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UE descumpre promessa de acolher 50 mil refugiados

Tom Wills md
16 de outubro de 2019

Bloco cumpriu apenas 75% da cota prevista em plano de reassentamento acordado há dois anos, revela levantamento da DW. Milhares de migrantes que vivem em campos na Líbia e no Níger permanecem num limbo.

Pessoas carregando fardos passam por tendas brancas com as iniciais da Acnur em local desértico
Campo de refugiados do Acnur a poucos quilômetros da fronteira da Líbia com a TunísiaFoto: picture-alliance/Photoshot

Governos europeus, incluindo o alemão, não cumpriram o compromisso de receber 50 mil refugiados até este mês, assumido num programa de reassentamento lançado pela União Europeia (UE) há dois anos. O acordo estipula 31 de outubro de 2019 como prazo final, mas um levantamento feito pela DW revelou que até metade de outubro apenas 37.520 pessoas chegaram à Europa no âmbito do programa.

Um porta-voz da Comissão Europeia admitiu que a meta não será atingida até o final de outubro. Entre os afetados, estão os milhares de migrantes detidos em campos na Líbia. O Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (Acnur) disse que o lento progresso dos países europeus no cumprimento de suas promessas foi um dos fatores que impediram a retirada de pessoas que enfrentam violência em meio à ilegalidade e à guerra civil.

Dimitris Avramopoulos, comissário de migração da UE, disse estar "esperançoso" de que as promessas restantes possam ser cumpridas até o final do ano. "Eu parabenizo e continuo pedindo aos Estados-membros que intensifiquem seus esforços e garantam o cumprimento de suas promessas o mais rápido possível", disse Avramopoulos à DW.

Mariam, originária do Sudão, foi retirada da Líbia pelo Acnur e agora aguarda ser transferida para o vizinho Níger. Ela vive em um abrigo temporário em um campo de refugiados do Acnur no deserto. Ela conta que teme pelo seu futuro enquanto aguarda o reassentamento – e o fim de sua busca por segurança. "Estou cansada. Estou muito cansada", diz.

Os campos do Acnur no Níger estão lotados, com pessoas esperando para serem reassentadas, o que significa que não é mais possível transferir mais pessoas da Líbia para o país.

O papel de diferentes países

A Alemanha foi um dos países que lideraram a iniciativa de reassentamento da UE. No ano passado, a chanceler federal alemã, Angela Merkel, prometeu publicamente aceitar 10.200 pessoas como parte do programa. Um porta-voz do Ministério do Interior alemão disse à DW que apenas 4.800 chegaram ao país, afirmando que o atraso na formação de um governo após as eleições alemãs em 2017 acarretou atrasos nos "complexos preparativos organizacionais" para a chegada dos refugiados.

A Suécia, por outro lado, já cumpriu sua promessa, reassentando 8.750 refugiados, assim como o Reino Unido, que recebeu 7.800. França, Holanda e Finlândia reassentaram pelo menos 80% dos números prometidos.

A Bélgica e a Irlanda cumpriram cerca de metade das suas promessas. O governo da Bélgica disse que suspendeu os reassentamentos devido ao aumento dos pedidos de asilo de pessoas que já estão no país. A Irlanda disse que espera reassentar as 537 pessoas que havia prometido até o final do ano.

Resgate dramático de refugiados no Mediterrâneo

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Portugal reassentou cerca de um terço de sua cota, mas também disse que cumprirá sua promessa até 31 de dezembro, que a UE estabeleceu como um prazo estendido para o programa.

Luxemburgo não realocou uma única pessoa, apesar de se comprometer a fornecer 200 vagas. O Ministério do Exterior do país disse que planeja acolher 50 pessoas do Níger este mês.

A DW solicitou dados dos governos dos 20 países que se comprometeram a realocar refugiados, recebendo respostas de 17 deles. Lituânia, Chipre e Malta, que prometeram acolher, juntos, 163 pessoas, não responderam.

Rota segura

O programa de reassentamento visa oferecer uma rota segura para algumas das pessoas mais vulneráveis ​​que fogem de zonas de conflito, como Síria e Líbia. Reassentamento significa que uma rota legal e segura para um outro país disposto a acolher refugiados é oferecida às pessoas registradas através do Acnur em um país que não pode acomodá-las, como o Níger.

O número de refugiados que chegam à Europa sob programas de reassentamento é relativamente pequeno quando comparado aos números dos que fazem viagens irregulares, solicitando direito de refúgio depois de chegarem. Eles também são poucos em comparação com os 3,6 milhões de refugiados sírios na Turquia.

As agências de ajuda humanitária, no entanto, dizem que o sistema de reassentamento é uma ferramenta importante para proteger as pessoas mais necessitadas. O programa da UE prevê que os países que acolhem esses refugiados recebam um pagamento de 10 mil euros por cada pessoa que realocam, para ajudar nos esforços de integração.

Os Estados Unidos e o Canadá também oferecem reassentamento, embora o presidente americano, Donald Trump, tenha reduzido drasticamente o número de vagas oferecidas pelos Estados Unidos.

"O reassentamento não está acontecendo rápido o suficiente. Precisamos de reassentamento para os casos mais urgentes, como crianças, vítimas de estupro e de tortura, idosos e pessoas com deficiência", alerta  Charlie Yaxley, porta-voz do Acnur.

O mandato do Comissário da UE Avramopoulos termina em 31 de outubro, de modo que a tarefa de coordenar qualquer futuro programa de reassentamento do bloco europeu caberá à sucessora dele, Margaritis Schinas, que esteve no centro de controvérsias antes mesmo de começar seu trabalho. 

Foto: DW

Schinas foi nomeada sob o novo título de comissária "para proteger nosso modo de vida europeu" – denominação que, segundo os críticos, imita a retórica de populistas e de extrema direita, que afirmam que a imigração ameaça os valores europeus.

Tema de campanha

Muitos partidos políticos em toda a Europa fizeram da imigração uma questão de campanha eleitoral, sobretudo partidos populistas e de extrema direita. A cobertura da mídia também contribuiu para a imagem dos imigrantes como causa de crimes violentos e pressão sobre os serviços públicos.

"O reassentamento é uma questão que divide os países da UE", afirma Leonie Jegen, especialista em migração do Instituto Arnold Bergsträsser, da Alemanha. "É algo que não está completamente fora da agenda política, mas o discurso em torno dos refugiados mudou para uma direção negativa nos últimos anos", frisa.

Apesar disso, dados sugerem que a maioria dos cidadãos da UE continua a apoiar a acolhida de refugiados. Uma pesquisa realizada pelo Pew Research Center em dez países da UE no primeiro semestre de 2018 revelou que 77% disseram apoiar o acolhimento de refugiados de países onde as pessoas fogem da violência e da guerra.

A organização de ajuda humanitária Comitê Internacional de Refugiados (IRC) pede que a UE cumpra suas promessas de reassentamento e se comprometa a acolher mais 250 mil pessoas nos próximos cinco anos. O IRC argumenta que os Estados europeus ricos estão capacitados a acomodar esse número, o que  representaria apenas 17% das pessoas que precisam de reassentamento em todo o mundo.

"Cada atraso significa mais tempo de permanência de pessoas vulneráveis no limbo e mais tempo perdido pela UE para demonstrar que está falando sério quando fala em apoiar seus parceiros e compartilhar a responsabilidade global pela proteção de refugiados", diz Lena Donner, consultora de políticas do IRC.

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