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Venezuela: seis meses com dois presidentes

Johan Ramírez ca
23 de julho de 2019

Há meio ano, Juan Guaidó se autoproclamava presidente interino, com amplo apoio internacional. Do outro lado está Nicolás Maduro, sustentado pelos militares. Em seis meses de disputa pelo poder, o que cada lado alcançou?

Venezuela Juan Guaido Nicolas Maduro
Juan Guaidó e Nicolás Maduro disputam poder na VenezuelaFoto: picture-alliance/newscom/Y. Cortez

"Juro assumir formalmente os poderes do Executivo nacional como presidente encarregado da Venezuela, para conseguir a cessação da usurpação, um governo de transição e eleições livres." Com essas palavras, o autoproclamado presidente interino Juan Guaidó arrebatou o cenário político em 23 de janeiro de 2019. Um juramento que, em questão de horas, colocou seu nome na agenda de governos pelo mundo, tendo ele recebido o apoio imediato de uma dezena de países. Assim, muitos previram a queda iminente de Nicolás Maduro.

Seis meses se passaram. O chavismo ainda está no poder, e Guaidó continua apelando para que se ignore o regime. Já é hora de pesar as vitórias e derrotas que ambos os lados tiveram nessa disputa, cujo final nem mesmo os analistas mais aventureiros se arriscam a prever.

"O erro foi subestimar a força da revolução depois de 20 anos no poder", diz Luis Vicente León, presidente do instituto de pesquisas Datanalisis. "E da mesma forma o impacto da comunidade internacional como mecanismo de pressão foi superestimado."

"Podem-se retirar todos os embaixadores e ignorar Maduro: isso é simbólico, porque na prática ele ainda é presidente, porque é ele quem tem o controle territorial", continua o analista. Essa situação não mudará, afirma, desde que a elite dominante das Forças Armadas não se afaste do regime.

De fato, os militares continuam a apoiar o chavismo. Segundo a oposição, cerca de 1.500 soldados desertaram – uma cifra pouco significativa tratando-se de um Exército que, segundo o Ministério da Defesa, possui 235 mil membros.

No entanto, o impacto de algumas deserções importantes não pode ser minimizado. A mais notável foi a do general Manuel Ricardo Cristopher Figuera, que ocupava o cargo de diretor do Serviço Bolivariano de Inteligência Nacional (Sebin) e se aliou a Guaidó.

Apoio internacional

A maior vitória que Guaidó conseguiu nesses seis meses foi no âmbito internacional. Trata-se do apoio de organizações como a Organização dos Estados Americanos (OEA), o Banco Interamericano de Desenvolvimento, o Grupo de Lima, o Grupo de Contato Internacional, o Parlamento Europeu e, acima de tudo, o título que o acompanha como se fosse seu sobrenome: "reconhecido como presidente interino por mais de 50 países."

"A comunidade internacional é o que impede que Maduro elimine Guaidó", diz Luis Vicente León. Ele explica que no passado a oposição, apesar do apoio popular, estava vulnerável devido à fraqueza das instituições, incapazes de garantir os direitos da dissidência.

Segundo a ONG Foro Penal, na Venezuela existem 590 presos políticos, enquanto 22 deputados perderam a imunidade parlamentar e dez dos principais líderes da oposição sofreram impedimento sob o governo de Nicolás Maduro. Por outro lado, embora Guaidó também tenha sido inabilitado para exercer cargos públicos em abril, o líder oposicionista viaja livremente pelo país com o objetivo de depor o regime.

Consolidando a liderança

Guaidó, presidente da Assembleia Nacional, também conseguiu o que até recentemente parecia impossível: unir a oposição sob uma única liderança. E ainda mais: ele levou as pessoas de volta às ruas. Segundo o Observatório Venezuelano de Conflito Social, entre janeiro e junho de 2019 houve uma média de 58 protestos diários no país, um aumento de 97% em relação ao mesmo período de 2018.

O autoproclamado presidente interino também consolidou sua liderança entre a população. De acordo com o Datanalisis, em janeiro o índice de aprovação de Guaidó era de 61%, cifra que caiu para 56% em maio. Esse declínio, no entanto, não o coloca em apuros, já que nenhum outro líder possui taxas de aceitação semelhantes. Nicolás Maduro, por outro lado, teve 18% de apoio em dezembro, 14% em janeiro e apenas 10,1% em maio.

Batalha por ativos

Economicamente, Guaidó também conseguiu uma importante vitória. "Recuperamos a Citgo", comemora José Guerra, deputado oposicionista na Assembleia Nacional. "Uma empresa muito lucrativa, avaliada em 10 bilhões de dólares", acrescenta. De fato, com o apoio de Washington, a oposição assumiu o controle da filial da petrolífera estatal venezuelana, a sétima maior refinaria dos Estados Unidos.

Essa medida coloca à disposição dos oposicionistas – apenas em teoria – recursos significativos. "Dela ainda não se tocou um centavo, porque primeiro precisamos de uma institucionalidade que torne o seu uso transparente", afirma o parlamentar oposicionista. Segundo ele, o novo conselho administrativo pagou uma dívida de 72 milhões de dólares em abril, e fará outra transferência de 600 milhões em outubro. Caso contrário, diz Guerra, eles teriam tomado a empresa.

Para alocar fundos para a emergência humanitária, porém, falta tempo. "Estamos trabalhando na lei estatutária", afirma o deputado. Ele diz concordar que meio ano se passou, e a necessidade dos venezuelanos não compreende burocracias, "mas é preciso ir devagar para evitar o desvio de recursos".

Certo é que seis meses se passaram desde 23 de janeiro. Nesse tempo, ocorreram 10.477 protestos (segundo o Observatório Venezuelano de Conflito Social), 2.118 detenções arbitrárias (Foro Penal), 1.569 execuções extrajudiciais (ONU) e uma crise econômica que piora a cada dia (130.060% de inflação em 2018, segundo dados oficiais).

A disputa parece estar num empate técnico, e a prova são as negociações realizadas pelas partes com a mediação da Noruega. Por ora, poucas soluções e um juramento ainda a ser honrado: Juan Guaidó não conseguiu assumir os poderes do Executivo, e seu lema de conseguir "cessar a usurpação, um governo de transição e eleições livres" continua sendo uma promessa não cumprida.

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Juan Guaidó e Nicolás Maduro disputam poder na VenezuelaFoto: picture-alliance/newscom/Y. Cortez
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