Vencedores do Nobel da Paz criticam Rússia na cerimônia
10 de dezembro de 2022
Ativistas de Belarus, Rússia e Ucrânia defenderam o trabalho da sociedade civil na documentação da repressão do Kremlin e acusaram Moscou de atacar civis de forma deliberada.
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Os laureados com o Prêmio Nobel da Paz de 2022 receberam neste sábado (10/12) a honraria em uma cerimônia em Oslo, na Noruega. No discurso, eles defenderam o trabalho da sociedade civil e criticaram a Rússia e seus aliados.
O ativista bielorrusso de direitos humanos Ales Byalyatski, a organização russa de direitos humanos Memorial e o Centro para as Liberdades Civis da Ucrânia são os laureados. Segundo o Comitê do Nobel, eles fizeram esforços "extraordinários" para documentar crimes de guerra, abusos de direitos humanos e abusos de poder. Eles dividiram 10 milhões de coroas suecas, o equivalente a cerca de R$ 10 milhões.
Na cerimônia na prefeitura de Oslo, Byalyatsky, que está preso em Belarus, foi representado por sua esposa, Natalya Pinchuk. Os presidentes das duas organizações, Jan Rachinsky (Memorial) e Oleksandra Matwijtschu (Centro de Liberdades Civis), compareceram à premiação.
"Ales [Byalyatski] e todos nós sabemos a importância e o risco de cumprir a missão dos defensores dos direitos humanos, especialmente, no momento trágico da agressão da Rússia à Ucrânia", afirmou Pinchuk, em discurso.
Ela também citou algumas declarações do marido. "Toda Belarus está em uma prisão", proferiu, referindo-se a um dos lemas de Bialiatski, ferrenho crítico ao governo da Rússia pelo apoio ao regime do seu país de origem.
Em sua fala, Matviychuk acusou a Rússia de atacar civis de forma deliberada, para frear a resistência e ocupar toda a Ucrânia.
A ativista ucraniana se opõe às negociações com a Rússia e garantiu que existe uma luta "entre autoritarismo e democracia", mas não entre as duas antigas repúblicas soviéticas.
"Temos que estabelecer um tribunal internacional e levar [Vladimir] Putin, Aleksander [Lukashenko] e outros criminosos de guerra à justiça", garantiu Matviychuk.
Rachinski, por sua vez, relembrou o trabalho da ONG Memorial na documentação da repressão no território russo.
"Hoje em dia, o número de presos políticos na Rússia é superior ao total de toda a União Soviética no começo do período da perestroika, na década de 1980", afirmou.
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Os vencedores
Ales Bialiatski, 60 anos, atualmente preso em Belarus, fundou a organização Viasna (Primavera) em 1996, para ajudar presos políticos e as suas famílias, na sequência da repressão do regime do presidente Alexander Lukashenko.
Bialiatski, segundo os organizadores da premiação "foi um dos fundadores do movimento democrático que surgiu em Belarus em meados da década de 1980 e dedicou a vida a promover a democracia e o desenvolvimento político no país de origem".
A organização russa Memorial foi criada em 1987, para investigar e registrar crimes cometidos pelo regime soviético, mas tem denunciado violações de direitos humanos na Rússia. O comitê no Nobel lembrou que a entidade coletou e verificou informações sobre abusos e crimes de guerra perpetrados contra a população por forças russas e pró-russas. "Em 2009, a chefe da filial do Memorial na Tchechênia, Natalia Estemirova, foi morta por causa desse trabalho."
O Centro de Liberdades Civis foi criado em Kiev em 2007, com o objetivo de promover os direitos humanos e a democracia na Ucrânia. "Ele assumiu a posição de fortalecer a sociedade civil ucraniana e pressionar as autoridades para tornar a Ucrânia uma democracia de pleno direito", observa o comitê. O centro ucraniano "tornou-se uma fonte importante para documentar crimes de guerra cometidos pela Rússia e desempenha um 'papel pioneiro' na responsabilização dos culpados".
Le (EFE, ots)
Nobel da Paz: os ganhadores controversos
Por que Yasser Arafat, as Nações Unidas ou mesmo Barack Obama receberam o Nobel da Paz? Esta pergunta é feita praticamente após cada anúncio em Oslo. A crítica ao prêmio é tão antiga quanto o próprio Nobel.
Foto: picture-alliance/dpa/B. Roald
Uma longa discussão
Já no primeiro Prêmio Nobel da Paz, para Henry Dunant, da Suíça (à esquerda), e Frederic Passy, da França (à direita), em 1901, a Comissão do Nobel estava dividida. Dunant fundou a Cruz Vermelha Internacional e, juntamente com Passy, iniciou as Convenções de Genebra. Os membros da comissão temiam que, ao tornarem a guerra "mais humana", as Convenções de Genebra pudessem torná-la mais aceitável.
Foto: public domain
Beligerante e pacificador
O ex-presidente americano Theodore Roosevelt nunca foi considerado um pacifista, por causa de seu envolvimento na Guerra Hispano-Americana. Ele ajudou os cubanos a se libertarem do colonialismo, mas logo tropas americanas chegariam a Cuba, garantindo aos EUA o controle da ilha. Roosevelt recebeu o prêmio em 1906 por outro motivo: seus esforços de paz na guerra russo-japonesa.
