Bolsonaro ou Haddad-Lula? No próximo domingo, sairá vencedor das urnas o candidato à Presidência menos odiado pelos brasileiros, escreve o colunista Thomas Milz.
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Seria surreal se não fosse verdade. Dois candidatos foram determinantes na fase crucial da campanha eleitoral, que agora se encaminha para o fim, sem sequer terem estado presentes nela. Todos os demais, que corajosamente se digladiaram de debate em debate na TV, não terão chance. A contribuição deles em termos de conteúdo não desempenhará papel algum.
Jair Messias Bolsonaro, um dos que não estiveram presentes, ficou internado durante quase todo o mês de setembro após ser esfaqueado. O outro, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, permaneceu atrás das grades – assim como nos cinco meses anteriores. Neste ano de 2018, parece não ter importância se um candidato está ou não fisicamente presente na campanha eleitoral. Ou se ele – como no caso de Lula, barrado pela Justiça – pode ou não ser candidato oficialmente.
Em 7 de outubro, o Brasil vai decidir sobre Lula. Quem o considera um vilão e odeia tudo o que ele representa vota em Bolsonaro. Quem odeia tudo aquilo contra o que Lula se coloca – começando pelo presidente Michel Temer, passando pela Justiça, promotores e juízes, até os militares – vota em Lula. Ou seja, em Fernando Haddad. Agora depende de quem é retratado como mais odioso: o "fascista e racista" Bolsonaro ou o "comunista" Lula.
Em ambos os casos, trata-se da figura de Lula, e não da de Bolsonaro. Pois Bolsonaro só existe politicamente, sobretudo, por causa de Lula. Ele deve sua ascensão, em primeiro lugar, ao ódio que manifestou publicamente contra todas as mudanças que Lula e o PT trouxeram ao Brasil. Mais tarde, inflamou sua base com os apelos para que Lula fosse para a cadeia. Quando isso aconteceu, Bolsonaro reajustou suas mensagens em vídeo: agora se tratava de impedir que Lula fosse libertado por um presidente Haddad e continuasse seu plano de transformar o Brasil numa nova Cuba.
Enquanto isso, o candidato substituto do PT, Haddad, se apresenta como um outdoor ambulante de Lula. O ex-presidente pediu repetidas vezes que não fosse julgado pela Justiça – isto é, pelo juiz federal Sérgio Moro –, mas sim pelo povo brasileiro. Nas urnas, e não num tribunal. E é isso o que Lula receberá agora. No próximo domingo – ou no mais tardar no segundo turno, em 28 de outubro – o povo vai proferir a sentença sobre o ex-presidente.
Para alguns, Lula é o maior brasileiro de todos os tempos; para outros, o maior vilão. Ambos os lados têm suas opiniões reforçadas pelas redes sociais. Informações objetivas, soluções construtivas e contribuições sensatas para o debate não são oferecidas. Geralmente, há apenas veneno puro, pulverizado sem piedade sobre o arqui-inimigo político.
Há muito tempo não se trata mais de conteúdo, da política econômica acertada, de uma melhora da educação e da saúde. Nada disso vai decidir as eleições, nada disso é importante. O que conta é prejudicar o outro, com puro ódio. Não há espaço para mais informações nas postagens no Facebook, assim como não há vontade de debater.
Estas são as primeiras eleições no Brasil cujos temas não são mais norteados pela imprensa tradicional. Agora, dominam grupos anárquicos no Whatsapp e postagens no Facebook sobre o fluxo de (des)informação, e quase ninguém mais sabe o que é falso nas notícias. E isso também não interessa. Porque o fake está na moda, e a verdade foi há muito tempo substituída pelo instinto. As eleições serão vencidas por aquele que conseguir meter medo e pintar o inimigo de forma ainda mais odiosa do que ele próprio é visto pelo adversário.
Thomas Milz saiu da casa de seus pais protestantes há quase 20 anos e se mudou para o país mais católico do mundo. Tem mestrado em Ciências Políticas e História da América Latina e, há 15 anos, trabalha como jornalista e fotógrafo para veículos como o Bayerischer Rundfunk, a agência de notícias KNA e o jornal Neue Zürcher Zeitung. É pai de uma menina nascida em 2012 em Salvador. Depois de uma década em São Paulo, mora no Rio de Janeiro há quatro anos.
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Treze candidatos se apresentaram para disputar o Planalto. O líder das pesquisas acabou fora da corrida, e vários nomes tentam contornar isolamento partidário. Veja os principais episódios da disputa.
Foto: Reuters/A. Machado
Bolsonaro é eleito presidente
Em segundo turno, os brasileiros elegeram Jair Bolsonaro (PSL) como presidente. Após uma campanha eleitoral polarizada, o militar reformado de extrema direita recebeu 55,13% dos votos, contra 44,87% de Fernando Haddad (PT). Com bandeiras do Brasil e vestidos nas cores verde e amarelo, eleitores comemoram pelo país. No discurso da vitória, Bolsonaro prometeu um governo constitucional e democrático.
Foto: picture-alliance/AP Photo/S.Izquierdo
TSE abre investigação contra Bolsonaro
A pouco mais de uma semana do segundo turno, o Tribunal Superior Eleitoral abriu uma ação para investigar suspeitas de compra de disparos de mensagens antipetistas no WhatsApp por parte de empresários aliados a Bolsonaro. O pedido de investigação foi feito pelo PT, após uma reportagem do jornal "Folha de S. Paulo". A PF também abriu inquérito para investigar a disseminação em massa de "fake news".
