Zeitgeist: O hajj e a rivalidade entre Irã e Arábia Saudita
Alexandre Schossler12 de setembro de 2016
Todo muçulmano adulto deve participar pelo menos uma vez do hajj. Tensões entre a Arábia Saudita, onde fica a cidade sagrada de Meca, e o Irã têm tornado essa expressão de fé mais difícil para os iranianos.
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O hajj, a peregrinação à cidade de Meca, é um dos cinco pilares do islã e, como tal, obrigatório para todos os muçulmanos adultos, desde que eles tenham condições financeiras e de saúde para cumpri-lo.
A peregrinação acontece todos os anos, e um muçulmano deve participar dela ao menos uma vez. Os dias do hajj são pré-determinados, e como o ano islâmico é sete dias mais curto do que o gregoriano, a data da peregrinação neste muda a cada ano.
Antes de iniciar o hajj, o peregrino deve passar por um ritual preparatório e de purificação, conhecido como ihram. É nessa fase que ele veste as roupas brancas sem costura típicas dos peregrinos.
A peregrinação dura seis dias e segue uma sequência pré-determinada de rituais, que incluem as sete voltas em sentido antihorário em torno da Kaaba, na Grande Mesquita de Meca, o ritual de apedrejamento do demônio em Mina e o sacrifício de animais da Festa do Sacrifício (Eid al-Adha).
Os participantes passam as noites em tendas. Alguns peregrinos mais idosos participam do hajj em cadeiras de rodas, empurradas pelos filhos.
Todos os anos, milhões de muçulmanos participam da peregrinação a Meca, o que já gerou vários incidentes. Em 2015, um tumulto em Mina resultou na morte de cerca de 2.400 pessoas. Oficialmente, o governo em Riad confirmou apenas 769 mortos.
Em resposta, o governo da Arábia Saudita, onde fica a cidade sagrada de Meca, elevou os investimentos em segurança para o hajj de 2016. O governo saudita também iniciou um inquérito para apurar as causas da tragédia, mas um ano depois ele ainda não foi concluído.
Entre os mortos de 2015 há pelo menos 464 iranianos, e a tragédia piorou ainda mais as já tensas relações entre a Arábia Saudita e o Irã, as duas grandes potências rivais da região. A Arábia Saudita é governada por uma dinastia saudita, e o Irã é a maior potência xiita.
A imprensa saudita chegou a responsabilizar os peregrinos iranianos pela tragédia, e o governo iraniano acusou os sauditas de não oferecerem a segurança necessária para os peregrinos.
A tragédia é mais um capítulo na longa rivalidade entre iranianos e sauditas, que tem se acirrado nos últimos meses. Outro ponto alto foi a execução do clérigo xiita Nimr Baqir al-Nimr, em dezembro de 2015, pela Arábia Saudita. Ele havia concluído seus estudos no Irã.
Devido à situação de animosidade crescente, Riad e Teerã não conseguiram chegar a um acordo sobre a participação de peregrinos iranianos no hajj de 2016, o que levou à exclusão destes da peregrinação.
Nas vésperas do hajj, o líder supremo do Irã, aiatolá Ali Khamenei, afirmou que a "diabólica" família real saudita não merece administrar os locais sagrados do islã. Já o grão-mufti da Arábia Saudita, Abdulaziz al-Sheikh, disse que os iranianos não são muçulmanos.
A coluna Zeitgeist oferece informações de fundo com o objetivo de contextualizar temas da atualidade, permitindo ao leitor uma compreensão mais aprofundada das notícias que ele recebe no dia a dia.
Os 11 dias da Revolução Islâmica
No início de 1979, o xá Reza Pahlavi era derrubado no Irã. A Revolução Islâmica transformou a monarquia de até então num Estado religioso liderado por um sacerdote muçulmano. O clímax da revolução em imagens.
Foto: akairan.com
Retorno a Teerã
1º de fevereiro de 1979: O aiatolá Ruhollah Khomeini retorna do exílio em Paris para Teerã. Ele é recebido com júbilo pela população no aeroporto. Durante anos, criticara o xá e sua elite política, pela repressão dos dissidentes; pela "ocidentalização" do Irã – aos olhos de Khomeini, excessiva; e, acima de tudo, por seu estilo de vida dissoluto, de luxo decadente.
