Imagens de 1989 mostram reunião secreta que levou à escolha de Ali Khamenei, contra sua própria vontade, como líder supremo iraniano: "Quem acredita na minha autoridade religiosa?"
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O aiatolá Ali Khamenei detém o comando no Irã como líder supremo há 28 anos, período no qual o país passou por protestos, agitações, sanções internacionais e crises financeiras. Mas, só agora, tornou-se público um vídeo que mostra mais de perto as circunstâncias de sua eleição. As imagens geraram intenso debate e chacoalharam a política iraniana.
O vídeo mostra uma reunião realizada em 4 de junho de 1989 pela Assembleia dos Peritos, um grêmio formado por clérigos muçulmanos, responsável por eleger o líder supremo (chefe de Estado e maior autoridade política e religiosa do país). Ruhollah Khomeini, líder da revolução de 1979 e fundador da República Islâmica, havia morrido um dia antes.
A Assembleia dos Peritos estava sob pressão – o cargo de líder supremo precisava ser preenchido. O aiatolá Hussein Ali Montazeri fora escolhido para a sucessão. Mas caiu em desgraça dois meses e meio antes da morte de Khomeini por ter criticado publicamente violações dos direitos humanos cometidas pelo regime iraniano.
Subitamente, portanto, o Irã ficou sem líder. De forma surpreendente, a assembleia, reunida com urgência pelo aiatolá Hashemi Rafsanjani (presidente do Irã entre 1989 e 1997), decidiu de comum acordo por um novo candidato apenas algumas horas depois.
A divulgação das imagens em vídeo mostra que a escolha foi feita transgredindo a Constituição da República Islâmica e contra a própria vontade de Khamenei, que na época não era um marja (grande aiatolá), status necessário par ser líder supremo.
Uma série de participantes da reunião histórica – mas, sobretudo, o presidente do encontro, Rafsanjani – insistiu que o único sucessor possível de Khomeini era Ali Khamenei, que deveria ocupar a liderança suprema do Irã de forma provisória por, no máximo, um ano, até que um referendo decidisse uma nova regulamentação da Constituição.
O próprio Khamenei julgou sua indicação com um olhar incrédulo e um meneio da cabeça. Seu discurso, proferido logo em seguida, transmite total insegurança: "Quem vai me aceitar como líder? Quem de vocês acredita na minha autoridade religiosa?" Fica claro que Khamenei se considera inapto para o cargo:
"Seria preciso chorar sangue por uma sociedade islâmica que apenas considera a possibilidade de me eleger como seu líder", afirmou.
Mas Rafsanjani demonstrou não se importar nem um pouco com as ressalvas do eleito, simplesmente encerrando o debate e exigindo que os membros da assembleia votassem. E, apesar de tudo, eles se pronunciaram a favor de Khamenei.
Para o regime, o vídeo aparece num momento difícil. Especialistas veem uma ligação da divulgação com uma luta silenciosa pela sucessão de Khamenei. Atualmente, circulam rumores de que ele sofre de uma doença grave. E, no momento, não existe um sucessor designado.
Além disso, muitos iranianos também veem no vídeo a prova mais recente de que o regime iraniano se baseia em mentiras e fraudes e que despreza os próprios padrões religiosos e morais.
O clérigo iraniano e crítico do regime Hassan Eshkevari, que vive na Alemanha, também acredita que a divulgação do vídeo, logo depois dos protestos realizados no início de janeiro, é um combustível explosivo para a sociedade iraniana. Segundo Eshkevari, a guerra de poder entre reformistas e conservadores linha dura deverá se agravar ainda mais, e as manifestações antirregime serão cada vez mais difíceis de reprimir.
Os 11 dias da Revolução Islâmica
No início de 1979, o xá Reza Pahlavi era derrubado no Irã. A Revolução Islâmica transformou a monarquia de até então num Estado religioso liderado por um sacerdote muçulmano. O clímax da revolução em imagens.