Foto: Reuters/R. Moraes
Bolsonaro e Haddad vão ao segundo turno
Numa das eleições mais polarizadas da história, em 7 de outubro os brasileiros levaram ao segundo turno os dois candidatos que, segundo sondagens, são também os mais rejeitados: Bolsonaro (PSL) e Haddad (PT). Favorito no Sul e Sudeste, o ex-militar teve 46% dos votos válidos contra 29% do petista, que foi o mais votado em oito estados do Nordeste e no Pará. Em terceiro, Ciro Gomes (PDT) teve 12%.
Foto: Reuters/P. Whitaker/N. Doce
Bolsonaro cresce nas pesquisas
Já líder nas pesquisas, o candidato do PSL ampliou sua vantagem no início de outubro, ultrapassando pela primeira vez a marca de 30% em sondagens do Ibope e do Datafolha. Ao longo da semana que antecedeu as eleições, o ex-capitão foi subindo e, na véspera do pleito, cruzou a barreira de 40% dos votos válidos. Após ser esfaqueado, a campanha do candidato se concentrou nas redes sociais.
Foto: Reuters/P. Whitaker
A troca de Lula por Haddad
Após meses de suspense e com aval de Lula, Fernando Haddad foi oficializado candidato à Presidência pelo PT em 11 de setembro, a menos de um mês do primeiro turno, após se esgotarem as chances de o ex-presidente concorrer. Preso e virtualmente inelegível pela Ficha Limpa, Lula era líder nas pesquisas de intenção de voto. O desafio agora será transferir votos para o ex-prefeito.
Foto: Agencia Brasil/R. Rosa
Ataque a Bolsonaro
O candidato do PSL foi esfaqueado durante um ato de campanha em Juiz de Fora, um ataque que prometia mudar os rumos da corrida presidencial. Seus adversários condenaram a agressão, e alguns chegaram a mudar o tom da campanha. Não houve, contudo, um impacto decisivo sobre o eleitorado. Ele segue líder das intenções, mas com percentual praticamente igual. A rejeição a ele, por outro lado, aumentou.
Foto: picture-alliance/dpa/Agencia O Globo/A. Scorza
O "plano B" do PT
Com Lula virtualmente inelegível, a escolha do seu vice passou a ser encarada como um trampolim para um candidato substituto. No início de agosto, o PT acabou indicando Fernando Haddad, que desde o início do ano era cotado como "plano B". Manuela D'Ávila (PCdoB) ficou com a curiosa posição não oficial de "vice do vice", assumindo a posição com Lula candidato ou não.
Foto: Agência Brasil/F.Rodrigues Pozzebom
A novela dos vices
A fase de convenções começou no fim de julho sem que a maioria dos pré-candidatos tivesse um vice. Bolsonaro teve três convites recusados até fechar com o general Mourão (PRTB). Henrique Meirelles (MDB) e Ciro Gomes (PDT) se contentaram com nomes do próprio partido. Alckmin teve convite recusado pelo empresário Josué Alencar, cuja família é ligada a Lula, antes de optar por Ana Amélia (PR).
Foto: Agência Brasil/F.Frazão
Os candidatos isolados
A jogada de Alckmin com o "centrão" acabou isolando outros candidatos. Jair Bolsonaro (PSL) tentou negociar com o PR, mas teve que se contentar com o nanico PRTB. Ciro Gomes (PDT) também viu suas investidas no grupo naufragarem. Marina Silva (Rede) e Ciro também não conseguiram apoio do PSB, que ficou neutro numa manobra do PT. Os três terminaram a fase de convenções com pouco apoio e tempo de TV.
Alckmin fecha com o "centrão"
Em julho, o tucano Geraldo Alckmin ainda patinava nas pesquisas, mas criou um fato novo na campanha ao conseguir o apoio do "centrão", as siglas que costumam emprestar seu apoio a governos em troca de cargos e verbas. Ao se aliar com PR, PP, PSD, DEM e SD, Alckmin passou a dominar 44% da propaganda eleitoral na TV. Sua coligação também recebe 48% do novo fundo de campanhas.
Foto: Getty Images/AFP/E. Sa
Candidaturas descartadas
A eleição de 2018 parecia destinada a superar o número de candidatos de 1989, quando 22 disputaram. Em abril, 23 manifestavam interesse em concorrer, entre eles o presidente Michel Temer, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, e o ex-presidente Fernando Collor. Mas eles logo desistiram ou foram abandonados por seus partidos. Outros aceitaram ser vices. Em agosto, só 13 permaneciam na corrida.
Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil
Os "outsiders" saem de cena
A possibilidade de Lula ficar de fora e o sentimento antipolítico entre a população sinalizavam que esta seria a eleição dos "outsiders". O ex-ministro do Supremo Joaquim Barbosa e o apresentador Luciano Huck chegaram a ser incluídos em pesquisas. O empresário Flávio Rocha anunciou candidatura. Em julho, todos já haviam desistido, e a disputa ficou restrita a velhos nomes da política.
Foto: Imago/ZUMA Press/M. Chello
Lula é condenado e preso
Quando anunciou, em 2016, a intenção de disputar a eleição, Lula se tornou o líder nas pesquisas. Em janeiro, porém, sua situação se complicou após uma condenação em segunda instância que o deixou virtualmente inelegível. Em abril, foi preso. Com a possibilidade de a candidatura ser barrada, o PT passou a ter dificuldades em formar alianças, e o desfecho do pleito ficou ainda mais imprevisível.
Foto: Reuters/L. Benassatto
Entra em cena o fundo de campanhas
Diante da proibição das doações por empresas, o Congresso criou em outubro de 2017 um novo fundo de R$ 1,7 bilhão para financiar candidaturas, já definindo a capacidade financeira de várias campanhas. Quase 60% do valor ficou concentrado em seis legendas: MDB, PT, PSDB, PP, PSB e PR, deixando candidatos à Presidência de pequenas e médias siglas com menos recursos na largada.