Foto: akairan.com
À espera do salvador
Cerca de 4 milhões de iranianos aguardaram para saudar a procissão de veículos que levou Khomeini nesse dia até o cemitério central Behesht-e Zahra, onde ele faria seu discurso de chegada. Há quase um ano ocorriam manifestações de massa quase diárias contra o regime do xá. Desde agosto de 1978, greves gerais organizadas pela oposição paralisavam repetidamente a economia do país.
Foto: Getty Images/Afp/Gabriel Duval
Fora com o xá
O xá Reza Pahlavi já havia deixado o Irã em 16 de janeiro de 1979. Pouco antes, na Conferência de Guadalupe, ele perdera o apoio dos mais importantes governantes ocidentais, que preferiram procurar o diálogo com Khomeini. O então presidente americano, Jimmy Carter, aproveitou a ocasião para convidar o xá aos Estados Unidos, por tempo indeterminado. Ele aceitou.
Foto: fanous.com
Premiê isolado
Antes, o xá nomeara, como primeiro-ministro interino, Shapur Bakhtiar, figura de liderança da oposicionista Frente Nacional. O governante pretendia assim abrandar seus inimigos, mas sem sucesso. Bakhtiar ficou isolado dentro de seu partido por ter sido nomeado pelo xá, enquanto seus correligionários já haviam concordado em só colaborar com Khomeini.
Foto: akairan.com
Declaração de combate no cemitério
Já ao desembarcar em Teerã, o aiatolá declarou que não reconhecia o governo de Shapur Bakhtiar. Ele partiu direto do aeroporto para o cemitério central, onde fez um discurso beligerante, negando a legitimidade da monarquia e do Parlamento: ele próprio definiria o novo governo do Irã, prometeu Khomeini.
Foto: atraknews.com
Tumultos em todo o país
Em Teerã e outras cidades iranianas, os enfrentamentos violentos entre os revolucionários e os adeptos do xá prosseguiram, mesmo depois da chegada de Khomeini a Teerã. Durante dias permaneceu indefinido quem venceria os combates. Os militares decretaram toque de recolher, que praticamente nenhum iraniano respeitou.
Foto: akairan.com
Premiê interino
Em 5 de fevereiro de 1979, Khomeini entregou a chefia de governo interina a Mehdi Bazargan, da Frente Nacional. De início, parecia que o clero iria colaborar como a oposição liberal. No entanto, logo emergiram conflitos entre os dois grupos. Em 5 de novembro, Bazargan renunciou, em reação à tomada de reféns na embaixada americana em Teerã, ato tolerado por Khomeini.
Foto: akairan.com
Festejando a queda
Após a nomeação de Bazargan, numerosos cidadãos foram às ruas com a intenção de derrubar o governo interino. As Forças Armadas declararam não querer se envolver na luta de poder, privando Shapur Bakhtiar de qualquer tipo de cobertura. Ele teve que fugir da própria casa diante dos partidários armados de Khomeini. Em abril de 1979 exilou-se na França.
Foto: akairan.com
Saudação militar
Honras militares para o líder religioso: uma tropa de elite da Força Aérea iraniana saúda o aiatolá Khomeini. Os oficiais da aeronáutica, os homafaran, tiveram participação decisiva na revolução, permitindo à população o acesso a seus arsenais de munição, para a derrubada do regime de Pahlavi. Em 9 de fevereiro, a guarda imperial ainda tentou uma última reação, ao atacar uma base dos homafaran.
Foto: Mehr
Queda de monarquia
A partir daí, alastraram-se as lutas armadas entre a guarda imperial e a população. Em 11 de fevereiro de 1979 o colapso da ordem foi total: revolucionários ocuparam o Parlamento, o senado, a TV e outros órgãos estatais. Pouco mais tarde anunciava-se a derrubada da monarquia. Até hoje, o 11 de fevereiro é dia da "Revolução Islâmica" no Irã.