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Votação que poupou Dilma pode abrir precedente

Jean-Philip Struck1 de setembro de 2016

Aliados de Eduardo Cunha admitem que defesa pode tentar manobra similar à que impediu perda dos direitos políticos da ex-presidente. Para especialista, lei não permite, mas Judiciário pode interpretar diferente.

Brasilien Eduardo Cunha beobachtet Protest
Foto: Reuters/U. Marcelino

A decisão do Senado de fatiar em duas partes a votação do impeachment pegou o público brasileiro de surpresa. Pelo entendimento dos senadores, Dilma perdeu o cargo de presidente, mas manteve o direito de poder ocupar cargos públicos e em tese concorrer em eleições. O resultado contrastou com o do impeachment de Fernando Collor em 1992, que teve os direitos políticos cassados durante o julgamento.

O resultado das votações também levantou a suspeita da costura de algum acordo entre o PMDB do presidente Michel Temer e o PT de Dilma Rousseff. A presidente perdeu o cargo por 61 votos a 20. Já na votação sobre a perda dos direitos políticos, os adversários de Dilma reuniram apenas 42 dos 54 necessários. Dez senadores do PMDB que haviam votado pela cassação acabaram mudando voto ou se abstiveram na segunda votação, beneficiando Dilma.

Inicialmente, estava previsto que os senadores votassem sobre a possibilidade de Dilma perder o cargo – a perda dos direitos políticos por oito anos seria automática se o impeachment fosse aprovado.

No entanto, logo no início dos trabalhos, o presidente do Supremo, Ricardo Lewandowski, recebeu um pedido de um grupo de senadores petistas para que ocorressem duas votações, uma sobre o cargo e outra sobre os direitos. Como a decisão foi apresentada por uma bancada com número considerável de senadores, o pedido foi acolhido pelo magistrado.

Ainda durante as discussões sobre o fatiamento, alguns senadores contrários à medida questionaram se dividir as votações abriria um precedente que poderia beneficiar outros políticos no futuro, como o deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), que enfrenta um processo de cassação na Câmara.

O presidente da Casa, Rodrigo Maia (DEM-RJ), afirmou que o episódio no Senado abre espaço para que aliados de Cunha possam tentar o mesmo tipo de manobra, apresentando emendas ao texto da cassação para que a punição seja abrandada ou para tentar preservar seus direitos políticos.

“Se formos usar a mesma decisão do presidente Ricardo Lewandowski, muda o processo de cassação de qualquer um, do Eduardo ou de qualquer outro que venha depois”, disse Maia. "A decisão abriu um precedente.”

O deputado Carlos Marun (PMDB-MS), um aliado de Cunha, disse que o peemedebista deve mesmo tentar tirar vantagem do episódio. “Não há como não existir uma similaridade entre os dois processos. Pau que dá em Chico dá em Francisco”, avaliou o peemedebista.

Interpretação será decisiva

A decisão de fatiar a votação gerou protestos do PSDB e do DEM. Alguns senadores afirmaram que recorreriam ao STF para anular a segunda votação, mas depois desistiram de tomar a iniciativa ao avaliarem que um pedido nesse sentido poderia anular todo o processo, beneficiando Dilma.

Para o professor de direito constitucional Rubens Glezer, da Fundação Getúlio Vargas de São Paulo, o caso à primeira vista não pode ser aplicado como precedente para deputados e senadores, já que a lei da Ficha Limpa, que trata da inelegibilidadede de parlamentares, não pode ser objeto de discussões em plenário para determinar a sua aplicação. Ela é automática em caso de cassação.

É algo bem diferente da lei do impeachment, que pode ser interpretada com mais liberdade durante o julgamento de um presidente. Mas Glezer também adverte que, embora a lei seja clara nesse sentido, isso não quer dizer que políticos com mandatos ameaçados não tenham chance de sucesso ao tentar uma manobra como a de Dilma.

"Existe a lei, e existem os juízes. Infelizmente não temos um Judiciário que sempre segue as regras pré-estabelecidas. Alguém sempre pode recorrer ao STF, usando esse caso como exemplo, e o tribunal pode aparecer com uma interpretação nova. O Judiciário também é muitas vezes um fator de instabilidade. Não há dúvida de que esse caso vai ser usado como argumento por políticos interessados em fatiar outros pedidos de cassação. Vai depender do STF barrar tudo isso, mas nem sempre se pode esperar por isso", afirma.

Apesar de ter sido beneficiada com o resultado da segunda votação, Dilma ainda não está livre de se tornar inabilitada de se candidatar em eleições. A ex-presidente ainda enfrenta ações no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) que investigam irregularidades em suas contas de campanha. Se Dilma perder as ações, ele pode se tornar inelegível.

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