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Wladimir Kaminer e a Berlim internacional

Ricardo Domeneck15 de julho de 2013

Sucesso comercial do autor nascido na Rússia evidencia gradual internacionalização da cultura alemã. "Russendisko", de 2000, é a obra mais conhecida e já virou filme.

Wladimir KaminerFoto: picture-alliance/ZB

Wladimir Kaminer é um dos mais conhecidos e rentáveis autores alemães, com ares de estrela pop. Convidado de programas de televisão, com colunas em jornais e seu próprio programa de rádio, o autor, que nasceu na Rússia mas escreve exclusivamente em alemão, é um dos fenômenos da gradual internacionalização da cultura alemã através de sua capital, Berlim.

Nascido em Moscou a 19 de julho de 1967, o contista migrou para a Alemanha Oriental meses antes da Reunificação, com um pedido de asilo político. Ao tornar-se cidadão da República Democrática Alemã, tornou-se automaticamente cidadão da República Federal da Alemanha após a Reunificação. Ainda na Rússia, o trabalho literário do autor começaria com um curso de dramaturgia no Instituto de Teatro de Moscou.

Sua carreira começou num tradicional clube do centro berlinense, o Kaffee Burger, que se tornou um centro da cena literária na cidade a partir do fim da década de 90. Kaminer lia seus contos no evento apropriadamente chamado de Reformbühne Heim & Welt [Palco reformista lar e mundo, na tradução literal], fundado por Hans Duschke e Bov Bjerg em 1995, e que existe até hoje em outro local.

Foi no Kaffee Burger que Kaminer fundou, com Yuriy Gurzhy, a festa Russendisko, mais tarde o nome do seu primeiro livro de contos, publicado em 2000 e que já vendeu cerca de 1 milhão de cópias. Outros volumes incluem Schönhauser Allee (2001), Militärmusik (2001), Die Reise nach Trulala (2002), Helden des Alltags (2002), Karaoke (2007) e Küche totalitär. Das Kochbuch des Sozialismus (2007).

"Die Reise nach Trulala"

Seu estilo mescla o autobiográfico com o fictício, sem deixar claro onde se pode traçar a fronteira entre um e outro. O primeiro conto do livro, Russos em Berlim, conta a história de sua viagem à capital alemã, em 1996, por ter ouvido que judeus eram bem-vindos. Kaminer diz pertencer à "quinta onda" de imigração russa na Alemanha. A segunda teria sido "entre 1941 e 1945" [referência aos soldados do Exército Vermelho], o que demonstra seu humor, uma das chaves de seu sucesso.

Seus contos assemelham-se a um gênero que sempre teve popularidade no Brasil, mas nunca encontrou muitos praticantes entre os alemães: a crônica. A linguagem direta e o humor aproximam-no muito mais de autores brasileiros, como João Antônio, Rubem Braga ou mesmo Luis Fernando Verissimo, que de contistas propriamente ditos.

A cultura literária alemã sempre recebeu influxos importantes de autores nascidos fora do país, pertencentes a minorias germânicas espalhadas por regiões fronteiriças ou de territórios que pertenceram ao Império Austro-Húngaro. Basta pensar em estrelas das letras germânicas, como Franz Kafka e Rainer Maria Rilke, ou, no pós-Guerra, em Paul Celan.

A língua francesa teve vários autores nascidos em outros países, mas que adotaram o francês como língua literária, como Emil Cioran e Isidore Isou. Na Alemanha, um dos autores mais respeitados do pós-Guerra, Oskar Pastior, viveu grande parte da vida na Romênia antes de poder escapar do regime comunista de seu país e migrar para a Alemanha.

Com a queda do Muro, a sociedade razoavelmente homogênea da Alemanha passou a receber um influxo migratório cada vez maior, que começa a influenciar a cultura do país. Kaminer é um exemplo disso, mas podem ser mencionados ainda outros autores que estarão presentes à próxima Bienal do Livro do Rio, como Ilija Trojanow, nascido na Bulgária, e a jovem Olga Grjasnowa, nascida no Azerbaijão.

Esse mundo de mesclas de línguas e culturas é a própria matéria-prima e tema central do trabalho de Kaminer, relatando a difícil aculturação e aclimatação a uma mentalidade distinta da russa, como é a alemã. Seus livros entram no rol de outras obras produzidas sobre a comunidade russa em Berlim e sua relação com a cultura do momento, como o romance Zoo, ou Cartas Não de Amor (1922), de Viktor Shklovsky.

Kaminer, hoje um dos rostos mais conhecidos na Alemanha, é uma prova de que a integração dessa onda migratória certamente tem seus momentos de sucesso.

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