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HistóriaBrasil

Volkswagen vai indenizar vítimas da ditadura no Brasil

23 de setembro de 2020

Investigações apontaram que montadora alemã colaborou de maneira sistemática e ativa com o regime militar brasileiro. Agora, ex-funcionários perseguidos deverão receber R$ 36 milhões em indenizações, diz imprensa alemã.

Fábrica da Volkswagen em São Bernardo do Campo, em foto dos anos 70
Fábrica da Volkswagen em São Bernardo do Campo, em foto dos anos 70Foto: Volkswagen do Brasil

A montadora alemã Volkswagen vai indenizar ex-funcionários de sua filial brasileira que foram afetados pela colaboração sistemática da empresa com a ditadura militar no Brasil. A informação foi divulgada pela imprensa alemã nesta quarta-feira (23/09).

Segundo o jornal Süddeutsche Zeitung e as emissoras estatais NDR e SWR, o acordo de compensação será assinado pela companhia nesta quinta-feira em São Paulo.

Os veículos disseram que a subsidiária brasileira da VW deverá pagar cerca de R$ 36 milhões em indenizações individuais e coletivas. Grande parte do valor irá para associações de vítimas formadas por ex-funcionários e seus familiares. Ao todo, mais de 60 pessoas serão beneficiadas.

A compensação está relacionada a uma ação movida há cinco anos contra a empresa em nome de ex-empregados que trabalharam na fábrica da Volkswagen em São Bernardo do Campo durante a ditadura militar. Com o acordo indenizatório, a companhia evita uma disputa judicial.

O historiador Christopher Kopper, da Universidade de Bielefeld, que foi contratado pela empresa para apurar a colaboração da VW com a ditadura brasileira e elaborou um relatório independente sobre o caso, afirmou que o acordo desta quinta-feira será histórico.

"Será a primeira vez que uma companhia alemã aceita sua responsabilidade por violações de direitos humanos contra seus próprios funcionários por eventos que ocorreram após o fim do nacional-socialismo", disse o especialista aos veículos alemães.

Em sua reportagem, o Süddeutsche Zeitung aponta que a decisão é "um sinal importante, justamente porque o presidente populista de direita Jair Bolsonaro já glorificou a ditadura militar da época". "Para os trabalhadores da fábrica, significa uma justiça pela qual eles tiveram que esperar por décadas", completou o jornal.

A colaboração da Volks com a ditadura

Em 2017, uma investigação realizada pelo Ministério Público Federal (MPF) confirmou que a montadora alemã colaborou de maneira sistemática e ativa com o regime que governou o Brasil de 1964 a 1985.

Um relatório de 406 páginas apontou que a filial brasileira da VW espionou os próprios funcionários com interesse de descobrir opiniões políticas, e documentou a espionagem por escrito. Essa documentação era enviada ao Departamento de Ordem Política e Social (Dops).

"A Volks teve um papel ativo. A montadora não foi obrigada a isso. Eles fizeram parte porque queriam", escreveu Guaracy Mingardi, perito que assinou o relatório do MPF.

O documento revelou ainda que o departamento de segurança da montadora permitiu a prisão de funcionários dentro de suas fábricas, mesmo sem mandados. Após a detenção, funcionários que eram considerados opositores ao regime foram torturados durante meses.

O texto acusou a VW de ter observado os funcionários antes das prisões. "É improvável que a Volkswagen não tenha participado ativamente dessas investigações", destaca o texto, acrescentando que o departamento de segurança da montadora teve um papel central na atividade repressora. Vários ex-soldados foram contratados pela empresa para trabalhar como seguranças.

Segundo o relatório do MPF, logo após o golpe de 1964 a filial brasileira da Volks compartilhava da ideologia do regime e, a partir do fim da década de 1970, tinha interesses comerciais, ao desejar utilizar o "maquinário repressivo do Estado" para impedir greves.

O documento não abordou quão profundo seria o conhecimento da sede da montadora, em Wolfsburg, na Alemanha, sobre as atividades da filial brasileira. Porém, uma análise extensa de documentações, realizada por Kopper, o historiador contratado pela Volks, sugeriu que a sede tomou conhecimento desses atos o mais tardar em 1979.

O relatório do investigador independente foi divulgado pela Volkswagen em dezembro de 2017, detalhando a colaboração da filial brasileira com o aparato repressivo do regime militar.

O documento de 114 páginas apontou que a montadora foi "irrestritamente leal" aos militares e que seu próprio aparato de segurança patrimonial facilitou a identificação e prisão de funcionários "subversivos" – sendo ao menos um deles torturado em uma unidade da empresa.

A filial também demitiu trabalhadores envolvidos com sindicatos e alimentou e compartilhou com outras empresas "listas negras" com nomes de funcionários.

O texto, no entanto, diz que não foram encontradas provas de uma colaboração institucionalizada da montadora com a repressão estatal. De acordo com o documento, os membros da segurança patrimonial – vários militares da reserva – agiram por iniciativa própria ao espionar e entregar funcionários ao regime. Não há documentos que indiquem que a diretoria no Brasil deu ordens nesse sentido.

EK/afp/rtr/ots/dw

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