Chanceler venceu a eleição, mas seu partido obteve segundo pior resultado do pós-Guerra. Críticas ainda não são abertas e amplas, mas insatisfação com a política dela entre os conservadores é mais forte do que nunca.
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Foi o que se chama de vitória com gosto de derrota: a chanceler federal Angela Merkel conseguiu conduzir a sua aliança de partidos – a União Democrata Cristã (CDU) e a União Social Cristã (CSU) – à vitória na eleição legislativa alemã, mas o resultado ficou bem aquém do que os conservadores estão acostumados a alcançar: meros 33%.
Diante das câmeras, a CDU festejou, mas internamente não havia como esconder a insatisfação. E quando Merkel, no dia seguinte, se dirigiu aos jornalistas para dizer que não via nada que pudesse ter feito de forma diferente durante a campanha, a paciência de muitos conservadores se esgotou de vez.
"Temos de ser o partido que é conhecido por ser uma garantia de manutenção das regras, seja na imigração ilegal, seja na estabilidade do euro", afirmou um correligionário. Outros defenderam a adoção de posições claras, sobretudo na política de refugiados e na segurança interna. E um pequeno grupo da ala mais à direita foi além e pediu a renúncia de Merkel da chefia da CDU.
Ao menos por enquanto, porém, a tendência dominante dentro do partido é evitar as críticas abertas. A explicação é simples: em três semanas haverá eleições estaduais na Baixa Saxônia, e a CDU tem boas chances de chegar ao governo. Passar uma imagem de unidade ajuda.
Mas a verdade é que os ânimos fervem dentro do partido conservador. O passado mostra que a CDU costuma tolerar muita coisa de seus chanceleres enquanto eles ganharem eleições. Mas quando se trata do poder em Berlim, o partido sabe ser impiedoso – vide o caso Helmut Kohl.
Agora a insatisfação se volta contra Merkel. Há tempos que ela já vinha sendo vista com desconfiança por muitos conservadores, que a veem como uma social-democrata disfarçada. Uma série de decisões polêmicas para os padrões conservadores, culminando no ingresso de centenas de milhares de refugiados no fim de 2015, fizeram crescer a má-vontade com a chanceler. Mas ela vencia eleições, então tudo se tolerava, ainda que com desconfiança.
Agora essa postura mudou. Isso se tornou evidente durante a primeira reunião da nova bancada conservadora, esta semana em Berlim. Um deputado que disse ter esperado mais clareza de Merkel em alguns temas, como o ingresso de famílias de refugiados, foi aplaudido.
Depois veio a reeleição de Volker Kauder, um aliado de Merkel, para a liderança da bancada da CDU/CSU. Ele venceu, mas com 50 votos contrários numa bancada de 246 deputados (queda significativa frente aos 309 da atual legislatura, e isso que o Bundestag passou de 630 para 709). Há quatro anos, Kauder fora eleito com 90% dos votos.
E há ainda a CSU, o partido conservador da Baviera. O clima é de nervosismo e insatisfação em Munique depois do resultado de 38% na eleição, o pior do pós-Guerra. A liderança da CSU teme agora perder a maioria absoluta nas eleição estadual de setembro do ano que vem e quer de todas as maneiras estancar a sangria. A principal culpada: Angela Merkel, que ignorou os apelos do partido por um teto para o ingresso de refugiados.
A coluna Zeitgeist oferece informações de fundo com o objetivo de contextualizar temas da atualidade, permitindo ao leitor uma compreensão mais aprofundada das notícias que recebe no dia a dia.
2015, o ano dos refugiados
Nunca tantas pessoas estiveram em fuga como em 2015. Muitos delas seguiram para a Europa, com o objetivo de chegar à Alemanha ou à Suécia. Confira uma restrospectiva fotográfica do "ano dos refugiados".
Foto: Reuters/O. Teofilovski
Chegada à União Europeia
Esses jovens sírios superaram uma etapa perigosa da sua viagem: eles conseguiram chegar à Grécia e, assim, à União Europeia. O objetivo final, porém, ainda não foi alcançado: eles querem continuar a jornada para o norte, em direção a outros países-membros do bloco. Em 2015, a maioria dos refugiados seguiu para a Alemanha e para a Suécia.
Foto: Reuters/Y. Behrakis
Perigosa travessia do Mediterrâneo
O caminho que eles deixam para trás é extremamente perigoso. Vários barcos com refugiados, nem sempre aptos à navegação, já viraram durante a travessia do Mar Mediterrâneo. Estas crianças sírias e seu pai tiveram sorte: eles foram resgatados por pescadores gregos na costa da ilha de Lesbos, na Grécia.
