva ucraniana em Kursk vai ajudar?

Muitos especialistas suspeitam que o objetivo da ofensiva ucraniana em Kursk, em território russo, seja reduzir a pressão da Rússia sobre o Donbass. Até agora, isso talvez não tenha ocorrido na medida que Kiev esperava, e observadores acreditam que esse suposto objetivo não será alcançado.

A Rússia, na realidade, intensificou seus esforços, observa Carroll. Um militar ucraniano disse ao correspondente que, além da falta de munição para as tropas de Kiev, desde o início do ano a Rússia "melhorou significativamente seu sistema de rastreamento e destruição de artilharia".

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