Legislação estabelece medidas para combater discriminação e avançar na garantia de direitos, como acesso ao trabalho e à moradia para transexuais, transgêneros e travestis.
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A Câmara dos Deputados do Uruguai aprovou nesta sexta-feira (19/10) a Lei Integral para Pessoas Trans, que estabelece medidas para combater a discriminação e avançar na garantia de direitos, como o acesso ao trabalho e à moradia, para pessoas trans (transexuais, transgêneros e travestis).
Após ter recebido o aval do Senado, a Câmara aprovou a lei com 62 votos a favor de um total de 88 votos. Não apenas os representantes da coalizão governamental Frente Ampla (FA), mas deputados da oposição votaram sim. A legislação ainda precisa ser promulgada pelo governo.
A lei foi discutida numa sessão que começou na quinta-feira e durou mais de 10 horas, terminando nesta madrugada, após o discurso de pelo menos 40 parlamentares, que expuseram seus argumentos a favor e contra.
A deputada Manuela Mutti, da Frente Ampla, afirmou que a aprovação faz com que o Uruguai avance não apenas "em direitos, em democracia, mas também nas possibilidades de realmente ter uma sociedade mais participativa e mais justa".
"Embora todos nós tenhamos direitos desde que nascemos, com o passar do tempo se conhece o país real, o país legal, e então nos damos conta que ainda há um caminho muito longo para percorrer e que necessitamos legislar mais pontualmente em certas situações. Esta população tem permanentemente os direitos violados, e não deveria ser assim", sustentou Mutti.
A lei estabelece facilidades para a mudança de nome das pessoas trans no registro civil e obriga os poderes Legislativo, Executivo e Judicial, governos regionais, entidades autônomas e outras repartições públicas a destinar, por ano, ao menos 1% das vagas de emprego para essa parcela da população.
Além disso, o Instituto Nacional de Emprego e Formação Profissional do Uruguai deve determinar uma cota "não inferior a 1%" dos seus programas de capacitação para as pessoas trans.
Um dos artigos, que despertou polêmica na opinião pública e entre os legisladores, estabelece que menores de 18 anos não necessitam da autorização dos pais para mudar seu nome ou receber tratamento hormonal.
"Pessoas menores de 18 anos devem comparecer para solicitar a mudança de nome e sexo acompanhados de seus representantes legais, ou credenciados em seus conhecimentos da realização do trâmite", ressalta a legislação. Em caso de não obter autorização, o menor poderá recorrer judicialmente.
O deputado Geraldo Amarilla, do conservador Partido Nacional, foi um dos parlamentares que demonstraram rejeição ao tratamento hormonal para menores, mesmo que houvesse autorização dos pais. E reclamou por a questão não poder ser abordada no plenário.
"A mudança de sexo afeta a família. O genótipo ou é XX [mulher] ou XY [homem], não há outra possibilidade. Deve haver respeito pelas pessoas transexuais, mas também pela imensa maioria da população heterossexual", disse antes da votação. "Se esta lei for aprovada, o lobo estará nas escolas, tentando impor uma ideologia à cabeça das crianças, gerando privilégios preocupantes, criando riscos à saúde humana, com efeitos irreversíveis."
Outro artigo que foi muito criticado é o que dita que as pessoas trans, nascidas antes de 31 de dezembro de 1975, que comprovem ter sido vítimas de violência institucional ou privadas de sua liberdade por forças de segurança, possuem o direito a uma reparação econômica por parte do Estado.
Os principais pontos da Declaração Universal dos Direitos Humanos
Proclamada em 1948, carta é válida para todos os Estados-membros das Nações Unidas. Mas ainda há um longo caminho até que o documento seja implementado para todos, em todo o mundo.
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Direitos iguais para todos (Artigo 1°)
"Todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e em direitos." Em 10 de dezembro de 1948, a Assembleia Geral das Nações Unidas proclamou em Paris a Declaração Universal dos Direitos Humanos. O ideal é claro, mas continua muito distante de encontrar aplicação concreta.
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Ter e viver seus direitos (Artigo 2°)
Todos os direitos e liberdades da Declaração se aplicam a todos, que podem invocá-los independente de "raça, cor, sexo, língua, religião, opinião política ou de outra natureza, origem nacional ou social, fortuna, nascimento ou qualquer outra condição". No nível internacional, contudo, é quase impossível reivindicar esses direitos.
