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Uma corrida sem rumo

6 de julho de 2018

A três meses das eleições, indefinição de partidos e eleitores sinaliza resultado imprevisível. Pesquisas indicam maior percentual de votos brancos e nulos desde a redemocratização.

Eleitor na cabine de votação com bandeira do Brasil ao fundo
Lvantamento do Datafolha indica um percentual de votos brancos ou nulos de até 28%, dependendo do cenárioFoto: picture-alliance/epa/Sebastiao Moreira

Julho em ano de Copa do Mundo é tradicionalmente tempo de ver políticos-torcedores tentando transformar gols e nacionalismo esportivo em votos. Mas em 2018, o cenário é diferente. Ao contrário de eleições presidenciais anteriores, até o momento são poucas imagens divulgadas por candidatos de verde e amarelo comemorando as vitórias de Neymar e companhia.

As indefinições de partidos e, consequentemente, de eleitores que não sabem em quem poderão votar no próximo dia 7 de outubro são os principais ingredientes de uma eleição que se mostra cada vez mais imprevisível.

Pesquisas apontam o número mais alto desde o início dos anos 2000 de pessoas que ainda não sabem em quem vão votar para presidente. O último levantamento do Instituto Datafolha, divulgado em meados de junho, indica um percentual de votos brancos ou nulos de até 28%, dependendo do cenário.

É o maior índice de votos brancos ou nulos em pesquisas realizadas pelo Datafolha em julho desde a redemocratização do país. Além de 2014, quando foram contabilizados 13%, apenas em 1994 as intenções de anular o voto chegaram a dois dígitos.

Para Glauco Peres, professor doutor do Departamento de Ciência Política da Universidade de São Paulo (USP), o cenário atual de falta de candidatos fortes com política bem definida, e várias pequenas candidaturas se organizando, tem somente alguns aspectos em comum com as eleições de 1989, as primeiras com voto direto após a ditadura militar.

"Há uma pulverização das candidaturas e nomes novos tentando ocupar um espaço que parece vazio na política nacional, da mesma forma que ocorreu em 1989. Mas as semelhanças param por aí. Naquela eleição estávamos em uma democracia recente, ainda nos organizando como país, o que não é o caso atual", afirma Peres.

A corrupção na política, que ocupa lugar cativo nas páginas dos jornais nos últimos anos, também gera uma descrença na política nacional por parte do eleitorado, e isso deve ser levado em consideração, aponta o cientista político David Fleischer, professor doutor da Universidade de Brasília (UnB).

"Mesmo sendo difícil prever qualquer resultado, é certo que uma coisa vai acontecer: teremos uma eleição presidencial com recorde de votos brancos e nulos. O eleitor perdeu a confiança nos políticos. Basta ver o que aconteceu na eleição suplementar para governador do Tocantins no mês passado, quando a metade dos eleitores votou branco ou nulo ou se absteve", aponta Fleischer.

Um aspecto importante neste ano é o prazo mais curto para campanhas políticas. Em outros pleitos presidenciais, em 6 de julho já começava a propaganda eleitoral gratuita na televisão e no rádio. Desta vez, a largada televisiva será dia 16 de agosto. O calendário eleitoral mais curto já foi aplicado nas eleições municipais de 2016, e Peres não acredita que isso seja um empecilho para fazer campanha.

"O prazo foi reduzido porque antes era muito grande, não há país no mundo que dê tanto tempo de TV obrigatório como o Brasil para fazer campanha. Os políticos nos outros países se esforçam para ir às ruas e alcançar o eleitor", afirma.

"Na campanha do [presidente] Emmanuel Macron, na França, por exemplo, houve um grupo bem grande de voluntários batendo de porta em porta para explicar as propostas do candidato", exemplifica.

Polarização PT x PSDB fica para escanteio

As últimas seis eleições presidenciais no Brasil foram marcadas por uma polarização política entre PSDB e PT, dois partidos que, por motivos diferentes, ainda têm candidaturas incertas.

Do lado tucano, Geraldo Alckmin se declarou candidato ainda em maio, mas não cresce nas pesquisas e vê o apoio do seu próprio partido vacilar em alguns momentos.

Para o PT, o problema é ainda maior. O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, preso desde abril em Curitiba após ser condenado em segunda instância no processo do tríplex, ainda não sabe se poderá ou não ser candidato.

Apesar de Lula teoricamente não poder participar da disputa eleitoral deste ano – já que a Lei da Ficha Limpa impede políticos condenados de concorrerem –, o PT insiste que registrará a candidatura do ex-presidente. A decisão final caberá, então, ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE).

O suspense quanto à candidatura de Lula interfere no jogo político nacional, afirma Fleischer. As pesquisas também revelam isso. Nos cenários sem Lula, os votos brancos ou nulos chegam a 28% atualmente, mas o percentual cai para 17% se o líder petista estiver na disputa.

"A indefinição quanto a se Lula poderá concorrer ou não atinge as pessoas que querem votar nele e também os outros partidos de esquerda que querem absorver esses votos em caso de ausência", afirma Fleischer.

"Aí você pode ter um nome do próprio partido, como o de Fernando Haddad, que já é citado nas pesquisas; ou nomes de outros partidos, como os de Ciro Gomes (PDT), Guilherme Boulos (Psol), Manuela d'Ávila (PCdoB) e Marina Silva (Rede) tentando assumir esse papel que ficará vazio na política nacional."

No meio desse vendaval de incertezas, Jair Bolsonaro (PSL) vai liderando as pesquisas, mesmo que ainda não tenha um programa de governo pronto para apresentar, assim como os demais pré-candidatos.

"Por enquanto temos apenas ideias vagas de todos os pré-candidatos, como a de que são contra a corrupção. Ainda não apresentaram propostas concretas de governo, e o tempo está passando", considera Peres.

"Bolsonaro lidera, mas o índice de rejeição dele também é muito alto. Isso faz com que seja um candidato com poucas chances em um eventual segundo turno. Por isso, o prognóstico de um resultado ainda é tão difícil", conclui.

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