Weimar: a música entre a literatura e a arte
2 de setembro de 2005Nenhuma outra cidade alemã se identifica tão claramente com uma época histórica quanto Weimar. A capital da Turíngia deve sua fama, principalmente, ao legado de quatro homens: Christoph Martin Wieland, Johann Gottfried Herder, Friedrich Schiller e Johann Wolfgang von Goethe – célebres escritores e pensadores que a transformaram em uma metrópole intelectual européia na segunda metade do século 18. E, ainda hoje, Weimar mantém essa aura de berço da literatura clássica alemã.
Mas o que muitos desconhecem é que Weimar também possui uma história de mais de 400 anos de música. Uma história que, até o começo do século 20, permaneceu ligada à corte do ducado, mais tarde grão-ducado de Sachsen-Weimar-Eisenach.
Bach, um pequeno escândalo
Mesmo que o compositor Johann Hermann Schein tenha lá vivido apenas por um ano – de 1615 a 1616, época em que compôs sua famosa suíte instrumental Banchetto musicale –, como regente da orquestra da corte, Johann Sebastian Bach exerceu durante nove anos a função de organista e músico de câmera na corte de Weimar – período no qual compôs diversos de seus corais e cantatas.
Em 1716, ao saber que, contra todas as expectativas, não seria nomeado substituto do então regente da orquestra, Samuel Drese, Bach ofereceu seus serviços ao príncipe Leopoldo, de Anhalt-Köthen. Só que ele fez as malas sem pedir a permissão do duque Guilherme Augusto de Weimar, o que provocou um escândalo na época, conta Irina Lucke-Kaminiarz, diretora do Arquivo Musical da Turíngia.
Goethe trouxe a opereta
Da antiga orquestra da corte de Weimar, surgiu a Orquestra Estadual de Weimar, uma das mais antigas da Alemanha, segundo sua diretora, Julia Miehe. "Celebramos em 2002 nosso 400º aniversário, o que não significa que nossa orquestra tenha apenas 400 anos de idade, mas que ela está estabelecida em Weimar há 400 anos", distingue. "Isso é bastante tempo e nossa orquestra vive dessa grande tradição – tanto quanto ao repertório, como quanto ao som".
Quando assumiu sua direção teatral, Goethe engajou-se não apenas pelos jovens autores de seu tempo, mas também pelo reconhecimento da opereta, na época ainda em seus primórdios. Ele aproximou, por exemplo, o público de Weimar das composições de Mozart para o palco, das quais A Flauta Mágica foi um enorme sucesso de bilheteria, encenada 82 vezes apenas sob sua direção.
Música e literatura interligadas
A orquestra e o teatro da corte compunham grande parte da vida musical de Weimar. Mas foi graças a duas mulheres, que influenciaram fortemente o desenvolvimento cultural da cidade, que a Alemanha toda voltou os olhos para Weimar: Anna Amalia e Maria Pavlovna.
"Anna Amalia era uma pessoa muito musical. Ela mesma chegou a compor. Ela era rodeada por um círculo altamente intelectual, de forma que a vida musical da cidade estava intimamente ligada à vida literária e artística", conta Lucke-Kaminiarz. "Foi através do convite que fez a Wieland para estabelecer-se na cidade como educador que Goethe veio a Weimar. E não se pode imaginar Goethe sem a música."
Apenas dois anos depois, falecia o duque Ernesto Augusto 2º e Anna Amalia, agora viúva, se via na obrigação de assumir a liderança, já que o príncipe herdeiro Carlos Augusto era muito jovem. Durante sua regência, Anna Amalia criou as bases para o desenvolvimento cultural e intelectual da cidade.
Pavlovna: pequena e provinciana
Quando a grã-duquesa russa Maria Pavlovna chegou a Weimar em 1804, recém-casada com o sobrinho de Anna Amalia, Karl Friedrich, Weimar vivia o auge de seu desenvolvimento artístico. Mesmo assim, a mudança para a pequena cidade foi demais para a filha de czares, que até então vivera na mundana São Petersburgo. Ela até tinha esperado encontrar uma pequena cidade, mas de forma alguma tão pequena e provinciana. Pavlovna trocara a agitação da cidade grande pelo idílio bucólico.
Temendo que a cidade sofresse uma decadência cultural após a morte de Goethe, Pavlovna decidiu tomar providências. "Ela mesma tinha obtido uma ótima formação cultural em São Petersburgo e a música era sua modalidade artística predileta. É interessante acompanhar seu esforço para trazer um músico eminente, reconhecido no resto da Europa para assumir a direção do teatro após a saída de Goethe", conta Lucke-Kaminiarz.
O substituto foi Johann Nepomuk Hummel, aluno de Mozart e pianista virtuoso muito celebrado na época. Entre os anos de 1819 e 1837, em que a orquestra esteve sob sua direção, a ópera vivenciou uma enorme prosperidade em Weimar.
Após a morte de Hummel, em 1837, Pavlovna saiu novamente em busca de um substituto à altura, simplesmente pelo fato de ela mesma querer receber aulas de piano. Desta vez, Pavlovna trouxe à cidade ninguém mais, ninguém menos, que o grande compositor húngaro Franz Liszt.