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Direito à vida e à liberdade (Artigos 3°, 4°,5°)
"Todo indivíduo tem direito à vida, à liberdade e à segurança pessoal." (3°) "Ninguém será mantido em escravidão ou servidão." (4°) "Ninguém será submetido à tortura, nem a tratamento cruel, desumano ou degradante" (5°).
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Igualdade perante a lei (Artigo 6° a 12)
Toda pessoa tem direito a um julgamento justo e à proteção da lei (6°, 8°, 10, 12). Todos são considerados inocentes até que a sua culpabilidade seja comprovada (11). "Todos são iguais perante a lei" (7°) e "Ninguém pode ser arbitrariamente preso, detido ou exilado" (9°).
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Ninguém é ilegal (Artigos 13, 14, 15)
"Todo indivíduo tem o direito de livremente circular e escolher o seu domicílio dentro de um Estado". "Todos têm o direito de deixar qualquer país" (13). "Toda pessoa sujeita a perseguição tem o direito de procurar asilo em outros países" (14). "Todo indivíduo tem o direito a ter uma nacionalidade" (15).
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Contra os casamentos forçados (Artigo 16)
Homens e mulheres têm direitos iguais antes, durante e depois do casamento. Um casamento "será válido somente com o livre e pleno consentimento dos futuros esposos". A família tem direito à proteção da sociedade e do Estado. Mais de 700 milhões de mulheres em todo o mundo vivem em um casamento forçado, afirma o Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef).
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Direito à propriedade (Artigo 17)
"Toda pessoa tem direito, individual ou coletivamente, à propriedade. Ninguém pode ser privado arbitrariamente de sua propriedade." Ainda assim, seres humanos são expulsos de suas terras em todo o mundo, por não terem documentos válidos – a fim de abrir caminho para o desenvolvimento urbano, a extração de matérias primas, a agricultura, ou para uma barragem de hidrelétrica, como no Brasil.
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Liberdade de opinião (Artigos 18, 19, 20)
"Toda pessoa tem direito à liberdade de pensamento, de consciência e de religião" (18). "Todo indivíduo tem direito à liberdade de opinião e de expressão" (19). "Toda pessoa tem direito à liberdade de reunião e associação pacíficas" (20).
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Direito à participação (Artigos 21, 22)
"Todo indivíduo tem o direito de tomar parte no governo de seu país, diretamente ou por intermédio de representantes livremente escolhidos" (21). Há um "direito à segurança social" e garantia de direitos econômicos, sociais e culturais, "que são indispensáveis à dignidade" (22).
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Direito ao trabalho (Artigos 23 e 24)
"Toda pessoa tem direito ao trabalho". "Toda pessoa tem direito a igual remuneração por igual trabalho". "Toda pessoa que trabalha tem direito a uma remuneração justa e satisfatória" e pode participar de um sindicato (23). "Toda pessoa tem direito ao lazer" (24).
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Uma vida digna (Artigo 25)
"Toda pessoa tem direito a um padrão de vida capaz de assegurar a si e à sua família saúde e bem-estar, inclusive alimentação, vestuário, habitação, cuidados médicos e os serviços sociais necessários". "A maternidade e a infância têm direito a cuidados e assistência especiais." No mundo inteiro, mais de 2 bilhões estão subnutridos, mais de 800 milhões passam fome.
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Direito à educação (Artigo 26)
"Toda pessoa tem direito à educação". O ensino fundamental deve ser obrigatório e gratuito para todos. "A educação deve ser orientada no sentido do pleno desenvolvimento da personalidade humana e do respeito aos direitos humanos." Na prática, 750 milhões de pessoas no mundo são analfabetas, das quais 63% são mulheres e 14% são jovens entre 15 e 24 anos, afirma o relatório sobre educação da Unesco.
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Arte e ciência (Artigo 27)
"Toda pessoa tem direito de participar livremente da vida cultural da comunidade, de fruir as artes e de participar do progresso científico". Todos os "autores de obras de ciência, literatura ou arte" estão protegidos legalmente. Hoje, a distribuição digital de muitas obras é algo controverso. Muitos autores veem seus direitos autorais violados pela distribuição na internet.
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Direitos indivisíveis (Artigos 28, 29, 30)
"Toda pessoa tem direito a uma ordem social e internacional em que os direitos e liberdades possam ser plenamente realizados" (28). "Toda pessoa tem deveres para com a comunidade" (29). Nenhum Estado, grupo ou pessoa pode limitar os direitos humanos universais (30). Todos os Estados-membros da ONU assinaram a Declaração Universal dos Direitos Humanos.