Foto: Reuters/Y. Behrakis
A imagem que comoveu o mundo
Aylan Kurdi, de 3 anos, não sobreviveu à fuga. No início de setembro, ele se afogou no Mar Egeu, juntamente com o irmão e a mãe, ao tentar chegar à ilha grega de Kos. A foto do menino sírio, morto na praia de Bodrum, espalhou-se rapidamente pela mídia e chocou pessoas de todo o mundo.
Foto: Reuters/Stringer
Onde as diferenças são visíveis
A ilha grega de Kos, a menos de 5 quilômetros de distância da Turquia continental, é o destino de muitos refugiados. As praias geralmente cheias de turistas servem de ponto de desembarque, como no caso deste grupo de refugiados paquistaneses que chegou à costa da Grécia com um bote de borracha.
Foto: Reuters/Y. Behrakis
Em meio ao caos
Porém, muitos refugiados não conseguem simplesmente seguir viagem quando chegam a Kos. Eles somente podem seguir para o continente após serem registrados. Durante o verão europeu, a situação se agravou quando as autoridades fizeram com que os refugiados esperassem pelo registro num estádio, sob o sol escaldante e sem água.
Foto: Reuters/Y. Behrakis
Um navio para refugiados
Por causa da condições precárias, tumultos eram frequentes na ilha de Kos. Para acalmar a situação, o governo grego fretou um navio, que permaneceu ancorado e foi transformado em alojamento temporário para até 2.500 pessoas e em centro de registro de migrantes.
Foto: Reuters/A. Konstantinidis
"Dilema europeu"
Mais ao norte, na fronteira da Grécia com a Macedônia, policiais não permitiam mais a passagem de pessoas, entre elas crianças aos prantos, separadas de seus pais. Esta foto tirada pelo fotógrafo Georgi Licovski no local, e que mostra o desespero de duas crianças, foi premiada pelo Unicef como a imagem do ano, já que mostra "o dilema e a responsabilidade da Europa".
Foto: picture-alliance/dpa/G. Licovski
Sem conexões para refugiados
No final do verão europeu, Budapeste se transformou em símbolo do fracasso das autoridades e da xenofobia. Milhares de refugiados estavam acampados nas proximidades de uma estação de trem da capital húngara, pois o governo do país os proibira de seguir viagem. Muitos decidiram seguir a pé em direção à Alemanha.
Foto: picture-alliance/dpa/B. Roessler
Fronteiras abertas
Uma decisão na noite de 5 de setembro abriu caminho para os refugiados: a chanceler federal alemã, Angela Merkel, e o chanceler austríaco, Werner Faymann, decidiram simplesmente liberar a continuação da viagem por parte dos migrantes. Como consequência, vários trens especiais e ônibus seguiram para Viena e Munique.
Foto: picture alliance/landov/A. Zavallis
Boas vindas em Munique
No primeiro final de semana de setembro, cerca de 20 mil refugiados chegaram a Munique. Na estação central de trem da capital da Baviera, inúmeros voluntários se reuniram para receber os refugiados com aplausos e lhes fornecer comida e roupas.
Foto: Getty Images/AFP/P. Stollarz
Selfie com a chanceler
Enquanto a chanceler federal Angela Merkel era aplaudida por refugiados e defensores de sua política de asilo, muitos alemães se voltavam contra a política migratória. "Se tivermos de pedir desculpas por mostrar uma face acolhedora em situações de emergência, então este não é mais o meu país", respondeu a chanceler. A frase "Nós vamos conseguir" se tornou o mantra de Merkel.
Foto: Reuters/F. Bensch
Histórias na bagagem
No final de setembro, a polícia federal alemã divulgou uma imagem comovente: o presente que uma menina refugiada deu a um policial da cidade alemã de Passau. O desenho mostra o horror que vários migrantes vivenciaram e o quão felizes eles estavam por, finalmente, estarem em um local seguro.
Foto: picture-alliance/dpa/Bundespolizei
O drama continua
Até o final de outubro, mais de 750 mil refugiados haviam chegado à Alemanha. Mas o fluxo não parava. Sobrecarregados, os países da chamada Rota dos Bálcãs decidiram fechar suas fronteiras. Apenas sírios, afegãos e iraquianos estavam autorizados a passar. Em protesto, migrantes de outros países chegaram a costurar seus lábios.
Foto: picture-alliance/dpa/G. Licovski
Sem fim à vista
"Ajude-nos, Alemanha" está escrito em cartazes de manifestantes na fronteira com a Macedônia. Na Europa, o inverno se aproxima, e milhares de pessoas, entre elas crianças, estão presas nas fronteiras. Enquanto isso, até mesmo a Suécia retomou o controle temporário de fronteiras. Em 2016, o fluxo de refugiados deverá continuar.