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UE acusa Rússia de provocar crise global de alimentos

7 de junho de 2022

Em reunião da ONU, presidente do Conselho Europeu culpa Moscou pela escassez de alimentos em países em desenvolvimento. Devido à guerra, milhões de toneladas de grãos que seriam exportados estão encalhados na Ucrânia.

Foto mostra porto danificado
Ucrânia busca alternativas para escoar safra, com portos interditados ou destruídosFoto: Nikolai Trishin/TASS/dpa/picture alliance

O presidente do Conselho Europeu, Charles Michel, acusou a Rússia nesta segunda-feira (06/06) de usar alimentos como "um míssil furtivo contra países em desenvolvimento" e culpou o Kremlin pela iminente crise global alimentar, levando o embaixador de Moscou na ONU a deixar uma reunião do Conselho de Segurança.

Michel dirigiu-se ao embaixador russo Vassily Nebenzia e disse que viu, há alguns dias, milhões de toneladas de grãos presos em contêineres e em navios no porto ucraniano de Odessa. Segundo ele, isso se deve "aos navios de guerra russos no Mar Negro" e aos ataques de Moscou à infraestrutura de transporte e instalações de armazenamento de grãos na Ucrânia. Além disso, de acordo com Michel, tanques, bombas e minas russos estão impedindo agricultores ucranianos de trabalhar.

"Tudo isto está elevando os preços dos alimentos, empurrando as pessoas para a pobreza e desestabilizando regiões inteiras", declarou o presidente do Conselho Europeu. "A Rússia é a única responsável por esta situação, apesar da sua campanha de mentiras e desinformação. Só a Rússia", frisou.

Michel também acusou as forças russas de roubarem grãos de áreas ocupadas "enquanto transferem a culpa para outros", classificando essas atitudes de "covardes" e de "propaganda, pura e simples".

O Programa Mundial de Alimentos da ONU compra metade de seus estoques de grãos da Ucrânia. Mas, desde o início da guerra, as exportações pararam porque os portos da costa do Mar Negro estão fechados.

A Ucrânia acusa a Rússia de bloquear seus portos, o que a impediria de exportar até 22 milhões de toneladas de cereais, principalmente para África e Ásia. Além disso, denuncia que a Rússia roubou cereais ucranianos e os vendeu ilegalmente para países terceiros, como a Síria. A Rússia nega, chamando a afirmação de "blefe".

Embaixador russo abandona reunião

Durante o pronunciamento do líder europeu, Nebenzya abandonou a reunião, dando o lugar a outro diplomata russo.

Mais tarde, o vice-embaixador da Rússia na ONU, Dmitry Polyansky, escreveu no Telegram que os comentários de Michel foram "tão rudes" que Nebenzya teve que deixar a reunião do Conselho de Segurança.

O encontro deveria se concentrar na violência sexual cometida durante a guerra na Ucrânia, mas as consequências do conflito especialmente na escassez global de alimentos e no aumento dos preços também foram abordadas.

Michel expressou forte apoio aos esforços do secretário-geral da ONU, António Guterres, para obter um acordo que permita a exportação de grãos da Ucrânia e garanta que alimentos e fertilizantes russos tenham acesso irrestrito aos mercados globais.

Juntas, Ucrânia e Rússia produzem quase um terço do trigo e da cevada do mundo e metade do óleo de girassol, enquanto Rússia e a sua aliada Belarus estão entre os maiores produtores mundiais de potássio, ingrediente-chave de fertilizantes.

Guterres alertou, no mês passado, que os níveis globais de fome "estão num novo recorde", com o número de pessoas que enfrentam insegurança alimentar grave duplicando em apenas dois anos, de 135 milhões antes da pandemia para 276 milhões atualmente. 

Navios estão presos no porto de Odessa há semanasFoto: Wang Qing/Xinhua News Agency/picture alliance

Ucrânia busca alternativas

O embaixador da Ucrânia na ONU, Serguei Kyslytsya, disse ao Conselho de Segurança que o país continua comprometido em encontrar soluções para evitar a crise alimentar global e está pronto para criar "as condições necessárias" para retomar as exportações do porto de Odessa.

"A questão é como garantir que a Rússia não abuse da rota comercial para atacar a cidade", disse o diplomata ucraniano.

Kyslytsya explicou que a questão se tornou ainda mais relevante desde que quatro mísseis russos atingiram uma fábrica na capital Kiev no domingo, onde vagões de carga que transportam grãos para portos ucranianos estavam sendo reparados.

Kyslytsya considerou ainda "importante" que a delegação da Rússia continue se pronunciando nas reuniões da ONU, uma vez que "tudo o que os diplomatas dizem é gravado e será usado contra eles em tribunal, como cúmplices destes crimes".

O secretário de Estado americano, Antony Blinken, disse que Putin está "usando agressivamente sua máquina de propaganda para desviar ou distorcer a responsabilidade" porque espera que o mundo ceda, classificando a atitude, em outras palavras, como "chantagem''.

 "O Kremlin precisa perceber que está exportando fome e sofrimento muito além das fronteiras da Ucrânia", com os africanos experimentando "uma grande parte da dor", afirmou Blinken.

Porto de Constança, na Romênia, está sendo utilizado como rota emergencial - mas custos são elevadosFoto: Daniel Mihailescu/AFP/Getty Images

Na sexta-feira, Putin disse que a Rússia não atacará os portos ucranianos que tiverem minas em seu entorno removidas para a passagem de cereais bloqueados.

"Não vamos aproveitar a situação de desminagem para, digamos, realizar algum tipo de ataque no mar", disse Putin durante entrevista à televisão pública russa, afirmando que a Rússia não vai impor "nenhuma condição". Kiev, porém, não acredita nas promessas.

Silos transbordando

A Ucrânia costumava transportar cerca de seis milhões de toneladas de grãos e oleaginosas por mês através de seus portos. Mas agora, os silos estão transbordando porque as exportações estão paralisadas.

De forma emergencial, algumas toneladas de cereais foram transportadas ao porto de Constância, na Romênia, para serem escoadas. "Isso é possível com muito esforço", disse Viorel Panait, CEO da Comvex, proprietária do porto. 

No entanto, não se pode substituir rotas de transporte marítimas tão grandes da noite para o dia e o principal problema em questão é o grande volume de exportações ucranianas. 

Uma alternativa seria o transporte férreo. No entanto, as dificuldades começam com a bitola dos trilhos: na Rússia e na Ucrânia, eles são historicamente cerca de 10 centímetros mais largos do que no resto da Europa. Isto significa que os vagões precisam ser recarregados na fronteira ou transferidos para um chassis adequado, o que encarece muito os custos de transporte.

le/cn (AP, EFE, Lusa, ots)

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