Foto: Getty Images
Pacificador racista
O 28º presidente dos Estados Unidos, Woodrow Wilson, recebeu o Nobel da Paz de 1919 "por suas contribuições para o fim da Primeira Guerra Mundial e a fundação da Liga das Nações", precursora da ONU. Mas ao mesmo tempo, ele acreditava na supremacia dos brancos e era um defensor da segregação racial
Foto: Getty Images
Prêmio da paz sem paz
O então secretário de Estado dos EUA, Henry Kissinger, e o líder norte-vietnamita Le Duc Tho tiveram papel decisivo nos Acordos de Paz de Paris de 1973, para acabar com a guerra no Vietnã. Mas Tho se recusou a aceitar o prêmio, alegando que ainda não havia paz. De fato, enquanto os EUA se retiraram em grande parte após os acordos, o conflito no Vietnã, no Laos e no Camboja duraria mais dois anos.
Foto: picture-alliance
De golpista a Nobel da Paz
Em 1978, Anwar Sadat (esq.), do Egito, e Menachem Begin (dir.), de Israel, acertaram um acordo de paz entre os dois países, sob mediação de Jimmy Carter (centro). No mesmo ano, Sadat e Begin receberam o Nobel. O prêmio para Sadat, no entanto, causou polêmica, pois ele participou do golpe de 1952, que derrubou o rei Farouk.
Foto: AFP/Getty Images
Manutenção da paz e omissão
Os capacetes azuis são as forças de paz das Nações Unidas. Pelo seu trabalho, eles receberam o Nobel em 1988. No entanto, não faltaram críticas nos anos seguintes: as tropas foram acusadas de abusar sexualmente de mulheres e crianças e forçá-las à prostituição. No genocídio de Ruanda e no massacre de Srebrenica, foram criticados por não intervirem.
Foto: Getty Images/A.G.Farran
Heroína vencida
Quando ganhou o Prêmio Nobel da Paz em 1991, Aung San Suu Kyi era um símbolo da luta sem violência pela democracia na sua terra natal, Myanmar. Nos anos de 2010, no entanto, ela caiu em descrédito, acusada de não proteger a minoria muçulmana rohingya do genocídio em 2017. Não lhe foi permitido tomar o poder, mas o seu partido tem a maioria no parlamento.
Foto: picture-alliance/AP Photo/D. Wong
O homem de duas caras
Embora tenha sido considerado um defensor do apartheid antes de ser presidente da África do Sul, Frederik de Klerk desempenhou um papel fundamental para o fim do regime de segregação racial em seu país. Ele tirou da prisão Nelson Mandela e outros políticos do Congresso Nacional Africano, defendeu a liberdade de imprensa e aboliu as leis do apartheid. Em 1993, ele e Mandela receberam o Nobel.
Foto: Getty Images/R.Bosch
"Ganhador indigno"
Também houve polêmica em 1994, quando o chefe da Organização para a Liberação da Palestina (OLP), Yasser Arafat, juntamente com o então premiê israelense, Yitzhak Rabin, e seu ministro de Relações Exteriores, Shimon Peres, recebeu o prêmio por seus esforços de paz no Oriente Médio. Um político norueguês até renunciou em protesto contra o Comitê do Nobel, chamando Arafat de "ganhador indigno".
Foto: Getty Images
Um mundo melhor graças à ONU?
As Nações Unidas e seu então secretário-geral, Kofi Annan, receberam o Nobel da Paz de 2001 "por seu trabalho para um mundo melhor organizado e mais pacífico". Mas os críticos acusam a ONU de não defender esses ideais e de fracassar frequentemente, porque alguns países podem bloquear resoluções e ações conjuntas no Conselho de Segurança.
Foto: Reuters
Louros antecipados para Obama
Barack Obama estava na presidência dos EUA há nove meses quando ganhou o prêmio em 2009 por seus "esforços extraordinários para fortalecer a diplomacia internacional e a cooperação entre os povos". Os críticos consideraram a homenagem prematura. Mais tarde, Obama se notabilizaria por expandir ataques com drones no Iêmen e na Líbia, algo altamente controverso, de acordo com o direito internacional.
Foto: Reuters/C. Barria
"Luta não-violenta" e ajuda a criminoso de guerra
O ex-presidente da Libéria Charles Taylor foi condenado por crimes de guerra vinculados a milhares de assassinatos, estupros e tortura. Os críticos acusam sua sucessora, Ellen Johnson Sirleaf, ministra das Finanças de Taylor, de tê-lo apoiado na violência e corrupção. No entanto, em 2011, ela ganhou o Nobel por sua "luta não violenta pela segurança das mulheres".
Foto: T. Charlier/AFP/Getty Images
Tratamento questionável a requerentes de asilo
Cercas de arame farpado, detenção, condições desumanas nos campos de refugiados: ativistas dos direitos humanos criticam as políticas de refugiados da União Europeia há anos. Mesmo assim, a UE foi homenageada em 2012 pelo "avanço da paz e da reconciliação, da democracia e dos direitos humanos na Europa".
Foto: picture-alliance/dpa/K. Nietfeld
Um pouco de paz
Abiy Ahmed mudou muito desde que se tornou primeiro-ministro etíope em 2018. No impasse do conflito fronteiriço com a vizinha Eritreia, a aproximação diplomática e a abertura das fronteiras foram incluídas. Mas o processo de paz estagnou - e enquanto Abiy goza da fama do Prêmio Nobel, na Eritreia Isayas Afewerki continua governando com mão de ferro.