Foto: akairan.com
Retorno a Teerã
1º de fevereiro de 1979: O aiatolá Ruhollah Khomeini retorna do exílio em Paris para Teerã. Ele é recebido com júbilo pela população no aeroporto. Durante anos, criticara o xá e sua elite política, pela repressão dos dissidentes; pela "ocidentalização" do Irã – aos olhos de Khomeini, excessiva; e, acima de tudo, por seu estilo de vida dissoluto, de luxo decadente.
Foto: akairan.com
À espera do salvador
Cerca de 4 milhões de iranianos aguardaram para saudar a procissão de veículos que levou Khomeini nesse dia até o cemitério central Behesht-e Zahra, onde ele faria seu discurso de chegada. Há quase um ano ocorriam manifestações de massa quase diárias contra o regime do xá. Desde agosto de 1978, greves gerais organizadas pela oposição paralisavam repetidamente a economia do país.
Foto: Getty Images/Afp/Gabriel Duval
Fora com o xá
O xá Reza Pahlavi já havia deixado o Irã em 16 de janeiro de 1979. Pouco antes, na Conferência de Guadalupe, ele perdera o apoio dos mais importantes governantes ocidentais, que preferiram procurar o diálogo com Khomeini. O então presidente americano, Jimmy Carter, aproveitou a ocasião para convidar o xá aos Estados Unidos, por tempo indeterminado. Ele aceitou.
Foto: fanous.com
Premiê isolado
Antes, o xá nomeara, como primeiro-ministro interino, Shapur Bakhtiar, figura de liderança da oposicionista Frente Nacional. O governante pretendia assim abrandar seus inimigos, mas sem sucesso. Bakhtiar ficou isolado dentro de seu partido por ter sido nomeado pelo xá, enquanto seus correligionários já haviam concordado em só colaborar com Khomeini.
Foto: akairan.com
Declaração de combate no cemitério
Já ao desembarcar em Teerã, o aiatolá declarou que não reconhecia o governo de Shapur Bakhtiar. Ele partiu direto do aeroporto para o cemitério central, onde fez um discurso beligerante, negando a legitimidade da monarquia e do Parlamento: ele próprio definiria o novo governo do Irã, prometeu Khomeini.
Foto: atraknews.com
Tumultos em todo o país
Em Teerã e outras cidades iranianas, os enfrentamentos violentos entre os revolucionários e os adeptos do xá prosseguiram, mesmo depois da chegada de Khomeini a Teerã. Durante dias permaneceu indefinido quem venceria os combates. Os militares decretaram toque de recolher, que praticamente nenhum iraniano respeitou.
Foto: akairan.com
Premiê interino
Em 5 de fevereiro de 1979, Khomeini entregou a chefia de governo interina a Mehdi Bazargan, da Frente Nacional. De início, parecia que o clero iria colaborar como a oposição liberal. No entanto, logo emergiram conflitos entre os dois grupos. Em 5 de novembro, Bazargan renunciou, em reação à tomada de reféns na embaixada americana em Teerã, ato tolerado por Khomeini.
Foto: akairan.com
Festejando a queda
Após a nomeação de Bazargan, numerosos cidadãos foram às ruas com a intenção de derrubar o governo interino. As Forças Armadas declararam não querer se envolver na luta de poder, privando Shapur Bakhtiar de qualquer tipo de cobertura. Ele teve que fugir da própria casa diante dos partidários armados de Khomeini. Em abril de 1979 exilou-se na França.
Foto: akairan.com
Saudação militar
Honras militares para o líder religioso: uma tropa de elite da Força Aérea iraniana saúda o aiatolá Khomeini. Os oficiais da aeronáutica, os homafaran, tiveram participação decisiva na revolução, permitindo à população o acesso a seus arsenais de munição, para a derrubada do regime de Pahlavi. Em 9 de fevereiro, a guarda imperial ainda tentou uma última reação, ao atacar uma base dos homafaran.
Foto: Mehr
Queda de monarquia
A partir daí, alastraram-se as lutas armadas entre a guarda imperial e a população. Em 11 de fevereiro de 1979 o colapso da ordem foi total: revolucionários ocuparam o Parlamento, o senado, a TV e outros órgãos estatais. Pouco mais tarde anunciava-se a derrubada da monarquia. Até hoje, o 11 de fevereiro é dia da "Revolução Islâmica" no Irã.