Volker Braun e a lucidez perante os sistemas
9 de março de 2013Volker Braun é hoje um dos mais respeitados autores alemães, com uma reputação sedimentada em seu excelente trabalho poético. Como crítico do regime comunista da República Democrática Alemã (RDA), é visto como intelectual íntegro e reverenciado pelas gerações mais novas.
Ele é ganhador dos mais importantes prêmios literários do país, entre os quais o Georg Büchner de 2000. Mantém-se como uma das vozes críticas mais ativas da cena literária e poética germânica, a partir de Berlim, cidade onde iniciou sua carreira e onde segue vivendo.
Mas Volker Braun é um daqueles dínamos alemães, praticante de vários gêneros literários: poeta, dramaturgo e prosador, da mesma forma que Bertolt Brecht ou, no pós-guerra, Heiner Müller e Thomas Brasch. No Brasil, onde o fenômeno parece ocorrer com menor frequência, talvez o maior exemplo entre os modernistas tenha sido Oswald de Andrade, e certamente Hilda Hilst, a partir dos anos 1950.
Choques com o regime
Nascido em Dresden, em 7 de maio de 1939, Braun estudou Filosofia na Universidade de Leipzig. Membro do Partido Socialista Unitário da Alemanha (SED, do alemão), não tardou para que sua mente crítica começasse a expor as contradições do regime em que vivia, levando-o cedo a problemas com o governo.
Entre 1965 e 1967, trabalhou como dramaturgo no Berliner Ensemble, a convite de Helene Weigel, a atriz e companheira de Bertolt Brecht. Dessa época são suas primeiras publicações, mostrando-se já como escritor plural ao lançar em 1965 a peça Die Kipper e a coletânea de poemas Provokation für mich (Provocação para mim).
A Primavera de Praga e outros acontecimentos do convulsivo ano de 1968 levariam o autor, como tantos outros intelectuais de esquerda, a uma desilusão completa com as possibilidades de uma instituição mais democrática no Bloco Socialista. Suas críticas levam-no a ser cada vez mais monitorado pela Stasi, a polícia secreta da RDA, e a maiores dificuldades para viver como escritor.
No entanto, Braun recusa-se a deixar o país e emigrar para o Ocidente, acreditando na necessidade de que mentes críticas permaneçam dentro do regime. A década de 70 veria seu retorno ao teatro, primeiramente no Deutsches Theater e mais tarde novamente no Berliner Ensemble. Em 1977, publicou um dos mais importantes romances da Alemanha Oriental, Unvollendete Geschichte (História inacabada).
Depois do Muro
Entre reconhecimento e perseguição, seu país lhe concede distinções como o Prêmio Lessing e o Prêmio Nacional, ao mesmo tempo que seus trabalhos são atacados como anarquistas e absurdos. Mesmo após a Queda do Muro e a Reunificação, Volker Braun segue sendo um dos analistas mais lúcidos do fracasso da experiência socialista alemã.
Sua mente parece extremamente apta para o reconhecimento das contradições de qualquer sistema político, na forma que seja. Em seu conhecido poema O Chicago! O Widerspruch!, Volker Braun escreve:
Oh Chicago! Oh discrepância! / Brecht, teu charuto acabou se apagando? / Durante os terremotos que provocamos / Nos Estados construídos sobre a areia. / O socialismo vai-se, lá vem Johnny Walker. / Não consigo fixá-lo nos pensamentos / Que aliás estão caindo. As ruas quentes / De outubro são as trilhas frias / Da economia, Horácio. Enfio o chiclete / na bochecha / Eis que é chegado o nada significante.
Seu trabalho é pouco conhecido no Brasil, mas, em 2007, teve alguns poemas incluídos na antologia com cinco autores contemporâneos alemães Entre a guerra e o muro (Belo Horizonte: Tessitura, 2007), ao lado de Kurt Bartsch, Hans-Curt Flemming, Helmut Heissenbüttel e Reiner Kunze e organizada por Wink e Rui Rothe-Neves. Espera-se que seja apenas uma primeira pequena mostra no país do trabalho desse poeta e crítico tão lúcido.
Autor: Ricardo Domeneck
Revisão: Augusto Valente