Visita histórica
18 de maio de 2011Ao mesmo tempo em que a visita da rainha Elizabeth 2º é simbolicamente vista como um compromisso com o processo de paz, ainda existe uma minoria na Irlanda que se opõe à estada de quatro dias da monarca britânica, que começou nesta terça-feira (17/05).
Horas antes da chegada da rainha a Dublin, uma denúncia anônima alertou as autoridades sobre a existência de uma bomba caseira no bagageiro de um ônibus na cidade de Maynooth, a 25 quilômetros da capital. O Exército irlandês destruiu o explosivo numa detonação controlada.
Na segunda-feira, militantes irlandeses que são contra o processo de paz com o Reino Unido haviam alertado para a existência de uma bomba perto do Palácio de Buckingham, em Londres. O alarme provocou a interdição de boa parte da região central da cidade. A pessoa que deu o aviso teria usado um código conhecido apenas pela polícia, o que deu credibilidade à ameaça.
Mal recebida
A viagem da rainha é a primeira do gênero em cem anos de frágeis relações entre os dois países, marcadas pela independência irlandesa e o controle britânico sobre os seis condados da Irlanda do Norte. O governo irlandês anunciou a visita de Elizabeth 2º como um sinal de que o processo de paz segue firme.
A segurança foi reforçada em Dublin, onde a rainha irá passar a maior parte do tempo. Nas últimas semanas houve um elevado número de alertas de segurança, provavemente relacionados à visita. Um grupo autointitulado Real IRA fez ameaças violentas.
Numa mensagem recente, os militantes disseram que a rainha era "procurada por crimes de guerra na Irlanda e que não era bem-vinda no território irlandês... Nós faremos o nosso melhor para assegurar que ela e aqueles que agem como cheerleaders [animadores de torcida] dela recebam a mensagem".
Aproximação cautelosa
Milhares de policiais estão de plantão durante a visita, e o Exército também está nas ruas da capital. Segundo consta, a polícia teria investigado as residências que estão ao longo da rota por onde a rainha deve passar.
"Acreditamos que a visita sofrerá algum tipo de distúrbio", disse Brian Leeson, presidente do Eirigi, um partido político republicano socialista cujo objetivo principal é a reincorporação dos seis condados da Irlanda do Norte à República da Irlanda. Segundo Leeson, o Eirigi planejou uma série de marchas de protesto. Para ele, uma visita como essa só poderia acontecer após o Reino Unido abrir mão dos seis condados.
A chegada da rainha aconteceu no aniversário dos ataques de 1974 em Dublin e Monaghan, onde explosões de carros mataram 34 pessoas. Até hoje, ninguém assumiu a responsabilidade pelos ataques, mas agentes britânicos foram acusados de estarem envolvidos.
Leeson considerou inapropriada a data de início da visita. "Um dos locais que a rainha deve visitar é o Garden of Remembrance, na Praça Parnell, que está apenas a 200 metros de onde 11 pessoas morreram nos ataques de Dublin Monaghan", comentou.
Tranquilidade entre a maioria
Nas ruas de Dublin, no entanto, a impressão é de que a maioria das pessoas deseja que a visita transcorra pacificamente e sem incidentes. Alguns cidadãos mostram-se indiferentes. Mas há também os que afirmam que a visita é boa para a Irlanda, afinal "conseguimos um grande empréstimo da União Europeia, temos que mostrar um lado bom", diz um dublinense.
Algumas dessas opiniões foram ecoadas pelo partido Fianna Fail, que, apesar de não estar mais no governo, é visto como aquele que abriu caminho para que a visita acontecesse. O partido ajudou a negociar o Acordo da Sexta-Feira Santa, assinado em 1988, que resultou na redução da violência na Irlanda do Norte.
Apesar das raízes republicanas do Fianna Fail, o senador Daragh O'Brien deu boas-vindas à visita. "Eu acho que isso mostra a maturidade que a política irlandesa atingiu nos últimos anos. Eu mesmo sou um republicano, e acredito numa Irlanda unida e numa república de 32 condados, mas acredito nisso com base no consentimento de todas as pessoas da ilha."
De olho no futuro
O'Brien admitiu que aqueles que se opõem à visita têm razões legítimas para tal posição, mas adicionou que o país precisa se distanciar dos problemas do passado e que a passagem da rainha Elizabeth 2º é um investimento no futuro da Irlanda.
"É o passo final para a normalização completa das relações entre a Irlanda e o Reino Unido. Nós trilhamos um longo caminho, temos uma história em comum. As pessoas têm visões diferentes sobre o tema, mas desde o Acordo da Sexta-Feira Santa nós avançamos como dois países. Nós somos vizinhos. Eles são o nosso maior parceiro comercial e nós somos um dos maiores parceiros comerciais deles... para mim, tudo isso faz sentido", argumentou o senador do Fianna Fail.
Apesar de a ameaça dos dissidentes republicanos ainda causar preocupação, o governo irlandês insistiu que todas as medidas foram tomadas para assegurar que a visita seja a primeira de muitas da família real britânica.
Autor: Lynsey Kiely, de Dublin (np)
Revisão: Alexandre Schossler